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Avisando sobre menções a violência familiar por aqui. Perdão por qualquer erro de ortografia e boa leitura!

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Ele não era o melhor pai do mundo. Mas ele tentava ser. E isso sempre foi o suficiente para mim.

Natália — sua voz rouca e alta reverberando pela casa foi a primeira coisa que ouvi quando passei pela porta naquele dia, transpirando com a mochila pesada da escola nas costas. Eu xinguei baixinho enquanto entrava ainda com a respiração ofegante da corrida. —, venha até aqui.

Eu obedeci, segurando a alça puída sobre o ombro como se minha vida dependesse disso, pensando em qual das merdas que eu tinha feito ele descobrira – eu realmente esperava que não fosse o boquete que fiz semana passada no banheiro masculino e jurava que o cara mijando na cabine ao lado escutara alguma coisa enquanto eu apertava o pênis do garoto em minha frente com força para ele não gozar e nem soltar um pio –, como ele descobrira e qual seriam as consequências.

Eu estava bem em ouvi-lo gritar a plenos pulmões, apesar de ele ficar assustador quando isso acontecia, porque as explosões não duravam muito e eu só teria que fazer hora no quarto até que ele se acalmasse antes que eu voltasse pedindo desculpas que seriam aceitas com um grunhido e um revirar de olhos. Mas eu torcia para que mamãe não se metesse porque ela gostava de me castigar usando um galho pesado e grosso em minhas costas e pernas. Muitas vezes farpas encravaram nas feridas com pus e bolhas tornando impossível dormir à noite e eu chorava por semanas sem poder falar ao meu pai, porque minha minha mãe dizia que ele iria bater nela por isso e seria minha culpa enquanto apoiava ameaçadoramente a longa madeira na porta da cozinha para o quintal. Eu tremia toda vez que passava por lá.

— Oi, pai. — Eu murmurei, olhando de soslaio para a cozinha em busca de qualquer pista que mamãe havia vindo almoçar em casa como fazia às vezes, mas o corpo grande de meu pai se erguendo infinitamente da poltrona chamou minha atenção por primeiro.

— Como foi a aula hoje?

Eu queria espremer os olhos, mas ele achava conversas sem olho no olho desrespeitoso e sinal de covardia. Tudo o que eu pensava era: o boquete não, o boquete não, o boquete não.

— Tranquilo. — Pigarreei, me perguntando que matérias eu tive enquanto não estava dormindo no fundo da sala. — A professora de redação mandou a gente ler um livro. — Eu não me lembrava o nome, mas devia ser o suficiente.

Ele piscou, parecendo descoordenado por um segundo, como se não esperasse por isso. — Um livro? Tem na biblioteca da sua escola?

Eu nunca entrei na biblioteca da minha escola.

— Não sei. Vou procurar o resumo na internet. — Dei de ombros, olhando rapidamente para a cozinha mais uma vez. — O senhor precisa de alguma coisa? Quero tomar um banho, estou suada.

— Hm — ele sentou de novo, colocando os pés na mesinha de centro. — Teve educação física? Era minha parte preferida do dia.

Talvez ele não tivesse descoberto nenhuma merda minha. Franzi o cenho com o pensamento e sua pergunta. Eu passava minhas aulas de educação física na arquibancada enrolando o professor com qualquer papo furado.

— Na verdade, não. Eu achei que tinha um carro me seguindo enquanto eu voltava, daí corri metade do caminho. — Não perdi quando ele enrijeceu e franzi o cenho ainda mais. — Está tudo bem, pai?

— Eu fumo quinze cigarros por dia e sobra alguns para o dia seguinte. — Ele começou, de repente. — É pelo final do maço de ontem que costumo começar o hoje, três cigarros assim que acordo, como você sabe. E quando abri o maço novo agora, ele já estava aberto com três cigarros faltando.

VINGANÇAOnde histórias criam vida. Descubra agora