Capítulo 52

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Tirei minhas roupas e deixei o ar noturno secar meu suor. Deitei e me cobri com os lençóis de linho que forravam minha cama desde a infância. Aquele luxo macio tinha textura de casa, para mim, e adormeci rapidamente sem pensar em temores ou problemas.

Por que não ter isso para sempre?

A voz era aveludada e parecia vir das nuvens claras que cobriam o pequeno bosque em que eu me encontrava. Eu estava vestida com minha túnica cerimonial e tinha os cabelos mais longos do que de costume. Usava uma tiara cravejada de safiras, e brincava com a água fria de um regato. Olhei em volta procurando quem falava comigo, mas não vi nada.

Lençóis de linho... por que perder esse luxo?

Parecia agora que a voz vinha de algum lugar atrás de mim. Caminhei naquela direção e surgiu das sombras, caminhando devagar, um homem magro, alto e calvo. Seu olhar era calmo e seu sorriso inspirava confiança.

— Certas coisas não são para todos. Não podem ser. Como garantir lençóis de linho a todas as pessoas? Por outro lado, isso seria motivo suficiente para que ninguém mais pudesse usufruir desse conforto? Claro que não. Coisas especiais são para pessoas especiais. E pessoas especiais existem poucas. O mundo é feito de pessoas comuns. Gente que só tem capacidade para produzir filhos e pegar doenças. O mundo pertence a quem é forte. Apenas o forte pode ter poder. E as pessoas fortes são sempre especiais. O que eu lhe ofereço, Aléssia, é a força. Todo o resto você conquistará a partir dela.

Pareceu-me tentador. Por que dormir em camas de palha dura com cobertas grosseiras feitas de algodão cru?

O homem tomou minha mão e a beijou. Seu sorriso dizia-me que eu era bela e desejável, e isso alegrava meu coração. Deixei que o estranho me tomasse para uma dança e nossos passos ganharam ritmo através de uma melodia que surgiu entre as folhas das árvores. Seus olhos me falavam de casamento, filhos, felicidade e conforto e tudo aquilo me pareceu agradável. Sorri com timidez, e ele me pediu que lhe fizesse meus votos.

— Diga-me, minha amada, que será somente minha, e tudo aquilo que desejar, a partir de hoje, será por mim providenciado.

Busquei as palavras mais adequadas, mas quando julguei encontrá-las, não fui capaz de dizê-las. Uma espada roubou-me o fôlego, rompeu meu corpo de dentro para fora, e um cavaleiro emergiu daquilo que outrora fora eu.

Vi meu corpo cair sem vida e um cavaleiro ruivo assumir meu lugar. Seus olhos eram ferozes e suas mãos rápidas no manejo da espada. O homem calvo, meu noivo, soltou gritos aterrorizados e correu. Senti que eu morria, mas quando abri os olhos estava em minha cama, transpirando nos lençóis de linho de meu quarto.

O café da manhã foi servido nos meus aposentos. A luz refletida pela montanha prometia um dia anormalmente quente. O fim da primavera estava nos trazendo temperaturas ainda maiores que as do verão. O ar estava parado e mesmo os pássaros não encontravam entusiasmo para cantar. Talvez por isso eu me sentisse sufocada enquanto quebrava meu jejum e pensava em Alex.

Estava degustando um pouco mais de bolo de mel, quando a aia de meu pai trouxe um recado para encontrá-lo em seu escritório.

Vesti-me com trajes de treino e fui vê-lo.

— Recebi um emissário de Condado Kent, ontem. Seu noivo estará a caminho tão logo resolva um pequeno problema familiar. — Meu pai me informou sobre o assunto enquanto me cumprimentava com um beijo na testa. Essa operação era mais simples em minha infância, agora eu tinha praticamente a sua altura e ele precisava erguer a cabeça para que seus lábios encontrassem o caminho até seu destino.

— Pequeno problema familiar? O que pode ser grave o bastante para atrasar um casamento real? — Tentei parecer interessada no casamento, embora minha preocupação fosse apenas como fugir dele.

Aléssia || HISTÓRIA COMPLETAOnde histórias criam vida. Descubra agora