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Desculpa a demora e o horário! Eu peguei covid e mal conseguia levantar da cama, por isso postando um pouco de preenchimento aqui para não passar em branco. Aviso de gatilho sobre menções à homofobia.

Perdão por qualquer erro de ortografia e boa leitura!

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No sábado, eu me sentia quase suspeitosamente bem. Provavelmente pela sessão com García – eu sempre saía de seu consultório me sentindo mais leve, pensando que o amanhã seria um dia melhor – e pela expectativa da viagem que me fez acordar desperta, conferindo todas as malas após alimentar Oscar, mesmo que já tivesse feito isso na noite anterior. Eu também não tive pesadelos e todos os sintomas da gripe foram reduzidos a uma leve tosse ocasional no apartamento silencioso, o que podia muito bem ser pelo todo o fumo.

Patrícia estava dormindo – era possível ouvir o motor do seu ar-condicionado pela varanda que abri ao fazer o café da manhã –, Victória estaria dando seu sinal de vida assim que acordasse – ela fora dormir na casa da namorada – e Oscar parecia perfeitamente entretido com o papelão do leite que joguei de propósito em seu alcance. Eu aproveitei a estranha paz para fumar na mesinha de ferro da varanda, encarando meu celular sobre ela e tentando me acostumar com a ausência das mensagens de Sandro e de Enila me perturbando com algo sobre mamãe.

Uma parte de mim, influenciada pelas palavras do meu psicólogo ainda martelando em minha cabeça, quis saber o que seria de mim e Enila agora que nossa mãe morreu. Sem nenhuma desculpa familiar para nos unir, me perguntei se nos afastaríamos eventualmente, se eu devia fazer algo a respeito, se eu sentiria falta dela. O buraco em meu peito se fez mais presente com essa possibilidade.

No fim do ano, Victória e Patrícia terminariam suas faculdades e sairiam do apartamento rumo às suas vidas, ambas já certas do futuro que queriam e das pessoas que estariam nele. E Eva também, se eu não estava enganada.

Victória gostava de me pintar na visão que fantasiava do seu casamento com Bruna, mas eu ainda tinha anos de faculdade pela frente e sabia como uma rotina corrida poderia nos afastar – ainda mais com meus planos de fazer residência.

Eu já mal falava mais com Elena e Lola, por exemplo. Minha amizade com Eva era algo que eu queria muito manter e esperava fortalecer com essa viagem, mas parecia frágil com todo o lance de Sandro e Rubi. Enila, no entanto, estaria ligada a mim independente do tempo e da distância e, apesar de isso ser algo que eu costumava odiar, agora meio que me aliviava.

Eu morria de medo de ficar sozinha.

Alguns momentos depois, Oscar se juntou a mim num salto silencioso e sentou sobre as patas para encarar a cidade abaixo. Eu acariciei seus pelos pretos, minha mente me levando a quando o vi pela primeira vez. Eu me sentia terrivelmente só naquela época também.

Foram vários meses depois do meu pai morrer. Oscar era um gato de rua magrelo, briguento e arisco que só se aproximava de mim quando havia alguma comida na mão que eu estendia. Aos poucos, no entanto, passou a me acompanhar à escola e até em casa depois disso, se afastando quando chegávamos.

Na manhã em que eu estava sentada na calçada após deixar a casa atrás de mim em chamas, Oscar desfilou ao meu lado, alheio às madeiras estralando no fogo a poucos metros, e nunca mais saiu de perto.

Se o cão era o melhor amigo do homem, o gato certamente era o da mulher. Então eu me lembrei que não estaria sozinha, apesar de qualquer futuro, porque Oscar estaria comigo.

Bom, menos neste futuro próximo.

— Vai sentir falta de mim nessas semanas, colega? — Acariciei sua coluna curvada, apreciando o ronrono que se seguiu. — Eu com certeza vou sentir falta desse som.

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