Capítulo 32

102 20 33
                                    


O sol matinal aquecia seu rosto. Alois repuxou o paletó, tombando o crucifixo. Segurou-o entre os dedos. Quem diria que aquela pequena joia seria a responsável por ainda estar respirando? Um pouco de fumaça subia perto de Otto. Se abaixou para beijá-lo, inspecionando o que havia ali: dois ovos fritando numa pedra: —Não me diga que...— dizia, sem crer que o questionava a respeito de um roubo.

—Não se faz omeletes sem quebrar ovos, não é? — O companheiro lhe entregou uma maçã da pilha no chão.

—Você e suas piadinhas. Não sabe como senti saudades. —Comeu em menos de um minuto, passando para a próxima.

—Tive medo de te deixar sozinho, mas você dormia tão bem que não quis te acordar.

Alois olhou para o corpo magro dele, os ossos de seu pulso aparecendo por baixo das mangas da camisa. Nunca deveria tê-lo chamado de gordo como ofensa, pois Otto estava definitivamente melhor antes do que naquele estado. Deus, como se arrependia.

—Coma um pouco você também. Não gosto de te ver assim, parece um dos caras que dormiam comigo em Peggau...— O companheiro fez uma careta, então corrigiu a frase: —Era muito frio pra dormir separado e não tinha espaço também.

Ele sorriu: —Já comi. É tudo pra você.

Beijou-o de novo, pegando um pedaço do café da manhã e oferecendo-o mesmo assim. Otto podia não ser um aventureiro como Mark, mas com certeza era mais corajoso, concluiu, lembrando de como ele arrombara a porta do cativeiro e tudo o que ele suportara tentando encontrá-los. Yvette estava certa: ele realmente o amava. Se ao menos soubesse onde ele estava, poderiam ter se encontrado bem antes e evitado tanto sofrimento...Remexeu-se, as memórias daquele horror voltando. Apertou o crucifixo, vendo o companheiro apagar a fogueira.

—Ainda tentando lembrar do nome?

Não disse nada.

— Eles podem vir nos procurando. Onde foi que vocês quatro se esconderam depois de fugir?

—Gratwein, mas não quero voltar. Os monges fizeram muito nos acolhendo, seria ingrato fazê-los se arriscarem de novo.

—Então?

—Ludwig foi levado de carro, então deve ser fora da cidade. O desgraçado falava como se pudesse ir lá numa tarde qualquer, mas ele poderia estar blefando. — adicionou com amargura.

—Melhor procurarmos primeiro. — Subiram de novo na moto, carregando o que sobrara da comida.

Havia um vilarejo abaixo nas colinas, pequenas casas com telhados de palha e ruazinhas estreitas. —Podemos dar uma olhada ali. — sugeriu.

—Temos que tomar cuidado, ainda mais com essa aparência. — ele disse, e Alois não questionou: além da falta de banho, ainda vestia as roupas daquele maldito.

Otto lhe cedeu o paletó para que disfarçasse a jaqueta e desceram pela encosta, passando por camponeses e suas cabras. Cruzaram o vilarejo de uma ponta a outra, mas nem sinal dele. Ouvindo um camponês chamar pelo filho, Alois se lembrou: —No telefone, ele o chamou de Lothar. Pode ser que o chamem assim agora.

—Tem outras vilas para vermos ainda. — ele disse, se encaminhando para guiar a motocicleta dessa vez. Seguiam pelo bosque através da estrada quando se surpreenderam com uma figura esguia passando. Pararam e um garoto imundo pulou na frente deles, com uma armadilha de pegar bichos e uma espingarda:

—Mãos ao alto!

Alois arregalou os olhos: ele parecia um dos meninos perdidos do Peter Pan, e seu susto aumentou ao reconhecê-lo.

Dois PaisOnde histórias criam vida. Descubra agora