VINTE E OITO

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No dia seguinte, eu estacionei no meu lugar de sempre, pulei para fora do carro e ignorei completamente Noah, indo em direção a Maya que estava parada no portão.

E embora eu normalmente faça todo o possível para evitar contato físico com as pessoas, não posso deixar de abraça-la.

— Ei, eu também te amo. — Ela ri, me afastando. — Eu não ia ficar brava com vocês para sempre.

O cabelo dela está seco e sem vida, o esmalte preto de sua unha está descascado, as olheiras sob seus olhos parecem mais escuras que o normal, e o rosto dela está terrivelmente pálido.

— Como se sente? — Eu perguntei, olhando ela com cuidado, tentando conseguir uma leitura, mas fora sua aura parecer cinza, fraca, e translúcida, eu não consigo ver muita coisa.

— O que está acontecendo com você? — Ela me segura pelos ombros levemente, evitando um novo abraço. — De repente resolveu me dar tanto amor e afeição.

— Eu fiquei sabendo que você estava doente, e quando você não veio na escola ontem. — Paro, me sentindo ridícula por estar tão próxima.

— Eu sei o que está acontecendo aqui. Isso é culpa sua não é? — Ela aponta para Noah, que está se aproximando. — Você transformou minha amiga gelada, em uma sentimental amável.

Noah ri, mas não parece ter realmente achado alguma graça.

— Foi só uma gripe repentina. — Ela diz, enquanto Ian põe os braços ao redor dela e passamos o portão. — E eu fiquei deprimida por conta de Eva, só piorou. Sério, tive tanta febre que desmaiei algumas vezes.

— Sério? — Me afasto de Noah para poder andar do lado dela.

— Sim, foi muito estranho. — Maya continua. — Toda noite eu ia para cama usando uma coisa, e acordava usando outra completamente diferente. E quando ia procurar o que estava usando, simplesmente não achava.

— Olha, o seu quarto é bem bagunçado. — Ian ri. — Ou talvez você estivesse alucinando; você sabe que isso pode acontecer quando se tem febre.

— Talvez tenha sido apenas alucinação por conta da febre. — Noah se intromete de repente. — Havia alguém para cuidar de você?

— Você tá brincando? — Ela balança a cabeça. — A minha porta estava trancada o tempo todo. Eu poderia ter morrido lá dentro e ninguém saberia.

— E quanto a Lillian? — Eu pergunto, com o estômago apertando ao mencionar o nome dela.

— Lillian está em Nova Iorque. — Maya me olha de uma maneira estranha. — Ela partiu sexta. Mas deixa eu falar com vocês, eu tive sonhos muito estranhos. — Ela para perto da sala de aula e se encosta na parede.

— Você sonhou com um penhasco ou algo do tipo? — Pergunto, enquanto fecho o zíper da mochila de Ian, que estava aberto sem ele perceber.

— Não. Só coisas gótico selvagens, é difícil de explicar, mas tinha bastante sangue.

E no segundo que ela diz isso, no segundo que ouço a palavra sangue, sem nenhum motivo aparente, tudo fica preto e meu corpo vai em direção ao chão. 

— Emily? — Noah chama, me pegando antes que eu bata no chão. — Emily! — Ele grita, a voz dele sufocada de preocupação.

E quando tento abrir os olhos para encontrar os dele, algo sobre a intensidade do seu olhar me parece assustadoramente familiar. Mas quando a memória começa a se formar, é apagada pelo som da voz de Maya.

— É assim que começa. — Ela diz. — Quer dizer, ela não desmaiou como eu, mas começa com uma baita tontura.

— Estou bem, eu juro. — Mas ninguém me escuta, então Noah envolve os braços em minha cintura e me leva de volta para o seu carro. — Isso é ridículo. — Digo, enquanto ele sai do estacionamento e dirige para longe da escola. — Você vai me fazer reprovar por faltas!

— Você não vai reprovar. — Ele olha brevemente para mim, antes de se focar de volta na rua.

— Devo te lembrar que você ficou tonta? Tem sorte de eu ter te pego em tempo.

