Quarentena ●Peterick●

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Eu sinto falta de tudo. De coisas complicadas como viagens de carro para outro estado e de coisas simples como pegar o ônibus para encontrar meus amigos numa cafeteria. Nunca pensei que seria tão doloroso encarar a cidade gélida ao meu redor e pensar no quanto sentia falta dos momentos mais insignificantes do meu dia.

Apesar da dor que sinto ao pensar naqueles momentos, jamais pensaria em sair de casa enquanto a situação não melhorar. Era um ato de respeito aos outros e a mim mesmo. Por mais que amasse sair, não colocaria isso acima da minha vida por nada no mundo.

Nem por ele.

Ah, ele. O amor da minha vida. Que agora estava do outro lado da cidade, longe dos meus beijos e abraços há três meses.

Pete era uma grande parte da minha motivação para acordar todos os dias, ainda que não houvéssemos nos encontrado fazia muito tempo. Bom, tínhamos motivos para tal.

Antes dessa caótica pandemia começar, estávamos prontos para morar juntos. Tínhamos quase escolhido um apartamento. Então, o sonho foi arrancado de nossas mãos, como um pirulito sendo tirado de uma criança por uma pessoa sem coração que não liga para sentimentos. Essa pessoa cruel, no caso, era um problema causado pela natureza, por vários humanos idiotas e muitos governos negligentes.

Assim, fomos forçados a continuar nossos caminhos separados. Eu continuei a viver com meu melhor amigo e ele não saiu da casa dos pais. Isso tornava a situação pior, porque não podia visitá-lo e colocar a vida dos idosos em risco. Nem ele colocar a minha. Sabíamos que seria muito mais doloroso nos vermos pessoalmente e ficarmos distantes, do que conversar pela tela minúscula do celular.

Podíamos conversar todo dia, o tempo inteiro, que minha saudade jamais acabaria. Sentia falta de seu toque, dos seus lábios, dos seus cabelos macios, de suas mãos calorosas, de distribuir beijos na ponta do seu nariz, do seu abraço, de tudo.

Dizer que sentia falta dele era um eufemismo.

Havia momentos em que apenas desejava viver um dia longe de tudo isso. Sentar no parque e fazer um piquenique, inspirar o ar não-tão-puro da cidade enquanto o universo parece se resumir a nós dois.

Por isso, eu me apegava a uma lembrança. Mais especificamente, a do dia mais feliz da minha vida.

"Não estávamos acostumados a ir a espaços como aquele frequentemente. Com árvores imponentes, grama tão verde que seus olhos doíam se encarassem por muito tempo, crianças brincando e pais conversando sem parar.

Parecia um comercial de um daqueles produtos estranhos que ninguém realmente sabe qual a utilidade.

Talvez fosse apenas a maneira que enxergava o mundo naquele dia. Era uma visão apaixonada e jovial, originada no meu coração apaixonado e jovial.

Até o Sol parecia brilhar mais forte, fazendo-o reluzir. Sim, naquele momento Pete parecia reluzir. A luz iluminava cada pedaço da sua pele morena e fazia seus olhos brilharem ainda mais, enquanto pequenos raios trespassavam as mechas escuras da franja que caía sobre seu rosto. Era como se fosse um anjo, daqueles de pinturas antigas, rodeado por uma aura dourada que poderia ser vista por qualquer um no parque.

Nada, no entanto, era mais belo que seu sorriso. Ah, seu sorriso perfeito derretia meu coração em menos de um segundo.

Entretanto, sua expressão era de pura curiosidade quanto me encarou, com a testa franzida e um olhar levemente preocupado.

- O que foi? - soltou uma curta risada nervosa.

- Só estou pensando no quão lindo você é.

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