"Espera por mim, estou a chegar.
Eu preciso de encontrar-te, deixa-me encontrar-te!"Senti o meu corpo completamente paralisado. Não conseguia mexer-me, apenas os meus olhos se deslocavam para tentar ver o que estava à minha volta. Estava tudo escuro e por mais vontade que tivesse de gritar, não saía som nenhum da minha boca. Ela nem sequer abria. Tentava comandar as minhas mãos e as minhas pernas, mas nenhuma parte do meu corpo obedecia às ordens do meu cérebro. Eu estava um caco, em pânico.
Depois de uns minutos de olhos fechados, senti alguém pesar no meu corpo. Era como se um cadáver tivesse caído em cima de mim. Ao abrir os olhos, tive o infeliz prazer de encarar uns olhos azuis ensanguentados a olhar para os meus. Havia sangue por todo o lado. A criatura meia humana, nua, esquelética e de cabelos ruivos, longos e sujos, olhava para mim com um olhar faminto, como se eu fosse a sua última refeição.
O meu coração batia tão fortemente que, num impulso, o meu corpo voltou à vida e alcançou rapidamente a navalha que tinha sempre em cima da mesa-de-cabeceira, atrás do candeeiro. Eu estava pronto para atacar a criatura quando vi que não havia nada no quarto. Apenas eu estava ali, com a navalha na mão, pronto para atacar o nada, num quarto escuro sem ninguém. Só estávamos eu e a solidão. De novo.
Suspirei. Não de alívio, mas sim de rendição. Mais uma vez, a minha própria cabeça tinha levado a melhor de mim.
Estás em baixo de forma, Duarte.
Abri a portada do quarto que dava para a varanda. Senti o frio da noite encontrar a minha pele, que se arrepiou num instante. Era verão, porém algumas noites no Porto eram frias.
Apoiei-me com as mãos no parapeito da varanda. De olhos fechados, deixei a cabeça abaixada por um tempo para recompor as minhas ideias. Quando a levantei, mirei o céu estrelado. As estrelas eram bem visíveis dali. A Lua também lá estava. As luzes da noite refletiam-se no Douro. Alguns carros ainda passavam na estrada e alguns bêbedos ainda cambaleavam pelo passeio e só não caiam por causa dos amigos.
Do nada, uma estrela cadente atravessou o céu.
— Que estrela serás tu? — Questionei num murmúrio.
Não obtive resposta. Nunca obtinha.
Em pequeno acreditava profundamente que se pedisse um desejo a uma estrela cadente, ele se realizava. Hoje suscitava-me o riso por ter acreditado numa coisa tão ridícula, sem sentido racional algum. Já tinha perdido a fé nos contos de fadas há muito tempo.
Já a tinha perdido há muito tempo. Não havia desejo maior que a trouxesse de volta.
Nunca mais.
Estando mais calmo, voltei para dentro, fechei a portada e deixei-me cair na cama. Não demorou muito para me desligar outra vez.

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Desejo: Fazer-te ficar
Romance[CONCLUÍDO] Duarte Gama, um homem de negócios de 26 anos, sai do bar noturno que gerencia secretamente. Ao constatar que se esqueceu das chaves, recua caminho indo contra uma rapariga. Esta, atrapalhada, pede desculpa e segue a sua vida. Porém, ao...