(sobre)viva

Capítulo 25

Toda garota sonha com seu aniversário de dezesseis anos. Mas Mirabela não fazia esse estilo. A única coisa que a deixava empolgada era a perspectiva de tirar a carteira de motorista e então poder se libertar um pouco da dependência de sua mãe. Além disso, Isabelle prometera ajudá-la a conseguir a habilitação, não importava o quão ruim Mirabela fosse.

Depois que Jonathan a fizera falar sobre o que vinha escondendo, há cerca de um mês atrás, a relação dos dois estava quase como costumava ser antes, sempre contando abertamente o que descobriam um para o outro. Ainda naquele dia decidiram que não falariam nada a Willian, pois o garoto não precisava de ainda mais coisas para mexer com sua cabeça e ainda mais motivos para entrar nessa loucura. Não, aquilo já era mais que suficiente para ele.

Com Jonathan dando apoio emocional a Willian, Mirabela passava a maior parte do tempo sozinha, ou pelo menos até que Isabelle descobrira isso. Algumas semanas atrás, a garota chegara em sua casa e a arrastara para o shopping, alegando que não permitiria que Mirabela gastasse todas as férias trancafiada em casa como uma princesa da Disney. Para cumprir com sua palavra, Isabelle montou um cronograma com diversas atividades para fazerem até o término das férias de Mirabela –que coincida com um dia depois de seu aniversário.

Izzy conseguira, de alguma forma, a fazer esquecer completamente de suas preocupações durante aqueles dias e Mirabela não sabia se deveria a agradecer ou entrar em desespero por não ter descoberto mais nada. Por enquanto ela iria agradecer. Mas bastava que as duas se separassem para que todos os problemas viessem à tona e Mirabela ficasse a noite inteira olhando para as constelações pintadas em seu teto. Não sabia se algum dia conseguiria recuperar o sono perdido.

Mesmo sem nunca ter tido expectativas com sua festa de dezesseis anos, Mirabela realmente não esperava que ela ocorresse em tais circunstâncias –seu pai desaparecido e possivelmente morto; um enorme mistério por trás disso e o qual ela precisava descobrir; Willian em sua casa por causa da morte de seus pais também em decorrência dos planos de Robert...com certeza não era o que ela esperava. Mas tentaria manter seus pensamentos longe de tudo isso, assim como vinha fazendo na presença de Isabelle.

Ela não precisou se preocupar por muito tempo, pois alguns minutos mais tarde Isabelle estava tocando sua campainha freneticamente. Com um sorriso no rosto, Mirabela atravessa a sala correndo para abrir a porta da frente e recepcionar a garota. Ao abrir a porta não é apenas Izzy quem encontra, mas uma pessoa que há algum tempo não via, mas que toda noite insistia em lhe assombrar.

Vendo sua reação de surpresa, Isabelle abriu um enorme sorriso e começou a empurrar uma caixa em sua direção.

-Vamos lá garota! Terra chamando Mirabela –Ela fala em tom de robô- Fecha a boca antes que comece a babar.

Mirabela retoma sua postura e revira os olhos para sua amiga, dando espaço para que ela entrasse na casa e pegando de sua mão estendida a caixa. Os olhos bicolores a encararam com um misto de alegria e vergonha. Por um momento os dois apenas ficaram ali, olhando um para o outro sem reação, até que Isabelle começa a gargalhar da cozinha, onde já devorava os salgados que sua mãe comprara.

-Vão ficar se encarando o dia todo? Se eu soubesse nem teria arrastado Gustavo até aqui. –Ela vem na direção deles e os puxa pelo braço até a cozinha- Mirabela, você não tem noção do quão difícil foi trazer seu principezinho até aqui.

Mirabela sentiu suas bochechas corarem e viu que as do garoto ao seu lado fizeram o mesmo. Sentiu também uma tremenda vontade de bater em Isabelle e a fazer ficar em silêncio, mas ao invés disso, respirou fundo e respondeu:

-Não faço ideia do que você está falando, Izzy. –Se voltando para Gustavo, ela complementou- Realmente não esperava te ver aqui, mas seja bem-vindo, já que aparentemente minha amiga te sequestrou.

