— Onde estiveste? Passaram-se cinco dias! O que é que aconteceu? — Questionei, assim que se sentou à minha frente.
Estávamos no café do costume. Já se tinham passado cinco dias desde aquela situação no Empire. Tinha recebido de manhã uma mensagem de um número anónimo impossível de rastrear para nos encontrarmos aqui. Tinha chegado um pouco antes da hora marcada, mas, como sempre, o remetente foi pontual. Sentou-se à minha frente de costas para a porta de um jeito apressado, como se estivesse a correr contra o tempo ou a fugir de alguém. Debruçou-se sobre a mesa pousando os braços na mesma. Não me cumprimentou, foi logo ao assunto.
— Volta para Sicília. Vai viver a tua vida.
— O que dizes?! — Debrucei-me também sobre a mesa, sem entender o porquê daquela ordem.
— Verónica, faz isso! Está bem? — Mandou com uma voz baixa, porém rígida.
— Não! Não está tudo bem até tu me dizeres que raio é que se está a passar! — Ripostei.
— Verónica... — abaixou ligeiramente a cabeça e passou os dedos nos olhos, demonstrando a sua falta de paciência para aturar a minha teimosia naquele momento.
— Um dia pediste-me para confiar em ti. Eu fi-lo. É a tua vez — confrontei-o — Eu preciso de saber, Duarte! — Insisti elevando um pouco o tom de voz, dando um leve murro na mesa.
O meu olhar começou a focava-se unicamente nele. Um nó na garganta surgiu, mas não era choro, era ansiedade. Algo crescia dentro do meu peito e parecia querer saltar para fora. Acho que o meu estado o alertou, avaliando pelo seu suspirar.
— Ela tem provas, ok? — Sussurrou. — Eu disse que ia ficar tudo bem e cumpri a minha palavra. Tirei-te de lá e agora está tudo bem. É tudo o que precisas de saber.
Preparava-se para se levantar quando agarrei no braço dele e quase cravei as minhas unhas na carne do mesmo. Ele precisava de ficar.
— As coisas só vão ficar bem quando me disseres exatamente o que se passa. Nada está bem enquanto tu não estás bem, entende isso!
Ele virou-se para mim sem se sentar. Inclinou-se com a mão presa em cima da mesa e a outra no encosto do meu banco. Aproximou as nossas caras.
— Não insistas, porra!! — Falou com uma certa agressividade na voz, mas sempre mantendo-a baixa para mais ninguém nos ouvir.
— Ela chantageou-te, não foi? — Confrontei-o, ele desviou a cara e fechou os olhos para tentar resistir-me. — O que é que ela fez desta vez, hã? — Não obtive resposta. — Diz-me, Duarte!
Apertei mais o seu pulso. Senti os meus dedos espetarem-lhe a carne. Ele retornou a olhar-me de lado. Ao ver que não ia deixá-lo ir tão facilmente, retomou o seu lugar. Fez um breve momento de silêncio e depois quebrou o secretismo.
— Ela tem um vídeo pouco ético da minha parte. Para além de saber de merdas que mais ninguém sabe. Ela tramou-me, está bem? — Espalmou as mãos na mesa e inclinou-se ligeiramente sobre a mesma. — E eu estou a tentar fazer as coisas bem, mas para isso preciso que endireites a tua vida, ok? — Abriu um sorriso azedo.
Ele voltou a virar a cabeça para não me encarar e reencostou-se no sofá. Depois de um tempo a avaliar a postura dele, liguei os pontos. Desviei o olhar dele e deixei um riso analasado escapar.
— Já percebi... — voltei a encará-lo com um sorriso furioso. — Tu vais-te casar com ela.
O loiro simplesmente olhou-me. Não negou aquela aposta. Eu ri-me furiosa. Ele voltou a inclinar-se para a frente enquanto abanava a cabeça.
— Verónica...
— Não! Não! — Impedi-o de falar e encostei-me ao encosto do meu sofá. — Ela realmente conseguiu o que queria! Ela realmente ganhou a batalha — Disse com um sorriso irónico.
— E a guerra — o loiro murmurou baixo desperançoso.
— Não, isso eu não vou aceitar! — Neguei-lhe com o dedo.
— E vais fazer o quê? Não podes fazer nada quanto a isto! Ela vai-te foder se fores contra ela. E vai-te foder bem, Verónica!
— Tu já estás fodido! Vocês vão-se casar! E o pior é que não estás a fazer nada para contrair isso! — Voltei a confrontá-lo.
