Capítulo 40

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De onde estava, Otto assistia nervoso o companheiro executar os truques. Franz tirou os isqueiros do bolso: ―Vou sentir falta dessa agitação.

Resmungou, sem entender como alguém poderia dizer aquilo: ―Vá ao cinema. Tem bons filmes na Suíça, não?

―Se tiverem outra coisa além de "O Triunfo da Vontade", pode ser. ―Avistaram a comoção se formando. Alois, ou Fernando, o mestre da magia e do suspense desaparecera e suas assistentes assumiam o palco.

A voz da travesti soava no microfone: ―"I wanna be loved by you, just you and nobody else but you..."

―Ela não está...― Franz perguntava, estupefato.

"I wanna be loved by you alone, Booh booh bee doo!"

―Ah, ela está sim. ―respondeu.

As duas cantavam de mãos dadas para a plateia ultrajada. Pais e mães puxavam os filhos a tiracolo e os soldados se levantavam, armados.

Se apressaram em abrir os cilindros dentro do barraco. Atiraram os isqueiros acesos e correram depressa, se refugiando por detrás do caminhão. Pedaços de tijolo e madeira atravessaram a lataria de todos os veículos ao redor e o telhado sumiu deixando um círculo flamejante no lugar. Diante da explosão, os convidados corriam como baratas tontas para todos os lados, tombando e pisoteando o bolo do Fuhrer. Yvette fugia pela lateral do palco com Klaudia. Alguns soldados as perseguiam, mas Franz tratou deles a tempo de elas embarcarem no caminhão.

O comandante berrava, enfurecido, mas àquela altura eles já deviam estar na estrada, pensou, se tranquilizando. Desejou-lhes boa sorte e correu para lá também.


~~***~~

Sigrid apontava a arma quando Ludwig se colocou em sua frente, gritando: ― Não, mãe! Ele só quer me levar pra casa!

Sai da frente! ― ordenou, mas o filho resistia. O homem tremia. Porque ele era tão magro e tão menos ameaçador do que imaginava? Manteve a mira sobre o peito dele.

Ele se abaixou até o menino, pedindo: ―Vá com ela, Ludwig. Vá e seja bom. ―O menino se agarrou a ele, chorando. Relembrou as palavras de Klaus: "Crianças são ingênuas. Se acostumam ao sofrimento". Em lágrimas, ele pedia: ―Não o deixe se machucar de novo.

Parou em choque, encarando os olhos aflitos dele, o rosto marcado de cicatrizes apesar da maquiagem. "O melhor tio do mundo"... O sobrinho chorava nos braços dele.

"É natural pra uma criança confusa, achar que ele é o vilão da história."

Podia ser loucura, podia ser um engano, mas naquele momento, só lhe restou acreditar no que via. Baixou a arma e apontou a porta para eles: ― Vão, depressa! —Ele pegou o garoto no colo. Seus olhares se cruzaram por meros segundos ao atravessarem a porta, ganhando o quintal. Não sabia o que seria dela agora.

Seu marido invadiu a cozinha. Apontou a arma para ele: ―Pare!

Klaus a encarou, furioso: ―Ele está fugindo!

―Deixa eles irem!

―Está louca! Nosso filho... ―ele dizia, mas Sigrid só pensava na farsa que aquilo tudo era.

Nosso filho? ―repetiu, empunhando a arma: ―Você foi tudo, menos um pai! ―Seu riso desesperado se convertia em lágrimas.

Klaus recuou, os olhos verdes que ela amava a encará-la: ―Vai deixar aquele pervertido levá-lo?

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