Capítulo 10

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Quando os três adolescentes chegaram em casa após a "visitinha", para a infelicidade deles, Eliza já estava em casa e com uma expressão que sugeria que estariam encrencados. Mirabela ainda tinha esperança de contar outra história para a mãe, mas as roupas detonadas dos garotos ao seu lado os incriminava. Assim como a expressão de assustado de Willian ao olhar para a mãe dos gêmeos. 

-Eu até iria perguntar onde vocês estavam, mas creio que não será necessário –Começou Eliza, com um tom de voz firme, os braços finos e brancos cruzados sobre o peito enquanto ela andava de um lado para o outro na cozinha- Acho que a forma correta seria perguntar onde vocês estavam com a cabeça ao voltar lá!

Desde a carta de seu pai no mês anterior, Eliza passou a estar mais presente e a se preocupar mais com a segurança dos filhos. Mirabela não sabia dizer se isso era bom ou ruim. Por um lado, era muito bom e reconfortante, por mais que fosse estranho, poder finalmente contar com a mãe para várias coisas, ela não podia negar que sempre desejara isso quando via a relação de suas colegas de aula com as mães. Contudo, se Eliza tivesse permanecido como era antes dessa loucura toda começar, seria muito mais fácil realizar as "buscas". 

Mirabela decidiu testar a sorte ao responder para a mãe sobre a pequena "aventura" daquela tarde:

-Nós pensamos que não teria nada de errado em dar mais uma olhadinha na casa do Will, afinal quando você foi lá por último estava com pressa e poderia ter deixado de perceber algo –O olhar fulminante da mãe fez com que a garota completasse rapidamente- E realmente achamos algo!

A menina sabia que a mãe havia sido pega de surpresa, provavelmente sem pensar que poderiam ter sido bem sucedidos em sua jornada quando tantos perigos poderiam estar à espreita. Mas com a revelação da filha, todas as suas preocupações originais pareciam ter sido substituídas pela curiosidade quando sua expressão pareceu relaxar um pouco. Apenas um pouco. 

-O que?! Vocês realmente acharam algo?

-Sim, foi exatamente o que eu disse –Falou Mirabela sorrindo ao ver que acertou ao dizer sobre aquilo e livrá-los de um possível discurso sobre precauções que duraria horas- Nós encontramos um pingente com fotos e uma declaração no verso –Com um cutucão do irmão no braço ela complementou com uma revirada de olhos- Jonathan encontrou.

Sem esperar mais, Willian –que estava como o portador do pingente- entregou com delicadeza o objeto à mulher em sua frente. Eliza pegou e o abriu, esfregando os dedos que se sujaram com o barro do pingente. Ela pareceu observar as imagens por uma eternidade antes de finalmente erguer o olhar para eles e falar que não conhecia ninguém da foto. O que apenas aumentava a suspeita deles.

-Bella, onde está a declaração que você tinha dito?

Pegando o pingente das mãos da mãe, Mirabela retirou com cuidado, exatamente como tinha feito algumas horas antes, a foto do casal e mostrou o verso para a mulher. A garota torceu para que a mãe conhecesse aquela língua, já que a mulher possuía fluência em tantas por conta do seu trabalho. Pelo sorriso em seu rosto, ela realmente sabia do que se tratava.

-Realmente é uma declaração, e de amor eterno. –Mirabela pensou que o homem da imagem não parecia o tipo de cara que fazia declarações desse tipo, muito menos se fosse realmente o assassino dos pais de William, mas não falou nada –Se animem! Já podemos saber de onde, mais ou menos, são essas pessoas. A língua utilizada é português, então provavelmente veio do Brasil ou de Portugal. Claro que existem vários outros países que falam essa língua, mas esses são os principais. Já é um começo!

