Afasto o cabelo dos meus olhos e corro cegamente através da neblina, esperando poder localizar a trilha, voltar para onde comecei. Meus pulmões ameaçando explodir em meu peito, enquanto minhas sandálias se rompem e abandonam os meus pés, mas mesmo assim eu continuo correndo. Correndo enquanto machuco os pés nas pedras, correndo enquanto me falta fôlego, correndo por uma vida que eu não sei se vale a pena viver. E como em meu sonho, onde eu também corria, não faço ideia de como isso termina.
Acabo de alcançar o começo da luz que leva até a trilha, quando Lillian aparece fora da neblina e para na minha frente. E mesmo tentando me esquivar, ela levanta uma perna para que eu tropece e caia de rosto nas pedras. Fico ali caída em uma piscina do meu próprio sangue, escutando ela rir vendo meu nariz quebrado.
— Uau Emily, você está horrível. — Ela faz uma cara de desgosto ao ver que está me faltando dentes. — Seriamente horrível. Me pergunto o que Noah uma vez viu em você.
Meu corpo sofre com a dor, minha respiração é fraca e instável, e um gosto metálico e amargo de sangue cobre minha língua.
— Suponho que queira saber de todos os detalhes, embora não vá se recordar na sua próxima vida. Mas ainda assim, é muito divertido ver o choque em seu rosto toda vez que eu explico. — Ela ri. — Eu nunca fico entediada com essa parte da nossa história, sabia? Todas as vezes que eu te mato, em todas as nossas vidas, é extremamente prazeroso.
Enquanto Lillian debocha acima de mim, tento tocar o rosto e sinto arrependimento instantâneo ao fazer isso.
— Por onde eu começo? — A mulher bate os dedos nos próprios quadris. — Bem, como você já sabe, eu que troquei a pintura que estava em seu porta-malas. Quer dizer, você como a mulher de cabelos amarelos? Entre você e eu, Picasso ficaria furioso. Ainda assim, eu o amo. Me refiro a Noah, não a esse velho artista já morto. — Ela ri. — Vejamos, eu coloquei a pena e plantei aquele sonho em sua cabeça.
— Por favor. Lillian, por favor. — Digo, fazendo esforço para sentar-me.
— É uma pena que você não tenha morrido naquele acidente, teríamos evitado muitos problemas Emily. Por sua culpa, Eva está morta e Maya... olha como ela esteve próxima. Realmente, que egoísta da sua parte. — Ela me olha, mas não respondo, me perguntando se ela está assumindo a culpa.
— Como você já está prestes a morrer, não faz mal. — Ela levanta a mão direita como se fosse fazer um juramento. — Eu, Lillian Madalena Auguste, — A mulher levanta uma sobrancelha ao falar a última parte. — Matei Eva Porter, que não estava ajudando em nada e eu precisei tira-la do caminho para ter acesso completo a Maya. — Ela sorri.
— Sim, como você suspeitava, eu roubei a sua amiga de propósito. O que é muito fácil de fazer com as pessoas que estão perdidas e ausentes de amor. Eu a convenci de fazer uma tatuagem que quase lhe mata, mas apenas porque não pude decidir se eu a mataria de verdade, ou a mataria para trazê-la de volta e a transformar em imortal. — Ela justifica, como se fosse diminuir o peso de suas ações. — Mas eu esperei muito e Noah se intrometeu. Sabe Alison e aquele idiota que ela levou para a festa? Erro meu. Imagina sua inteligente e bem sucedida tia com aquele perdedor?
— Mas por que? Para quê envolver todos? — Digo a ela com esforço, com a boca sangrando.
— Queria te mostrar quão solitária pode ser sua vida. Queria te mostrar como as pessoas te abandonam facilmente em troca de algo mais emocionante. Está completamente sozinha, Emily. Isolada e sem amor. Tua vida é patética e dificilmente vale a pena vivê-la, então estou te fazendo um favor. — Ela sorri. — Mesmo estando certa de que não vá me agradecer.
Olho para Lillian, me perguntando como alguém pode ser tão cruel e horrível por dentro. A olho fixamente nos olhos e me movimento um pouco para trás, esperando que ela não perceba.
— Eu não estou mais com Noah, nem ao menos sei onde ele está. Por que não vai atrás dele e me esquece? — Mesmo com toda a dor, me arrasto mais um pouquinho para trás.
— Veja, Noah é meu e sempre foi meu. Mas você continua aparecendo nessa tediosa alma reciclada. E desde que você insiste nisso, se tornou o meu trabalho te matar em todas as nossas vidas. — Ela empurra o meu pé sobre as pedras. — Você pensa que isso dói? Apenas espere. Vamos lá, sigamos com a brincadeira. — Ela me oferece a mão para que eu levante e continue fugindo. Mesmo não querendo que ela me toque, aceito, pois é a única forma que tenho de ficar em pé.
Olho ao redor do desfiladeiro, esforçando minha vista, estudando o lugar, tentando encontrar algum tipo de fuga. Dou um passo para trás e tropeço de novo, pela falta de força em meus pés. Minhas mãos procuram o chão, até que meus dedos envolvem uma pedra afiada, que jogo em seu rosto.
— De novo isso. — Ela suspira, enquanto vejo a ferida que a pedra fez em seu rosto, se fechar sozinha e automaticamente sarar. — Vamos lá, tente algo novo. Veja se consegue me divertir.
Ela para na minha frente, com as mãos nos quadris e sobrancelhas arqueadas, mas eu me recuso a correr. Me recuso a fazer qualquer movimento. Além do mais, tudo que ela disse é verdade, tudo em minha vida é um desastre e eu arrasto todos.
Observo como ela se aproxima de mim, sorrindo por antecipação, sabendo que meu fim está próximo. Fecho os olhos e recordo o momento antes do acidente. Vendo como eu era saudável e feliz, e estava rodeada por minha família. Imaginando aquela cena com tanta força, que posso sentir o calor do banco de couro do carro, posso sentir o rabo do meu cachorro balançando contra minha coxa, Lesley cantando a plenos pulmões.
Me agarro a esse momento, segurando em minha mente, experimentando as sensações, os perfumes, os sons, as emoções, como se tivessem ali mesmo. Querendo que esse seja o último momento antes de ir, revivendo a última vez que fui verdadeiramente feliz. E quando estou viajando nessas lembranças, escuto Lillian
— Que diabos?
Abro os olhos para ver o estado de choque em seu rosto, seus olhos me analisando e mantendo a boca aberta. Me olho e vejo que minha roupa não está mais rasgada, não tem mais sangue em meus pés. Correndo a língua pela boca, sinto todos os dentes lá outra vez intactos. Não faço a menor ideia de como isso aconteceu, e nada em minha vida faz sentido, então preciso agir rápido antes que seja tarde demais.
Lillian recua perplexa, cheia de dúvidas, enquanto avanço na direção dela. Não sei o que trará o próximo passo, muito menos o seguinte. Sei que estou correndo contra o tempo.
— Então, o que vai ser? — Digo. — Doces ou travessuras?
Vote nesse capítulo caso queira me ajudar com a história e incentivar com ela.
VOCÊ ESTÁ LENDO
All for us
Mystery / ThrillerEmily, de 18 anos, sobreviveu a um acidente de carro que matou toda a sua família. Agora ela vive com sua tia na Carolina do Sul, sendo atormentada não só pela culpa de ter sido a única sobrevivente, mas também pela sua nova habilidade: ouvir os pen...