Victor não sabia exatamente onde estava. Ele lembrava de Izu ter recebido uma mensagem no celular, era de Melina, a prima que não foi morta, e que o garoto tinha uma paixonite forte. Era para irem socorrê-la perto de um dos córregos da cidade. Ela tinha escapado de um cara de máscara branca que a perseguiu de carro até lá. Victor sabia que isso era possível, ele mesmo tinha passado por algo semelhante com a Veneza, mas foi a pé, e foi horrível.
Melina mandou a localização. Estavam perto, porém precisavam descer até o córrego, ela estaria por lá, perto de um galpão, que galpão? Ele não fazia ideia, muito menos Izu. O menino estava visivelmente tenso. Seu rosto tinha se contraído como os músculos de seu braço. Geralmente ele ficava mais quieto, porém, aquilo já estava fora do normal. Ele já tinha parado de falar totalmente, até para responder as perguntas de Victor, faziam uns cinco ou sete minutos. Sempre que recebia alguma mensagem ele apenas dava o celular na mão do irmão de ordem.
Mais para frente eles viram uma elevação de grama, como um morro, mas sua lateral era reta. Estranhamente reta. Apressaram o passo, e se depararam com portas metálicas abertas e um corredor escuro com diversas portas. Izumi olhou para o celular que tinha vibrado rapidamente, e o entregou para Victor.
"já chegaram?" ㅡ Estendeu o celular para o dono.
Não vai responder? ㅡ Izumi pegou o celular, desbloqueou e digitou rapidamente. Seu celular vibrou.
Ela quer que a gente entre, mas tem medo do cara estar em um dos quartos.
Eu também acho bem provável, mas somos dois, três se contar com ela, contra um, acho que sai uma briga boa. ㅡ Izu sorriu, finalmente.
Com certeza. ㅡ Os dois entraram juntos e começaram a procurar.
Depois deles entrarem Victor se lembrou de ouvir um grito e ter sua cabeça colada contra uma das paredes dos primeiros quartos em que entrou. E então lá estava ele, sem enxergar nada, amarrado, e provavelmente de costas com Izumi. Ele podia sentir sua cabeça raspando nos cabelos do menino. Tirando a parte de estar preso, aquela era uma situação até que nostálgica para ele.Alguns passos rasparam no chão de concreto.
Quem é? ㅡ O que cobria o olho dele foi rispidamente puxado, e revelou à sua frente uma figura peculiar.
Talvez fosse aquilo que Izumi tinha descrito como "uma fantasia tipo de fantasma, sei lá". Era basicamente uma máscara branca e quadrada, com uma espécie de capa grossa preta, que cobria até a altura do bíceps, e o resto era um conjunto preto que cobria o corpo todo, camiseta, calça, luvas, coturnos, tudo na cor preta. Se para Izumi parecia um fantasma, para Victor parecia a própria encarnação da morte.
Aquela coisa o olhava sem dizer uma palavra sequer. Em uma das mãos tinha uma faca, na outra ele segurava três celulares. Victor olhou em volta procurando Melina, mas a menina não estava em lugar algum daquele quarto. A figura guardou a faca e pegou o celular de Victor, para então desbloquear usando a digital do rapaz, e então mostrar a mensagem que mandou para Marie.
É sério isso? ㅡ O Fantasma afirmou com a cabeça lentamente. ㅡ Seu desgraçado!-
Ahn...? Ond- Victor? Victor!-
Izu, tô aqui, tô aqui, respira, você já vai entender, não vai? ㅡ O Fantasma foi até o garoto enquanto concordava.
Puta que o pariu! Victor a gente vai morrer, a gente vai morrer!-
Izu, calma-
Calma é o caralho! Esse filho da puta bateu sua cabeça na parede e depois fez o mesmo comigo! ㅡ O Fantasma aparentemente mostrou a tela para Izumi depois disso, e o garoto ficou calado.
Izu? Tá tudo bem? ㅡ Pequenos gemidos começaram a soar. ㅡ E-eu também tô com medo, mas a gente precisa ser forte, okay?
Uhum... ㅡ Escutar o garoto nervoso fez os poros da pele de Victor se arrepiarem e seus olhos marejarem, ele não devia passar por isso.
Ei, você, ㅡ O Fantasma se aproximou. ㅡ só temos isso de tempo? ㅡ Ele assentiu. ㅡ E só a Marie que pode decidir? ㅡ O mascarado deu de ombros. Depois de uma longa pausa escutando apenas o choro de Izumi, Victor levantou a cabeça e mirou o sequestrador. ㅡ Então me mata e acaba logo com isso.
O quê? Victor cala a boca! A Marie já deve ter chamado a polícia-
Izumi, ninguém sabe que a gente tá aqui, nem sabemos se a Melina tá viva, e de qualquer jeito um de nós vai acabar morrendo-
Você não sabe! ㅡ Os murmúrios do menino ficaram ainda mais altos.
Sim, eu sei, tanto que já escapei na minha oportunidade, agora é a sua vez... Meio dia da vida, lembra? ㅡ O Fantasma chegou mais perto.
Ma-mas, mas eu não... eu-e-eu- ㅡ A faca foi posicionada na parte baixa do pescoço de Victor.
Sem "mas", Izu... Fala pro meu pai que eu vô dever o diploma... Fica be- ㅡ A lâmina cavou por dentro da carne úmida do rapaz, enquanto o menino gritava afoito com o som do amigo engasgando no próprio sangue.
Era como se alguém penetrasse com o dedo na garganta de Victor. Um dedo fino, cortante e gelado. Ele queria dizer tanto, ele queria fazer tanto. Izumi estava amarrado, e ele não podia soltar o garoto. Izumi chorava e ele não podia abraçar o menino e o acalmar. A dor foi pior quando a faca foi puxada. Quase que imediatamente Victor sentiu o sangue se aglomerando na garganta e o ar começando a ficar escasso. Victor tinha prometido voltar pra ajudar o garoto e agora era o motivo pelo qual ele chorava e soluçava. Será que ele foi um bom irmão? Um bom amigo? Um bom mestre? Isso ele nunca saberia, aqueles monstros queimaram todos os sonhos e expectativas de todos ao seu redor, porque com Victor não seria diferente? Deu a primeira inspirada e imediatamente um jato vermelho e quente saltou de sua boca. Logo começou a tentar tossir o sangue para fora, mas seus pulmões já tinha começado a serem esmagados com a ausência do ar. Marie também era uma preocupação sua, como ela ficaria assim que soubesse que ele se sacrificou? Ela tomaria a culpa para ela, ou daria um passo à frente? Suas narinas queimava com o cheiro de sangue que subia. O sequestrador já não estava mais ali, a última paisagem dos olhos de Victor foi a porta azul metálica fechada.
"Me desculpem...".
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Anamnese.
Mystery / ThrillerO jogo de morte dos assassinos Veneza e Monstro, de três anos atrás, marcou para sempre a vida de quem vivenciou os casos. Agora, com a morte de uma adolescente, todos se perguntam se os horrores do passado estão voltando para os assombrar.