                                                                                  ***********

Apesar da empolgação da mãe com o pingente, ela não deixou de cobrar o castigo depois que a magia do momento havia passado. Durante toda a semana ela os proibiu de sair de casa, o que certamente piorou a vontade dos três de irem o mais rápido possível atrás de mais informação, pois apesar da mãe insistir que o pingente e a declaração eram ótimas pistas, novamente estavam estagnados.

Agora, Mirabela amaldiçoava o pai todas as noites pela insônia que era impossível evitar. Sua ansiedade por respostas era enorme, assim como o medo das mesmas e, durante o tempo presa em casa, a única coisa que conseguia pensar era nos que poderia fazer logo que fossem todos liberados de forma a conseguir mais informação e dessa vez não ser pega pela mãe. Exatamente o contrário do que Eliza queria.

Quando finalmente pôde sair de casa, Mirabela não perdeu tempo para colocar o seu plano em ação. Felizmente os meninos não tentaram impedi-la, na verdade até pareciam desinteressados demais no que ela iria fazer, dizendo apenas que queriam aproveitar o dia de sol para... Mirabela não se lembrava o que exatamente eles iriam fazer, mas também não se importava, desde que estivessem longe dela e não notassem sua ausência estaria ótimo. Sendo assim logo depois que Willian e Jonathan saíram de casa, a menina caminhou por um quarteirão para então chamar um taxi –para que sua mãe não suspeitasse do que ela estava prestes a fazer, já que Isabelle certamente não manteria a boca fechada.

Passados os costumeiros 30 minutos de viagem, ela chegou ao seu destino. Apesar do sol radiante que a envolvia com seu calor, parecia não ser capaz de fazer o mesmo com aquela triste e abandonada casa, que uma vez já a irritou com tanta alegria. Mirabela passou a semana inteira pensando e repensando sobre esse momento e afirmou para si mesma que teria coragem, mas talvez tivesse mentido novamente. Ela vinha refletindo (outra coisa que aquela maldita semana trancada em casa a fez fazer) sobre todas as vezes em que mentira para si mesma, chegando a conclusão de que, na verdade, nunca tinha sido verdadeira.

Talvez fosse por isso que se irritava tão facilmente e que buscava arduamente demonstrar que estava certa. Quando sua psicóloga falara isso meses atrás ela simplesmente surtou, o que agora ela via como uma forma de tentar, novamente, defender suas próprias mentiras. Se você não pode confiar em si mesmo, poderá confiar em alguém?

Refletindo uma última vez se ela realmente precisava fazer aquilo, Mirabela deu um suspiro e decidiu de uma vez por todas de que não mentiria mais para si mesma. Dando o dinheiro para a motorista, que logo em seguida foi embora, deixando-a sem escolha para voltar atrás. "Talvez seja melhor assim", pensou ela.

Antes que a garota conseguisse abrir o portão (que como de costume estava emperrado), ela foi abordada por alguém a chamando –alguém que por sinal ela não fazia ideia de quem se tratava e de como sabia seu nome:

-Ei! Você é Mirabela, certo? Mirabela Blake? –Perguntou um garoto que se aproximava rapidamente dela. A menina tinha certeza de que não o conhecia, mas algo em suas feições a fazia pensar que já o vira em algum lugar... Mas uma coisa era certa, ele era muito bonito. Seus cabelos eram negros como a noite, e a falta aparente de um corte fazia com que leves ondulações se formassem nas pontas. Quando ele se aproximou mais, Mirabela ficou hipnotizada. Os olhos do garoto eram tão esplêndidos que era quase impossível desviar o olhar deles. Ela não sabia dizer qual era mais bonito: um deles era âmbar e outro azul safira, os olhos mais lindos que ela já vira. Essa era a primeira vez que ela sentia suas bochechas corarem por algo diferente de raiva.

Recuperando os sentidos rapidamente e repreendendo a si mesma por ter ficado encarando o garoto desconhecido, ela respondeu, tentando soar o mais normal possível:

-Hum, sim. Sou Mirabela Blake. E quem é você?

(sobre)vivaOnde histórias criam vida. Descubra agora