— Que infelicidade... bem, que Deus a tenha.
O homem de barbas pousou uma sacola pesada em cima da mesa.
— É todo seu. Aproveite-o — disse.
Olhei para a pequena sacola. Peguei-a e verifiquei o seu peso.
— Aquela família pensa que fui eu quem matou os seus herdeiros. O pai morreu de desgosto. A mãe espanhola não tem como entrar em Portugal. O meu trabalho foi cumprido com excelência. E espero que isso se reflita no que está aqui dentro, senão, receio que teremos problemas, Sr. Vasco.
— Não se preocupe. A Coroa estar-lhe-á eternamente agradecida — ergueu-se da cadeira. — O seu trabalho e o da sua família está cumprido. Quanto menos espanhóis cá, melhor. E ainda por cima... — pousou uma mão no ombro da filha. — Ganhou uma mulher de bónus.
Levantei-me também para me despedir dele com um aperto de mão.
— Até uma próxima, Pereira.
— Até uma próxima, Gama.
Ele saiu pela porta da cozinha, deixando-me a mim e à loira. Estava prestes a ir deitar-me quando...
— Já vai embora? — A sua voz doce quebrou o silêncio. Encarei-a por cima do ombro.
— Sim. Estou cansado — dirigi-me à saída.
— Onde é que a enterrou?
Parei de andar de novo. Olhámo-nos.
— A Anabela. Onde é que a enterrou?
— Não são coisas para uma menina tão jovem se preocupar com — sorri-lhe, na esperança que me deixasse seguir.
— Porque sinto que me está a mentir?
— Acerca?
— Acerca da morte da Anabela.
— A própria menina a matou. O que a incomoda? — Encolhi os ombros.
— Porque ainda me trata como uma? — Perguntou desta vez. Virei-me de novo para a apreciar. — Quer dizer, eu carrego um filho seu no ventre há pelo menos um mês.
Algo no seu olhar intrigava-me. Parecia triste, um vislumbre de desilusão cobria-os.
— Permita-me a pergunta... — aproximei-me dela. — Por acaso, não estará a confundir as coisas, está?
— Como? — A sua face corou.
— Está apaixonada por mim, Dona Beatriz?
— Hã... — levantou-se da cadeira, visivelmente nervosa. — Talvez...
Esperança, havia esperança naqueles olhos e naquela voz.
— Beatriz... — desviei o olhar. — Eu lamento.
— Como...? Como assim lamenta? — Aproximou-se de mim até estarmos a centímetros de distância. — O que lamenta? — Desesperou-se.
— Eu não gosto de si, Beatriz. A menina... quer dizer, a Beatriz é uma... mulher incrível, é, é linda e inteligente, mas eu... foi só um trato com o seu pai. Sabe disso, não sabe?
— Sei! Mas eu pensei que gostava de mim, da mesma maneira que gosto de si! Afinal... esta situação toda com a Anabela, a nossa primeira noite... Diga-me! — Agarrou-se às minhas vestes. — Diga-me que é verdade! Que tudo aquilo foi verdade!
Segurei nas suas mãos, tirando-as delicadamente do meu corpo.
— Lamento. Não lhe consigo retribuir.
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Desejo: Fazer-te ficar
Romance[CONCLUÍDO] Duarte Gama, um homem de negócios de 26 anos, sai do bar noturno que gerencia secretamente. Ao constatar que se esqueceu das chaves, recua caminho indo contra uma rapariga. Esta, atrapalhada, pede desculpa e segue a sua vida. Porém, ao...