Era uma linda manhã. Eu estava em um vilarejo em algum lugar ao sul da Inglaterra. Andava pela rua observando a feira livre que ali estava. Mortais por todos os lados trocavam e negociavam mercadorias, que iam de pequenas joias a pequenos rebanhos de vacas. Era divertido ver a evolução da espécie humana, eles criavam várias coisas e depois tinham que adaptar as mesmas.
Estava tão distraído que mal percebi que estava longe do lugar de origem. Estava agora em uma pequena viela, onde era um possível lugar para moradores de rua se alojarem. Eu tinha uma bolsa de frutas e pão, então saí distribuindo para as pessoas ali. Alguns me olhavam intrigados outros agradecidos, mas logo uma pequena fila se formou. Acho que eles não tinham muitas escolhas. Haviam homens, mulheres, senhoras e até crianças. O que me dava muita pena e me deixava muito triste, talvez no futuro os mortais aprendam a se organizar para que isso não ocorra mais.
- Você é um bom rapaz. - Falou uma senhora. Ela tinha cabelos brancos, suas roupas estavam um pouco sujas e tinham alguns buracos. Um sorriso amarelo e quase sem dentes foi dirigido a mim pela mesma. Devolvi o sorriso agradecendo o elogio. Lhe dei pão e uma maçã, ela pegou e se dirigiu ao meu lado esquerdo se sentando com dificuldade no chão. Depois dela veio uma menina, ela aparentava ter uns oito anos. Seus cabelos eram ruivos, mas estavam sujos e oleosos. Ela me olhou temerosa como se esperasse que eu a repreendesse ou a atacasse. Me abaixei para ficar na sua altura, ela não era uma mortal era uma semideusa, possivelmente filha de Afrodite. Seu nome era Júlia Wittenberg.
- Olá pequena. - Falei o mais amável possível.
- Olá. - Ela respondeu, olhando para baixo corada. Ela era tão fofa, eu não podia deixar ela aqui sozinha. Logo seu cheiro poderia ficar forte e os monstros a achariam.
- Onde estão seus pais? – Perguntei. Talvez seu pai estivesse por ali e eu poderia conversar com ele.
- Eu não tenho pais, senhor. - Murmurou ela, ainda encarando o chão, seus pés se remexiam nervosamente. Olhei para trás dela, ainda haviam muitas pessoas para pegar comida, não podia atrasar a fila. Então lhe dei um pedaço de pão e pedi para ela sentar em um lugar por perto. Ela me obedeceu indo sentar do lado da simpática senhora. Dei a todos comida, e, assim que o último mortal pegou a comida, me voltei para a garotinha indo até ela.
- Qual seu nome? - Perguntei me abaixando novamente.
- Júlia Wittenberg, senhor. – Respondeu me olhando temerosa.
- Júlia, não irei machucá-la, mas preciso que venha comigo. – Falei. Meu tom era suave, porém mesmo assim ela ficou com medo.
- O que o senhor vai fazer comigo? - Perguntou chorosa. A senhora observava tudo com um olhar imparcial.
- Eu sei que vai parecer estranho, mas eu conheço sua mãe. - Falei. Era verdade, havia conhecido Afrodite há algumas décadas em uma ilha.
- Mentira! - Ela falou um pouco alto, o que fez as pessoas voltarem seus olhares para nós. Júlia percebeu isso e se acalmou. - Meu pai disse que ela morreu assim que me teve.
- Seu pai mentiu, pequena, e eu posso provar isso, mas vai ter que confiar em mim. - Pedi.
- Querida. - Interveio a senhora. - Esse rapaz se dispôs a vir aqui e ajudar essa gente toda, ele poderia ter simplesmente nos ignorado, como a maioria das pessoas, todavia ele não o fez. Também poderia tê-la levado a força, mas está aqui pedindo calmamente para que você o acompanhe. - Ela olhou para mim, dando um sorriso caloroso. - Se eu fosse você confiaria nele. - Júlia pareceu ponderar as afirmações da senhora. Por fim assentiu e se levantou.
- Eu vou com você. - Ela falou. Sorri para ela e me voltei para a senhora fazendo uma breve reverência.
- Foi um prazer revê-la, Lady Héstia. - Disse me levantando. A deusa sorriu.
- O prazer foi meu, Lorde Perseu. - A deusa da lareira sorriu e sumiu em um brilho avermelhado. Júlia estava com a boca aberta olhando para o local onde Héstia estava.
