Fragmento nº3

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— Quando é que me ia dizer?! — Corri atrás dele pelos corredores ao mesmo tempo que segurava no vestido para não tropeçar. — Quando é que me ia contar que me vendeu a um Gama?!

O meu pai parou de andar no mesmo segundo e virou-se para me encarar um tanto furioso com aquela acusação.

— Eu não te vendi, Anabela!! Arranjei-te um homem! Precisas de seguir com a tua vida! — Retomou caminho.

— Eu não quero seguir a minha vida com a pessoa que matou o meu marido! — Pus-me à frente dele para o impedir de seguir. — E muito menos com a família que matou os meus irmãos! — Ele revirou os olhos e ultrapassou-me. — Como pode estar tão indiferente assim?!

— Eu não estou! — Encarou-me. — Mas também não tenho outra escolha! — Aproximou-se de mim. — Eu estou doente, Bela. Não sei quanto mais tempo vou durar. Quando morrer, tu e a tua mãe vão ficar sozinhas e vão ser comidas vivas pela Corte... — fez uma pausa. Suspirou. — A tua mãe está velha. Já não consegue ter mais filhos, já não serve. Mas tu? — Ele pousou as mãos nos meus ombros. — Tu és uma mulher jovem. Fértil. Tens uma vida toda pela frente... — acariciou a minha bochecha antes de eu me afastar dele. Ele recuou uns passos. — Os Gama têm feito a nossa vida num inferno, porém também sabem o quanto valemos e nós sabemos muito bem o quanto eles valem. É tolo negar ou não querer ver isso. Com este casamento, eles ganharão mais riqueza e nós vamos passar a ter mais influência aqui em Portugal. Tu e a tua mãe ficarão protegidas de qualquer ameaça, tanto portuguesa como espanhola.

— Mas porquê ele pai? Justo ele?! — Insisti.

— Os irmãos dele já estão casados. Ele era o único disponível e um tanto interessado nesta união. Ou era o Rodrigo ou era o pai dele. — Torci o nariz com aquela hipótese. — Pois, foi o que pensei.

— Quando é que é o dia do meu casamento? — Murmurei, já conformada com o meu destino.

— Amanhã — respondeu sem muito ânimo. — Vou agora tentar arranjar uma casamenteira que faça o serviço.

— Pelo menos... vocês vão estar presentes?

— Não... — suspirou. — Estarei a caminho de Leão por essa altura. Não quero morrer neste lugar — olhou em volta. — A tua mãe vai-me acompanhar. Vocês os dois estarão por vossa conta.

— E ela ficará muito bem entregue, Sr. Carlos! — O Rodrigo aparaceu atrás de mim, pondo um braço em volta do meu pescoço.

— Pela tua saúde, é bom que fique — avisou o meu pai antes de nos deixar sozinhos.

— Largai-me!! — Ordenei ao tirar de forma bruta o seu braço do meu corpo.

— E se parasse de me tratar por "vós"?

— Não trato por você gente com quem não tenho intimidade.

— Dou-lhe uma semana — apoiou-se com um braço encostado à parede, impedindo-me de voltar ao quarto.

— Para quê?! — Ergui uma sobrancelha.

O Rodrigo acabou por me encurralar com o outro braço. O seu olhar desceu para o meu peito, voltando de seguida a encarar-me.

— Logo verá — disse apenas, antes de seguir com a sua vida e de me deixar sozinha.

— Nojento de merda.

Desejo: Fazer-te ficarOnde histórias criam vida. Descubra agora