— E tu achas que eu quero casar com aquela...? — Controlou-se, desviando o olhar e respirando fundo. — Eu estou a fazer isto por ti! Para te proteger! — Apontou-me o dedo, voltando a encarar-me.
— Então não te cases! Simplesmente não te cases, Duarte! Eu tenho a certeza que juntos podemos resolver isto, já lutámos contra tanta gente... Tu tens de saber algo sobre ela, algum podre e eu... eu posso tentar falar com... a porra de alguns contactos da Leonor e...! — Planejei enquanto agitava as mãos por causa da ansiedade que aquela conversa me estava a causar.
— Verónica...
Ele agarrou as minhas mãos, mantendo as minhas presas entre as suas. O seu toque...tinha tantas saudades do seu toque...
— Eu lamento. Eu realmente lamento imenso. Porém fui eu que te pus nesta situação e agora vou ser eu a tirar-te dela.
O olhar dele, apesar da situação, era o mesmo daquele dia quando ele me fez acreditar que tudo ia ficar bem. Quando percebi que eu estava prestes a perdê-lo.
— Eu... — tentei falar com a voz trémula. — Eu não posso. Eu não quero — abanei a cabeça negativamente.
Os meus olhos encheram-se de lágrimas. Separei as nossas mãos para cruzar os braços e desviei a cara. Afastei-me dele.
— Mas também não compreendo o porquê de não querer. Talvez por já ter visto esse olhar e saber bem o que ele significa? Talvez. Vi-o há cinco dias e há seis noites atrás. Esse mesmo olhar que me dizia que estava tudo bem. O mesmo olhar que me lançaste quando estávamos a foder depois da festa, no nosso quarto.
— Isso é porque nessa noite não fizemos sexo — explicou com um sorriso apagado. — Fizemos amor.
— Não vai dar tudo ao mesmo? — Perguntei-lhe numa risada nervosa.
— Se desse, não te olhava de maneira diferente.
— Estás a dizer que me amas agora, Duarte? — Abri um sorriso curioso.
— Não diria amar... — pôs as costas direitas e encostou-se. — Mas seria hipócrisia minha e estaria a mentir se eu dissesse que não gosto de te ter do meu lado... Todas as noites. Ou todos os dias. Ou dentro de ti — sorriu. — E tu sabes que eu não minto.
— Bem, parece que isso vai acabar, não é mesmo? Afinal, pelo que me dizes, é só desejo. Não vale muito a pena lutar para ficar. E tudo bem, tu lá sabes as tuas prioridades...
— E tu estarás sempre em primeiro lugar do que as outras todas.
Ele voltou a inclinar-se para me dar as mãos. Eu voltei a encará-lo. Não consegui evitar mais e deixei aquela lágrima cair pelo meu rosto. Olhei para a porta e lembrei-me do momento em que entrei por ela e olhei para esta mesma mesa, há um mês e meio atrás. Ele estava no meu lugar, com aquele estúpido sorriso vitorioso e sedutor por ter acertado em cheio na hora em que eu ia ao café.
Como tal, larguei-o. Abri a minha mala, tirei de lá o porta-moedas. Peguei naquela mesma moeda do troco do primeiro encontro. Vi pelo canto do olho que ele não estava a entender o que estava a fazer. Guardei tudo no sítio e voltei a encará-lo. Pousei a moeda na mesa e arrastei-a até ao centro. Consegui perceber pelo seu olhar que ele tinha apanhado a dica.
Passou um minuto inteiro só a olhar para mim e eu passei um minuto inteiro com o coração acelerado a olhar para ele. Até que ele pousou uma mão sobre a moeda, levantou-se e inclinou-se para a frente devagar na minha direção. Deu-me um beijo na testa. Fechei os olhos para saborear aquele momento. Deixou estar os seus lábios colados na minha pele durante uns cinco segundos. Senti um pingo cair na minha testa. Contudo, continuei de olhos fechados sem impedir as minhas lágrimas de cairem também.
Os seus lábios separaram-se da minha pele e senti-o a ir embora. Abri os olhos. Olhei para a porta do café. Ele já tinha desaparecido.
Mas a moeda não.
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Desejo: Fazer-te ficar
Romance[CONCLUÍDO] Duarte Gama, um homem de negócios de 26 anos, sai do bar noturno que gerencia secretamente. Ao constatar que se esqueceu das chaves, recua caminho indo contra uma rapariga. Esta, atrapalhada, pede desculpa e segue a sua vida. Porém, ao...