IV

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— Mudei-me para cá há pouco tempo. Ainda estou a tentar habituar-me à agitação urbana. Em Piódão tudo é muito mais calmo, como deve imaginar. — Contou, dando um gole no seu cappuccino de seguida.

— Sim, já tive o prazer de visitar a aldeia. É muito calma, excelente para umas férias no meio do ar puro. Coisa que, como pode ver, o Porto não tem muito para oferecer.

Ela tinha uma mandíbula bem desenhada. O seu vestido era verde escuro com pequenas flores brancas, não muito decotado. Era simples, o que a tornava ainda mais querida. As suas unhas estavam decoradas com um rosa super clarinho, quase da mesma cor da própria unha. O seu pescoço estava acompanhado pelo colar que há pouco lhe tinha sido devolvido, um dos seus pulsos com uma pulseirinha também de ouro e trazia no dedo indicador um anel, também ele dourado. Tinha uma postura elegante: costas direitas, perna cruzada, sem encostar os cotovelos à mesa. A meiguice na voz e a ternura em tudo aquilo que fazia era aconchegante para quem estava a observá-la (no caso, eu).

— Mas é uma cidade muito bonita e cheia de vida! — Comentou alegremente. — Eu estou a gostar de estar aqui, talvez me mude definitivamente. Quem sabe? — Ela riu, encolhendo os ombros. Aquele simples gesto roubou-me um sorriso. Lúcia era, como já aparentava ser, uma mulher encantadora.

— Então, ainda não completou a mudança. — Concluí mais para mim mesmo do que para ela, ao mesmo tempo que mexia e rodava uma moeda de 2 com um pequeno defeito de fabrico que tinha recebido de troco.

— É... Ainda não encontrei casa — confessou num suspiro e com um sorriso apagado, abanando negativamente a cabeça e limpando a boca ao guardanapo..

O tom de voz dela entregou por completo as suas intenções: ou ela estava à espera que eu a convencesse a ficar no Porto definitivamente, ou estava à espera que eu tivesse, milagrosamente, um sítio para ela ficar.

— É realmente uma pena. — Levantei-me e tirei do bolso um cartão. — Visto que me parece não ter muito por onde pegar, ligue para esse número se precisar de algo — aconselhei, arrastando o cartão pela mesa em direção das suas mãos, sem desviar o meu olhar do dela.

— É o seu número? — Perguntou curiosa ao se aperceber que o cartão simplesmente continha um número, sem quebrar o contacto visual.

— Gostaria que fosse? — Retribuí-lhe com um sorriso, antes de a deixar sozinha naquela mesa a olhar para o cartão.

Saí daquele lugar, agarrei no meu telemóvel e esperei que o Diogo atendesse a minha chamada. Nada. Fiz o mesmo com o Tiago e nada.

— Então tá bem! — Ironizei para mim mesmo, ao entrar no carro.

Ao chegar à porta do apartamento, ouvi a voz da Alice. Ela parecia furiosa. Para salvar o meu amigo, decidi entrar em casa mesmo assim.

— Tu sabias disto?! — A loira veio acelerada até mim, como se estivesse prestes a esganar-me.

— Disto o quê? — Interroguei-a calmamente, tirando-a do sério.

— Da boate, ou do Clube, ou do raio que o parta?! — Respondeu-me com gestos bruscos, totalmente exaltada.

— Somos sócios — entreguei-nos.

— O quê?! — Gritou, virando-se de seguida para o seu noivo. — Diogo!!

— A sério, Duarte? — Diogo perguntou visivelmente chateado.

— O que é que foi? Ela já descobriu, seria mil vezes pior mentir-lhe ainda mais.

— Quem mais está metido nisto? — Interrogou-nos não muito mais calma.

— O Tiago — eu e Diogo respondemos em coro.

Desejo: Fazer-te ficarOnde histórias criam vida. Descubra agora