- Ela… ela…
- Sim, venha e lhe explicarei tudo. – Disse, ficando de pé e pegando a pequena mão dela. Nos teletransportei para um penhasco que dava vista para o mar. Após um breve momento em que tive que acalmar a pequena ruiva, comecei a explicar tudo sobre a mitologia grega. Não foi tão difícil, afinal, tinha visto uma deusa sumir diante de seus olhos e depois ela própria foi teletransportada.
- Então eu sou uma semideusa?
- Sim. - Respondeu uma voz melodiosa. Ao meu lado direito uma mulher apareceu. Ela era linda, cabelos ruivos compridos, olhos azuis brilhantes, sua pele era branca como porcelana. Usava um vestido da época medieval, de cores marrom e branco, que se ajustava perfeitamente ao seu belo corpo. - Olá minha querida, sou sua mãe Afrodite.
Júlia alternava o olhar, da recém-chegada para mim, como um relógio tic tac. Eu entendia o choque dela, quer dizer, hoje de manhã ela era uma pobre órfã, que andava na rua sem ninguém, e agora estava na frente de um primordial e uma deusa que por acaso era sua mãe. Eu no lugar dela teria surtado.
- Achei que os deuses não pudessem ver seus filhos. – Falei, quebrando o silêncio que já estava ficando incomodo.
- Zeus não gosta da proximidade entre deuses e mortais e os outros deuses acatam, mas não é obrigatório. - Dite respondeu, dando um sorriso de lado.
- Interessante saber disso. - Murmurei.
- Soube que se encontrou com Héstia. - Dite continuou, dando um sorriso divertido. Ergui uma sobrancelha para ela. Afrodite via Héstia e eu como um casal perfeito e já tentou nos juntar algumas vezes, mas ambos nos desviamos. Eu gostava de Héstia sim, mas como amigo. Ela era incrível, sempre disposta a ajudar semideuses, e dava ótimos conselhos, além disso, estar com ela me dava uma grande sensação de paz.
- Sim, encontrei. - Respondi. O sorriso da deusa do amor aumentou. - Mas não rolou nada e nem vai rolar.
- Veremos, Jackson. - Ela piscou para mim. Revirei os olhos e me voltei para a garotinha, que ainda nos observava sem palavras. – Querida, você está bem?
- B-bem. - Respondeu Júlia como se estivesse em transe. Depois piscou várias vezes e encarou a mãe. - Bem? Eu passei minha vida inteira achando que a senhora tinha morrido. - Lágrimas caiam de seus olhos. - Me deixou sozinha com aquele ogro e agora vem me perguntar se estou bem?
- Júlia, eu não tive culpa. - Começou Dite, tentando acalmar a menina. Me afastei indo sentar no penhasco, aquela era uma conversa entre mãe e filha e eu não queria interromper. Depois do que pareceram horas, Júlia acabou perdoando Afrodite e agora as duas se abraçavam.
- Parece que se resolveram. - Comentei sorrindo quando cheguei perto. Elas se separaram sorrindo.
- Parece que sim. - Falou Júlia. - Obrigada Lorde Perseu por me trazer aqui.
- Não precisa agradecer. - Falei. - E pode me chamar de Percy.
- Ou chato. - Murmurou Afrodite risonha.
Depois desse dia eu treinei Júlia, sabia que ela seria importante no futuro. Ela cresceu, se tornou forte e muito bela. Eu a tratava como minha irmã menor e quando ela completou 13 anos eu a levei para a caçada, já que mesmo passando tanto tempo comigo ela ainda não gostava de homens por causa do pai dela.
- Obrigada por tudo, Percy. - Ela falou olhando para mim.
- É assim que me agradece? Me abandonando para entrar na caçada? – Fa fazendo birra. Júlia riu.
- Quantos anos você tem? - Perguntou divertida.
- 3754, por quê?
- Estava falando de Idade mental. - Disse ela. Revirei os olhos e cruzei os braços. Ela riu e se aproximou para um abraço, o qual retribuí meio relutante. Era decepcionante ter que me afastar das pessoas depois de criar um laço tão forte. Pelo menos ela eu tinha certeza de que iria ver, pensei nos outros heróis os quais treinei e morreram. Esse era o lado ruim de ser imortal, ver vários amigos morrendo sem poder fazer nada.
- Se cuida, pequena. - Falei me afastando. - E use com sabedoria a minha bênção. - Ela assentiu. Uns metros a diante senti as caçadoras, elas se aproximavam em uma velocidade impressionante. Pensei em ficar e talvez ver Zoe, mas tinha que resolver algumas coisas fora da Terra.
- Até mais, mestre. - Ela falou.