Apesar de sua costumeira sisudez, Franz logo deixou transparecer sua simpatia, cortando algumas fatias de queijo para eles e as crianças. Alois agradeceu. Yvette, entregou um sanduíche para o irmão pela portinhola: —Aqui, animal.
―Obrigado, mocinha. ― respondeu Harold.
―Sou mesmo! ― Ela gritou de volta.
Todos riram, menos Otto. Se virou para ele: ― Preocupado?
―Não, imagine. Sair ileso da prisão? Fácil. Entrar num prédio cheio de nazistas? Moleza. Mas invadir a casa de um comandante...Estou morrendo de medo.
―Você já fez isso.
―Bom, sim, mas esse homem deve ter um batalhão armado. E depois ainda teremos de pensar em como chegar à Inglaterra.
Não tinha pensado nesse detalhe. Franz coçou o queixo: —Posso pagar as passagens. — E puxou um revólver de dentro da mala: ―É antigo, mas ainda funciona.
―Pena não termos mais aquela metralhadora, Klaudia. ―disse Yvette, fazendo-a franzir as sobrancelhas.
―Ainda estaríamos em desvantagem. Não temos um campo inteiro de prisioneiros se rebelando para distraí-los.
De repente, Harold virou-se para eles, a voz tensa: ―Silêncio, vamos passar por um pedágio.
Todos se calaram. Klaudia e Yvette se revezavam acalmando as crianças. O veículo parou e pelas frestas, viram o cano de um rifle, a voz bruta do guarda ordenando: ―Abra essa capota!
Franz fez sinal para que continuassem calados, a arma em punho. O tecido deslizava para o lado, mas o irmão de Yvette se interpôs.
―Afaste-se! — ordenaram os guardas.
Foi o tempo de mandarem as crianças para o fundo. Assim que puxaram a capota, o soldado se surpreendeu com a quantidade de passageiros clandestinos ali, e se surpreendeu ainda mais com o revólver de Franz: ele caiu, baleado enquanto Harold acelerava, desequilibrando-os, os pneus cantando na estrada.
Dois soldados correram às suas motocicletas e atiraram, tentando acertar os pneus do caminhão. Em meio aos chacoalhões, tentavam se segurar onde fosse possível. Alois deu a mão ao companheiro, que segurava Barão junto a eles enquanto Franz recarregava o único revólver disponível. Um tiro passou raspando perto de Klaudia e Yvette, assustando as crianças. Franz se abaixou a tempo, o tiro acertando a cômoda atrás dele.
―Oh, meu Deus... ―Yvette repetia.
Alois olhou em volta, para as crianças gritando e Franz encurralado com o revólver, até que seus olhos pousaram na cômoda e na pilha de malas sobre ela. Começou a empurrar o móvel: ―Ajudem aqui!
Otto e Franz vieram, quando Yvette parou na frente deles: ― Não, isso não!
―Sinto muito! ― Tirou-a do caminho, dando o empurrão que faltava: roupas e pedaços de madeira se desprenderam com o impacto, tombando as motocicletas no asfalto. Observavam a ameaça ficar para trás.
Comemoraram, apesar da lamentação da dona: —Minhas roupas, meus vestidos, alta costura, musselina francesa...
Alois se aproximou, abraçando-a: ―Ah, não fique assim. Não ia poder usar nada disso morta.
―Nunca mais fale comigo! ― ela gritou, indo sentar no fundo caminhão.
Alisou a própria nuca, ouvindo o companheiro, aflito: —Eles ainda podem vir atrás da gente!
O motorista bufou: ―Devia ter dado mais pancadas na lataria, pra espantar toda má sorte que vocês, viados, trazem!
Alois se limitou a inspirar fundo, mas Yvette empurrou Otto para o lado, gritando: ―Cala a boca, seu animal! Você nunca fez nada de útil na sua vida até agora! Quem foi que ficou em casa cuidando de todo mundo com a avó, hein? EU!
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Dois Pais
Historical FictionÉ 1938 e a Áustria está prestes a se unir à Alemanha nazista em sua cruzada odiosa. Em meio a isso, Alois Kaufman, um barman veterano de guerra, guarda de todos um enorme segredo: seu relacionamento de dez anos com outro homem, Otto Vandenburg, um s...