Capítulo 35

260 51 0
                                    

— Agora você sabe que ela não é de confiança.

A voz fria e barrenta me recebeu e, através dela, sabia onde estava: no Bosque. Em casa. Deitei na grama, exausta, e o cheiro de terra molhada me acalmou. Olhos abertos ou fechados, não importava, o escuro era o mesmo. Mas aquelas sombras eram minhas, pertenciam-me de tal forma que já não mais me assustavam. Em casa! Bastava-me correr para meu velho quarto e tudo estaria bem.

— Sim. Ela quer nos destruir.

— Mas é você quem vai vencer. Como todos os Amaranto sempre venceram. E graças a mim. Toque-me, Aléssia, receba de uma vez sua herança e, como seu pai, você será indestrutível.

— A proposta é tentadora, Pedra. Mas assim como não confio mais em Alexandra, também não confio em você.

— Ah, obrigada pela sinceridade. Poucos foram os que tiveram coragem de ser autênticos comigo.

— Espero que considere isso a meu favor quando a hora chegar.

— Gosto de você, Aléssia. Você é forte, firme, decidida. Seu pai, na sua idade, era apenas um garoto mimado e assustado. Você se parece com sua mãe... e isso me faz olhá-la com muito mais carinho.

— Você conheceu minha mãe?

– Infelizmente não houve oportunidade para que fossemos formalmente apresentadas. Mas sim, a conheci, através de seu pai.

— O que está dizendo? Que pode ver as coisas através de meu pai?

— Um pouco mais do que isso. Meu acordo com seu pai é uma troca, Aléssia. Eu dou a ele o meu poder.

Aguardei que a Pedra completasse seu raciocínio, mas a frase ficou suspensa no ar. Talvez pensasse que eu já tinha compreendido. Ou talvez estivesse testando se eu teria coragem de perguntar.

– Certo, é uma troca. Que você lhe dá poder eu já sabia. Então a questão é o que ele lhe dá, não é?

— Consciência corpórea.

— O que?

— Sou uma pedra, Aléssia. Posso ter todo o poder do mundo, mas não posso sair de meu lugar. Por maior que seja minha força, não posso ser outra coisa além de uma pequena rocha em um pequeno bosque. Meu acordo com seu clã é bastante claro — ofereço a vocês minha fonte inesgotável de poder. Em troca, recebo uma parte de sua mente, um pequeno espaço onde possa me alojar. Nada que doa. Apenas uma forma de experimentar o mundo através de seus corpos...

Um frio intenso subiu por minha espinha e, pela primeira vez em meses, os pelos de minha nuca se eriçaram. Farejei perigo antes mesmo de digerir totalmente aquelas estranhas palavras. Com a cautela de quem está em território inimigo comecei a me levantar. Precisava sair dali.

— Já pensando em sair, Aléssia? Será que me enganei com relação à sua coragem? Sempre achei que o sangue O'Líath aprimoraria a raça dos Amaranto. O clã de seu pai possui iniciativa, mas é grosseiro. Os O'Líath, ao contrário, sempre foram muito argutos e refinados. Julguei que você nasceria com o melhor de cada lado. Será que me enganei?

— Talvez tenha se enganado. Como posso saber?

— Tentando ganhar tempo, Princesa? Ah, você já andou metade do caminho. Já estou em sua pele. Vamos, termine com isso logo. Ninguém ganha com essa demora.

— E o que acontece depois que eu te tocar?

— Você já sabe.

– Não. Você compartilha a consciência de meu pai, não é? O que fará depois que eu te tocar? Vamos os três compartilhar a mesma consciência?

Aléssia || HISTÓRIA COMPLETAOnde histórias criam vida. Descubra agora