-Menos, eu não sequestrei ele. Falei educadamente com os tios do garoto que aceitaram quase fácil demais. E não me venha com papinho que não sabe do que estou falando porque não tem sido fácil aturar você falando dele, viu? -Ela lança uma piscadela para os dois e Mirabela tem vontade de sair correndo e gritando, ou de enterrar sua cabeça no chão da cozinha. Nunca sentira tanta vergonha. Seu corpo parecia estar pegando fogo e ela não sabia como reagir ou o que responder. 

Para livrar-lhe de ainda mais momentos embaraçosos, Jonathan e Willian adentram a sala e a cozinha. Os dois estacam no meio do caminho ao olhar para o garoto sentado na cadeira a seu lado. Jonathan troca um olhar interrogativo com a irmã.

-Jonathan, Willian, conheçam Gustavo. –O momento de alívio que sentira ao vê-los passou imediatamente. Ela ainda não havia contado sobre Gustavo para seu irmão, mesmo depois de prometerem não esconder mais nada um do outro. Sabia que isso não ficaria barato. –Gustavo, esse é meu irmão –Ela aponta para o menino de cabelos e olhos castanhos que os encaravam com misto de raiva e dúvida, provavelmente tendo notado o que ela acabara de lembrar- E esse é Willian Turner, ele costumava morar na casa em frente à sua. –Willian a encara, confusão brilhando em seus olhos dourados.

-Prazer! –Gustavo se levanta e cumprimenta os outros dois garotos, quebrando o gelo que se formava muito rapidamente. - Bella e eu nos encontramos uma vez quando ela fora até sua casa –Disse ele para Willian, enquanto Jonathan lançava um olhar inquisidor para ela- Realmente não esperava estar aqui hoje, até que Isabelle quase me obrigou a entrar no carro.

Seu irmão murmura um uhum entre os dentes cerrados, a raiva aparente em sua expressão e ele nem mesmo tenta disfarçar. Gustavo engole em seco, mas Mirabela sabe que não é para ele que aquela raiva é dirigida. É para ela.

-Mirabela, posso conversar um pouquinho com você? –Sem deixar espaço para discussão, Jonathan se dirige ao corredor que leva aos quartos e Mirabela o segue, temendo o que estava por vir. -Pensei que não iríamos mais guardar segredos um do outro! –Ela odiava precisar erguer a cabeça para encará-lo nos olhos, mas o fez mesmo assim- Quando pretendia me falar dele?

-Realmente não achei que fosse de extrema importância falar de uma paixonite temporária minha, sabe. –Ela deu de ombros, tentado fazê-lo acreditar que não era nada demais. -Eu realmente não esperava vê-lo novamente, não até Isabelle aparecer aqui arrastando o menino. –Ela acena com a cabeça na direção dos murmúrios de conversa- Vamos voltar, depois resolvemos isso, Jhon.

Mirabela estava quase entrando na sala quando seu irmão a segura pelo braço, quase fazendo-a perder o equilíbrio.

-Mira, só não confie demais nele, ok? Não quero que você se machuque.

Mirabela encarou o irmão espantada. Realmente nunca se imaginou recebendo conselhos, muito menos amorosos, dele. Mas Jonathan estava certo e na situação em que se encontravam, qualquer movimento errado e estariam encrencados. E era esse o maior medo da conversa que viria depois. Ela não teria como mentir novamente para seu irmão sobre como conhecera Gustavo, o que significava que teria que contar também o que permitira que o garoto visse. E isso não agradaria nada Jonathan.

Mas agora não era o momento para se preocupar com isso, afinal era o aniversário dos dois e o último dia de férias, então deveriam aproveitar. Ela disse isso a Jonathan, que apenas deu de ombros e a seguiu de volta à cozinha, onde Isabelle devorava a comida enquanto tentava fazer com que os dois garotos à sua frente se conhecessem e conversassem, o que não parecia estar dando muito resultado. Mirabela estava feliz que sua mãe não estaria em casa durante o dia todo, o que resultava em menos uma pessoa para ela precisar explicar sobre Gustavo. Mais tarde ela teria uma conversa séria com Isabelle.