Um dia de Escravo

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- Pronto. – Falei, jogando o pano no balde.

- Não, não, não, ainda estou vendo uma manchinha ali. - Falou Circe apontando para a Janela.

- Já disse que te odeio? - Perguntei, passando o pano onde ela havia apontado.

- Umas 20 vezes desde que começou a limpar a sala. - Respondeu Circe divertida. Ela havia me pedido para limpar todo o Balneário, mesmo que já estivesse limpo!

- E agora? - Perguntei, voltando a jogar o pano no balde.

- Limpe o salão lá embaixo e aí eu penso em te liberar. – Falou em tom pensativo.

- Você ainda está com raiva, né? - Perguntei indo me sentar perto dela, que estava em um sofá.

- Eu o amava. - Ela falou. Seus olhos escureceram e ela começou a encarar um ponto a sua frente.

- Mas ele não sentia o mesmo. - Falei, pegando sua mão. - Não acha que é egoísmo obrigar alguém a ficar conosco quando a pessoa não quer? - Ela me olhou, seus olhos lacrimejaram. Eu a abracei e ela devolveu o braço, ficamos assim por um tempo.

- Você tem razão. - Ela falou me soltando. - Mas ainda tem que limpar o salão. - Eu sorri, ela me deu um beijo na bochecha.

- Estou indo. – Falei, me levantado e indo rumo a porta. - Tente não morrer de saudades. - Dei um meio sorriso, ela revirou os olhos e ia jogar uma almofada em mim, mas eu fechei a porta.

Desci umas escadas lembrando do caminho que fiz. Olhei o relógio, fazia 5 horas que os semi deuses tinham partido. Acho que ficaram surpresos por um primordial se submeter a isso. Mas eu nunca me achei melhor que ninguém, e espero nunca fazer isso. Vejo a arrogância dos Olimpianos e os problemas causados por ela.

Parei em outro salão, diferente do primeiro. Era igualmente belo e arrumado, porém bem maior. Uma parede cheia de janelas de vidro que davam vista para a praia, sofás e mesas de centro estavam espalhadas. Mas o que mais me chamou atenção foi uma figura feminina (Talvez por ser a única pessoa presente ali). Tinha mais ou menos 14 anos, com pele clara, olhos negros e cabelos pretos e longos. Vestia uma roupa mais simples comparada a primeira moça. Apenas uma blusa branca com o símbolo do balneário e uma calça jeans preta. Ela lia um livro sentada em um dos sofás.

- Acho melhor começar logo. - Uma voz feminina falou. Olhei para trás, dando de cara com a recepcionista. Esta estava mais á vontade que algumas horas atrás. O cabelo preso em um coque frouxo, roupas parecidas com as da menina que estava ali.

- Você poderia ser mais gentil, Hylla. – Falei cruzando os braços.

- Como sabe o meu nome? – Perguntou, erguendo uma sobrancelha.

- Eu sou um Primordial, posso ler sua mente. - Falei como se fosse óbvio. - Mas prefiro não fazer, se te consola.

- Espera que eu acredite nisso? – Perguntou se aproximando.

- Tanto faz. – Falei, dando de ombros e indo fazer o meu trabalho.

- Por que um homem está aqui? - Perguntou a menina, se aproximando de Hylla.

- Ele está cumprindo um acordo com Circe. - Respondeu Hylla.

- Interessante… - Murmurou a outra menina. 

- E você Reyna, já cumpriu seu afazeres? - Perguntou Hylla.

- Alguma vez eu já deixei de fazê-los? - Retrucou Reyna, cruzando os braços.

- Não. - Respondeu Hylla.

- Então você já tem sua resposta. - Disse Reyna, retornando ao sofá. Hylla olhou para ela um tanto irritada e parecia prestes a discutir, mas desistiu e apenas bufou saindo da sala.

- Ela é bem rígida. – Comentei, como quem não quer nada, algum tempo depois da morena ter saído.

- Ela finge ser. - Respondeu a garota.

- Por que você diz isso? – Perguntei, me voltando para ela.

