Na manhã seguinte, ordenei à Ada que Lara fosse retirada de suas demais funções e cuidasse exclusivamente de minhas coisas. Proibi a entrada de qualquer outra pessoa em meus aposentos, e dei à camareira a responsabilidade de cuidar e preservar minha intimidade.
Aquele outono transcorreu com rapidez e calmaria. Os cuidados ternos de Lara e nossas carícias noturnas criaram uma falsa sensação de bem-estar e felicidade. As preocupações com o reino ocupavam minha cabeça menos do que deveriam e a inconsequência juvenil me dominava. Perdi o hábito de frequentar o Círculo Interno e as notícias de fora me chegavam apenas através de minha amante. Lara, aliás, não tinha mais nenhum pudor em falar de sua vida, sua infância, os problemas de sua família, a rotina de quem nascera no povoado. Essas conversas, no entanto, eram raras. Hipocritamente me deixei levar por um desejo de felicidade a qualquer preço, como se houvesse mesmo nascido com um sinal divino, que determinava meu privilégio diante dos demais. Como se fosse justo que um reino inteiro sofresse abusos para que alguns afortunados desfrutassem o prazer de uma vida plena.
Na manhã do solstício de inverno, meu pai me ordenou que o esperasse à noite, no salão principal, vestindo meu traje cerimonial.
No primeiro minuto após o pôr do sol, saímos em cavalgada rumo ao bosque. Caminhamos entre as árvores por um tempo que me pareceu demasiado longo e, como da outra vez, não percebi o caminho até o local em que a Pedra estava. Repetindo a situação anterior, meu pai tirou sua cota de malha e expôs o braço tatuado e, através dele, fez a Pedra surgir. Dessa vez, no entanto, notei como ele circundava o desenho com o dedo, enquanto murmurava algumas palavras, e vi a Pedra surgindo paulatinamente durante esse comando, como se uma espécie de véu se descortinasse entre nós e a Pedra.
— Você já conhece a energia que vem da Pedra, Aléssia. Agora é o momento de começar a entender a relação do monólito com nossa família e porque isso é tão importante para nós e para o reino.
Sua voz era séria e misteriosa. Apontou para o sinal em seu braço e, em seguida, para o da Pedra, e completou o gesto dizendo o que me parecia óbvio: as marcas são iguais.
— Você sabe por quê? — ele me perguntou.
— Não... mas... suponho que a marca indique quem tenha algum tipo de relacionamento com a Pedra.
— Um pouco mais do que isso: indica quem tem poder sobre a Pedra. Apenas uma pessoa no mundo pode possuir essa marca completa. Se, por acaso, existirem duas pessoas marcadas pela Pedra, então uma deverá matar a outra, pois é impossível que coexistam nesse mundo.
Senti um arrepio na nuca e toda sorte de maus presságios passaram por minha cabeça. Imaginei nossa linhagem destroçada, uns matando os outros, em nome de um símbolo mágico.
— Mas... a marca passa de pai para filho, assim como o comando da Pedra, não é?
— Sim, mas nem sempre foi assim. No início dos tempos, antes de nossa família conquistar o comando, a Pedra era conhecida por muitos e todos ambicionavam seu poder.
Fez uma pausa, como se esperasse por algum comentário, depois prosseguiu:
— Pode imaginar o que isso significa? Pode calcular quantas guerras aconteceram por causa dessa Pedra? Pode ver quantas pessoas foram mortas simplesmente por que eram capazes de comandá-la?
— Sim, posso perfeitamente, e a pergunta óbvia é: por que ninguém a destruiu?
— Destruir a Pedra?
— Claro! Pois se é fonte de tanta discórdia, por que ninguém a destruiu?
— Ela não é fonte de discórdia! É fonte de Poder! O Poder, esse sim, tem o dom de gerar disputas e discórdias, se as pessoas que o possuem não são dotadas da sabedoria necessária para controlá-lo. Por que acha que sua educação foi sempre tão rígida? Porque é seu destino possuir o Poder e deve estar preparada quando a hora chegar.
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Aléssia || HISTÓRIA COMPLETA
FantasyO destino de Aléssia é libertar seu reino das garras de um tirano. Mas para isso, terá que matar a pessoa que mais ama: seu pai. 👸 fantasia ⚔️ aventura ❤️ romance 🔥 erotismo 🌈 protagonista lésbica 𝐏𝐮𝐛𝐥𝐢𝐜𝐚𝐝𝐨 𝐞𝐦 𝟎𝟑/𝟏𝟎/𝟐𝟎𝟐𝟏 �...