VIII

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— Para esclarecer, isso aplica-se a ambos, não é verdade? — Perguntou.

Ah, aquele olhar desafiador. Tentava travar a luta entre o querer empurrar-me para longe e o querer ter-me o mais perto possível. E nós já estávamos perto, demasiado perto. Porém, não tão perto para o meu gosto.

— Nunca te chamei de ridícula — tentei contornar o ponto da questão.

— Mas vais querer, assim que vires que apesar de teres efeito em mim, eu tenho igualmente em ti — encarou-me confiante com as suas palavras. — Olha só para nós agora, Duarte.

— Depois de atirares uma pedra ao rio, estás à espera que não faça ondas?

— Tu atiraste a primeira pedra. Depois de omitires um detalhe teu, estavas à espera do quê? Que não reagisse porque já estou encantada pelo teu charme?!

— Ah! Então sempre estás encantada pelo meu charme. — Gabei-me perante aquele deslize dela. Ela revirou os olhos e virou-me a cara. — Estás a andar às voltinhas nesta conversa para me tentares incriminar por algo que tu fizeste? — Segurei no seu queixo e obriguei-a a olhar para mim.

No intuito de não se deixar ficar, adotou uma postura defensiva, endireitando a sua postura.

— Não sei o que queres dizer com isso.

E eu não ousei explicar. Era impossível verbalizar algo quando estava tão perto de mim. Daquela maneira que só sabia estar perto – longe.

Procurava algo cá dentro e perdia-se. Da mesma maneira que eu me perdia quando a encontrava. E quando a tinha por perto. E quando a podia olhar de perto. Decorar quantos segundos as suas pupilas demoravam a dilatar assim que encontravam aquilo que tanto procurava cá dentro. Como se entrasse em casa, na sua, habitualmente desarrumada, e vasculhasse por algo... Ah, sim... uma boa razão para ficar.

Contudo, mesmo não entendendo o porquê e não tendo uma boa razão, ela fica. Talvez, afinal, não procurasse algo dentro de casa. Talvez tivesse achado a casa. A sua, habitualmente desarrumada.

E com alguma sorte, talvez a arrume.

Tu és ridículo. Não haja dúvida.

Ela foi a primeira a ceder o contacto visual. Pensei que a minha batalha interior tivesse acabado ali, quando o seu olhar não desviou, mas desceu descaradamente para a minha boca.

"Oh vá lá...", pensei, "para de me olhar assim!"

Contudo, era tarde demais. Também já estava a apreciar os seus lábios que de repente pareciam chamar ainda mais por mim.

— Muito pelo contrário, acho que sabes muito bem... — reagi finalmente.

O seu olhar ergueu-se encontrando o meu no dela.

— Talvez — respondeu.

Ela não me ia beijar. Pelo contrário, ela aproximava as nossas bocas o bastante para senti-la perto, mas demasiado longe. Ao ponto de faltar um milímetro de distância entre elas. Um milímetro que ela queria que fosse eu a quebrar. E eu estava prestes a fazê-lo, quando o meu telemóvel vibrou interrompendo o momento.

Afastámo-nos. Envergonhada pela situação, pôs a arrumar a mesa. Já eu, tirei o telemóvel do bolso das calças e vi quem era. Olhei para ele e depois olhei para Lúcia, que esperava uma reação minha.

— Eu já venho. — Ela assentiu com a cabeça e eu fui para a varanda, fechando depois a portada para ela não ouvir a conversa. — Não é uma boa altura, Diana.

— Sabes que dia é hoje, Duarte? 15 de julho, dia da reunião sobre o nosso casamento! — Ralhou do outro lado da linha.

— Está bem. Desmarca a de hoje e marca-a para outro dia qualquer, pode ser?

Desejo: Fazer-te ficarOnde histórias criam vida. Descubra agora