Entrei em casa e subi diretamente para o meu quarto, já que não preciso olhar para saber que minha tia Alison não está em casa.
Alison está sempre trabalhando. O que significa que a casa enorme fica só para mim, o tempo todo. Embora eu passe a maior parte do tempo em meu quarto.
Eu as vezes me sinto mal por Alison. Me sinto mal por saber que a vida que ela sempre trabalhou para ter, foi por água abaixo depois que eu cheguei.
Mas, ou era ficar com ela - a única irmã da minha mãe - ou ir para um orfanato até fazer 18 anos. Alison não sabe nada sobre criar crianças, então eu cresci em uma casa enorme, com um quarto enorme que foi mobiliado pela melhor decoradora da cidade, mas sem a presença real de um familiar.
Eu tenho tudo em meu quarto, como: uma cama, cômoda, mesa, TV, closet, um banheiro enorme com uma banheira e chuveiro separado, uma porta na parede que dá para a minha própria sala de jogos, com outra TV, um balcão, microondas, som, sofá e puffs.
Engraçado como antes eu daria absolutamente tudo para ter um quarto assim - parece mais um apartamento dentro de uma casa - mas agora eu daria tudo para ter toda a minha vida antiga de volta.
Eu penso assim, já que a Alison passa a maior parte do seu tempo cercada de grandes advogados e executivas VIPs, ela achou que tudo isso fosse necessário.
Nunca tive certeza se ela não tem filhos porque está sempre trabalhando, ou porque não encontrou o cara certo para isso, ou ela apenas não quer um para início de conversa.
De qualquer forma, não precisa ser clarividente para saber que quando alguém quer ter um filho, normalmente pensam em um bebê, não em uma adolescente de 1,60 com poderes e uma grande bagagem emocional.
Então, por causa disso, eu tento ao máximo ficar quieta, respeitosa e longe do caminho de Alison. E definitivamente não digo que falo com minha irmã morta quase todos os dias.
A primeira vez que Lesley apareceu, ela estava sentada na cadeira ao lado da minha cama de hospital, no meio da noite, acenando com a mão.
A princípio eu assumi que estava alucinando, mas depois de piscar várias vezes e esfregar os meus olhos, ela ainda estava ali e acho que nunca me ocorreu pedir ajuda.
Eu observei enquanto ela vinha para frente da cama, apontou para o gesso que cobria o meu braço e perna, e riu. Quero dizer, foi uma risada silenciosa, mas ainda assim eu não achei engraçado. Assim que ela notou minha expressão, arrumou a postura e gesticulou como estivesse perguntado se doía.
Eu dei de ombros ainda um pouco infeliz com a risada silenciosa que ela deu, e ainda um pouco assustada com a presença dela ali. E embora eu não estivesse completamente convencida de que era ela ali, isso não me impediu de perguntar sobre meus pais e o Manteiga. O que obviamente não obtive respostas.
Da segunda vez que ela apareceu, fiquei tão feliz em vê-la que não fiz menção nenhuma ao fato dela estar usando não só o meu casaco favorito, como também meus melhores jeans (que eram tão longos que a bainha ia até os tornozelos), e o bracelete que ganhei no meu aniversário de 14 anos.
Ao invés disso, eu só sorri e agi como se não tivesse notado enquanto me inclinava e perguntava sobre a mamãe e o papai. Mas Lesley só sorriu e bateu os braços no próprio corpo.
— Você quer dizer que são... anjos? — Meus olhos se esbugalharam em surpresa.
Ela revirou os olhos e balançou a cabeça, se abaixando enquanto gargalhava silenciosamente.
— Tudo bem, que seja — Joguei meu corpo para trás contra o travesseiro, pensando que ela estava se divertindo com minha cara, mesmo que ela estivesse morta. — Me diga, como é lá? Você gosta de morar no céu?
E então ela deu de ombros e desapareceu.
Eu fiquei mais de um mês no hospital, com ossos quebrados, uma concussão, hemorragia interna, cortes e machucados, e um corte bem fundo na testa. Então enquanto eu estava quase morta e dopada de medicamentos, Alison foi sobrecarregada de organizar tudo para o funeral e a minha nada esperada chegada.
Ela me sugeriu fazer uma lista de coisas que eu poderia querer arrastar da minha vida perfeita em Eugene, Oregon, para uma vida nova em Laguna, Califórnia.
Mas eu não queria nada além de algumas roupas. Não é como se uma caixa cheia de coisas idiotas trariam minha família de volta.
Eu recebia visitas regulares de uma psicóloga que sempre insistia para que eu fosse as sessões de terapia em grupo, na sala 734. Como isso poderia me ajudar?
Como poderia me fazer sentir melhor confirmar algo que eu já sabia — que não só eu era solenemente responsável pelo que tinha acontecido a minha família, mas também que eu fui idiota o bastante, egoísta o bastante, e preguiçosa o bastante para perder tempo procrastinando enquanto minha família ia em direção a eternidade?
No momento que tranquei o porta do meu quarto e joguei a garrafa de água em cima da cama, pronta para tirar o uniforme e ir para o banho, ouvi Lesley dizer:
— Você já viu esse lugar? A TV enorme, a banheira, a sala de jogos?
— Eu achei que você não podia falar — Olhei para minha irmã, que, por sinal, estava com uma roupa colorida e tênis dourados.
— É claro que eu posso falar, não seja ridícula — Ela revirou os olhos.
— Mas das primeiras vezes...
— Eu só estava me divertindo. Vai me processar? — Ela começou a andar pelo meu quarto, passando as mãos pela mesa, no notebook, e no novo tablet que Alison deve ter colocado ali — Eu não acredito que você tem um quarto desses. Isso é injusto! E você nem está aproveitando! Quero dizer, você já viu a vista?
— Eu não me importo com a vista. E eu também não acredito que você me enganou fingindo que não podia falar.
— Você vai superar. — Ela riu.
— Onde você está conseguindo essas roupas? — Eu perguntei, a olhando de cima a baixo — Primeiro você aparece com minhas coisas e agora está usando esse casaco colorido que eu sei que nunca foi comprado.
— Como se eu precisasse da permissão da mamãe quando eu só posso ir na casa de alguns famosos pegar o que eu quiser. De graça.
— Sério? — Perguntei, meus olhos se arregalando por pensar que isso seja realmente verdade. — Isso não é errado?
Mas ela só me mandou levantar para ver a vista, e quando olhei para trás ela já havia desaparecido.
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All for us
Mystery / ThrillerEmily, de 18 anos, sobreviveu a um acidente de carro que matou toda a sua família. Agora ela vive com sua tia na Carolina do Sul, sendo atormentada não só pela culpa de ter sido a única sobrevivente, mas também pela sua nova habilidade: ouvir os pen...