- Não quero falar sobre. - Disse ela, fechando o livro e me olhando.

- Entendo. - Falei a olhando.

- Você disse que era um primordial… - Começou.

- Sim, sou. - Respondi. - E não diga que eu não pareço grande coisa, isso está me irritando. Por Caos, é preciso ser ruim para ter respeito agora? – Falei. Ok, talvez eu esteja estressado.

- Não. - Respondeu a garota. - Mas as pessoas acham que sim. Elas nunca estão contentes. Você pode dar um milhão por dia a uma pessoa, mesmo assim ela vai arranjar motivos para reclamar de você.

- Sim, estou começando a acreditar nisso. - Murmurei. - Acho que esperava mais dos humanos, que eles evoluíssem, mas a cada dia parece que retrocedem.

- Não espere muito deles. - Falou Reyna, dando tapinhas nas minhas costas. Passei um tempo em silêncio apenas a observando, me deu uma vontade de ler seus pensamentos, mas prefiro esperar que ela me conte.

- Como você veio parar aqui? – Perguntei curioso.

- É uma longa história. - Disse ela.

- Tenho um dia todo. – Falei, levantando o balde. Ela sorriu, fez que sim com a cabeça e começou a contar desde o seu nascimento, o que houve com o seu pai e como encontrou essa ilha com a irmã.

- Uau! – Falei, depois dela acabar. Ela olhava para a frente, sua feição era um misto de tristeza, raiva e amargura. - Não foi sua culpa, querida.

- Podemos mudar de assunto? – Perguntou, voltando-se para mim. - Eu nem sei porque te contei isso.

- Para saciar a curiosidade desse humilde primordial. - Falei sorrindo. Ela sorriu.

- E como é ser um primordial? – Perguntou curiosa.

- Estressante, tenho que resolver problemas dos outros e os meus. - Respondi. - Mas é muito legal conhecer diferentes pessoas e ter várias visões de mundo.

- Deve ser legal. - Ela falou com um ar de sonhadora. - Eu queria sair daqui, viajar um pouco.

- E por que não faz isso? - Perguntei.

- Hylla está tão bem aqui e eu não quero deixar ela. - Respondeu. - Ela é a única família que me resta.

- Eu entendo perfeitamente. - Falei. - Mas já pensou que talvez ela queira o mesmo? - Ela pensou um pouco.

- Será? - Disse pensativa.

- Não exatamente. - Respondeu Hylla, brotando de algum lugar. Inferno talvez?

- Explique-se. - Pediu Reyna.

- Eu gosto daqui, mas quero sair. - Disse Hylla. - Mas tenho medo do que pode acontecer. 

- Eu também. - Confessou Reyna, se levantando. - Mas vamos enfrentar juntas, como sempre fizemos. - Elas sorriram uma para a outra e se abraçaram.

- Você está chorando? - Perguntou Hylla, depois de se soltar de Reyna e olhar para mim.

- Mas é óbvio que não. – Falei, passando a mão no olho. - Foi uma poeira que caiu.

- Mas aqui está limpo. - Falou Reyna, segurando o riso.

- Ah, bom que admite. – Falei, largando as coisas. - Parece que meu trabalho acabou.

- Eu decido isso. - Falou Circe, entrando na sala.

- Alguém já falou para as duas que ouvir conversas alheias é feio? – Perguntei, cruzando os braços. Elas reviraram os olhos me ignorando.

- Meninas, eu gostaria que ficassem aqui, mas não posso obrigá-las, podem ir. - Disse Circe, pegando na mão das duas. – Mas sempre que quiserem as portas estarão abertas. - As meninas abraçaram Circe, todas estavam emocionadas.

- Ei! - Chamei. - Eu não ganho abraço não?

- Não! - Falaram as três em uníssono.

- Também não precisavam ser tão rudes. – Falei, indo embora, mas Circe me puxou para um abraço. As outras duas repetiram seu gesto. Sim, Hylla me abraçou, mas falou que se eu contasse para alguém ela me faria sofrer.

O Filho de CaosOnde histórias criam vida. Descubra agora