— Sim, mas aí é que está, você me pegou em tempo. E agora eu estou bem. Se você está realmente tão preocupado comigo, deveria ter me levado a enfermaria da escola, não precisava me sequestrar.

— Não estou sequestrando você. — Noah diz, claramente incomodado. — Só quero me certificar de que está bem.

— Oh, então agora você é médico? — Reviro os olhos. — Noah, onde você está me levando? — Digo, quando vejo que ele passou direto pela rua que leva para minha casa, mas ele não responde nada por dez minutos, quando passamos por um grande portão.

— Minha casa. — Ele acena para uma atendente familiar para mim, que sorri e acena para nós. Noah dirige por um condomínio fechado antes de fazer uma série de curvas, parando em uma enorme garagem vazia.

Então ele pega minha mão e me leva através da cozinha, até um escritório onde eu paro com as mãos na cintura, absorvendo todos aqueles móveis, e com a estranha sensação de já ter estado nesse lugar, mesmo não me lembrando disso.

— Isso é realmente tudo seu? — Eu pergunto, passando a mão por um sofá, observando as lâmpadas, tapetes, e uma mesa de madeira escura, coberta de livros e uma foto minha. — Ei, quando você tirou isso? — Ergo a foto da mesa e a estudo de perto, sem ter qualquer memória desse momento.

— Você age como se nunca tivesse estado aqui antes. — Ele faz menção para que eu me sente.

— Mas eu não estive. — Eu dou de ombros.

— Você esteve. — Ele insiste. — Domingo passado, depois da praia. Agora sente, eu quero ver você descansando.

Eu afundo nas almofadas bem macias, ainda segurando a foto e me perguntando quando ela foi tirada. Meu cabelo está cumprido e solto, meu rosto levemente corado, e estou usando um moletom cor de pêssego que eu não me lembro ter. Embora eu pareça estar rindo, meus olhos estão sérios.

— Eu tirei ela um dia na escola quando você não estava olhando. Eu prefiro fotos espontâneas, entende? — Ele diz, tirando a foto das minhas mãos e colocando de volta na mesa. — Agora, feche os olhos e descanse, vou fazer um chá.

Quando a bebida fica pronta, ele coloca a xícara quente em minhas mãos, então se ocupa colocando um cobertor ao meu redor.

— Isso é muito gentil e tudo mais, mas não é necessário. — Levanto, colocando o chá na mesa e olhando para o relógio, pensando que se sairmos agora eu ainda posso chegar a tempo da terceira aula. — Devemos voltar para o colégio. Sentir tontura é normal, certo? E se eu estou doente, não quero que você pegue.

— Eu não fico doente. — Ele ri.

— Oh, então agora você não fica doente? — Balanço a cabeça. — Então vamos ver, você não fica doente, você não se mete em problemas por matar aula, você só tira notas boas apesar de nunca estar no colégio, você pega um pincel e faz obras de arte. Você consegue cozinhar tão bem quanto qualquer chefe, você costumava ser modelo na França, que foi antes de você viver na Itália, que foi depois de viver na Inglaterra, Espanha, Nova Iorque, Roma, e outros lugares. Você é desempregado e emancipado, mas ainda assim você vive numa casa luxuosa e dirige uma máquina.

— Egito. — Ele diz, me dando um olhar sério.

— O quê?

— Você disse que eu vivi na Roma, mas eu estava no Egito.

— Tanto faz, Noah! — Ele só pode estar de brincadeira comigo. — O ponto aqui é...

Eu desvio o olhar, minha mente se agarrando a algo que já esteve me atormentando a algum tempo. Algo sobre Noah, algo sobre essa vida de outro mundo dele. Ele é um fantasma como Lesley? É impossível, todos podem vê-lo.

Eu sinto que estive perto de descobrir, mas se forço minha mente a lembrar, nada acontece.

— Emily. — Ele diz, com a mão em minha bochecha. — Emily, eu jur-

— Me leve para casa. — Digo, antes que ele possa terminar, estou fora do sofá e fora do alcance dele.

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