Capítulo 26 - Pelos velhos tempos

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"A gente aceita o amor que acha que merece." (As vantagens de ser invisível – Stephen Chbosky)

Minha mãe veio me buscar de carro, o que foi bom, em parte. Ela acabou dando de cara com Elena, que estava na minha casa às 8 da manhã (!!). Não dava nem para esperar que eu fosse embora?

Um minuto de silêncio pelo  bom senso desta mulher.

...

Eu ainda acho que ela fez isso de propósito, até porque não pensou duas vezes antes de tascar um beijão no meu pai assim que a minha mãe entrou em casa. Existem muitas coisas constrangedoras nessa vida, como quando você está dançando no quarto ao som da sua música preferida e alguém te vê, ou quando você chega atrasado na escola e vira o centro das atenções, ou até mesmo quando você cai em público. Mas ver seu pai dando um beijo digno de cinema em outra mulher que não é a sua mãe, sendo que a mesma está assistindo à cena, não é nada legal.

Constrangimentos à parte, depois de muitos abraços demorados do meu pai, e de vários: "Juízo!" mandados por ele via Whatsapp, eu chego em São Paulo. Sinto uma sensação estranha ao entrar na minha antiga casa, não sei explicar muito bem. Talvez uma mistura de nostalgia e bem-estar. Me sinto bem por estar aqui, mas sinto saudade de quando essa era a minha casa de verdade. De quando eu passava tardes na sala jogando conversa fora com as minhas amigas, dos almoços e jantares em família, e de muitos outros momentos vividos aqui que agora só existem na minha memória. 

– Convidei suas amigas para passar a tarde conosco. – minha mãe diz.

Concordo com a cabeça. Droga, tinha esquecido de falar com elas. Com certeza serei fuzilada com um questionário incessante quando elas chegarem aqui.

Jogo a minha mochila na cama do meu antigo quarto. Estava tudo do mesmo jeito: arrumado e organizado. A não ser, claro, pela minha estante de livros que agora está vazia porque os livros que eu tinha aqui foram levados para o Rio, e todos os outros eu ganhei do meu pai.

– Vamos almoçar? – minha mãe chama, encostada na porta do quarto.

O almoço consiste basicamente em macarrão com molho de tomate. Nada de carne, porque, segundo a minha mãe: "Nós hippies defendemos a paz e o amor entre todas as formas de vida, então não é justo comer a carne dos animais. Pobrezinhos!"

Mesmo com a restrição de tudo o que derive de animais, tenho que admitir que o almoço está muito bom. Eu e minha mãe não trocamos uma só palavra enquanto comemos, o que é meio estranho. Nós simplesmente não temos sobre o que conversar. Ela parece bem pensativa, então decido não puxar assunto.  

– As garotas chegam daqui a pouco. – ela levanta e coloca o prato sujo na pia – Se precisar de mim, estarei no quarto.

Eu apenas concordo com a cabeça novamente.

Mais ou menos uma hora depois, a campainha toca. Sou aclamada com um "Oiiiiiii" em coro das meninas, que estão eufóricas.

 Apresento-lhes minhas amigas: Amanda, a sonhadora. Viciada em filmes e livros, ela é daquele tipo que vive procurando um príncipe encantado e que acredita em contos de fadas. Infelizmente, ás vezes ela acaba se metendo em roubadas por causa disso.

 Priscilla, a realista. Ela adora jogar futebol, e não liga muito pra esse negócio de amor. Já namorou algumas vezes, mas nada muito sério. Graças a ela, ninguém nunca mexeu com a gente na escola. Aliás, não sei quem em sã consciência entraria em uma briga com a Pri. Não que ela seja uma "Maria homem", como dizem. Na verdade ela é bem bonita, e não deixa de ser feminina pelo fato de ser durona.

Bianca, a conselheira. Sabe aquele tipo de pessoa que sempre está disponível para ser um ombro amigo? Pois é, essa é a Bi. Entre nós, ela funcionava como uma espécie de "mediadora". Quando nós brigávamos, ela tentava nos acalmar. Quando a Priscilla se metia em brigas na escola ou quando batia nos outros garotos, ela sempre apartava. E quando a Amanda inventava suas paixonites imaginárias, acreditando que um garoto estava perdidamente apaixonado por ela quando na verdade ele mal sabia seu nome, novamente a Priscilla estava lá para dar-lhe um choque de realidade.

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