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O relógio já marcava além da meia-noite, mergulhando a casa em um silêncio profundo enquanto todos  dormiam em seus quartos. Estevão, no entanto, encontrava-se solitário em seu escritório, cercado pela penumbra, e nas mãos, delicadamente segurava a echarpe dela. Na quietude da noite, ele revisitava os momentos que compartilharam, permitindo que as lembranças se entrelaçassem com a maciez do tecido.

Ao fechar os olhos, o aroma familiar da echarpe inundava seus sentidos, despertando emoções há muito adormecidas. Uma onda de saudade o envolvia, um anseio tangível por sentir novamente o calor acolhedor de seus braços. Na solidão do escritório, a ausência dela era como uma presença sutil, intensificando a necessidade de tê-la novamente.

...

- Alô! – Maria atendeu o telefone.

- Oi. Liguei para saber se quer que eu te busque. – Estevão propôs, e sua voz denotava uma mistura de ansiedade e preocupação.

- Não precisa. Obrigada, Estevão. - Ela soltou um suspiro, afundando na cadeira.

- É... Você quer conversar antes? – Perguntou retraído.

- Por quê? Tem outra surpresa para mim, além de ter um filho de 14 anos? – Maria ironizou.

- Maria... – Estevão, nervoso, passou a mão no cabelo. – Tem muita coisa que você não sabe...

- Estou aqui pensando em como pude ser tão burra. – O interrompeu. – Você está me saindo melhor que encomenda em Estevão. Agora, tenho que ir. – Desligou o telefone, não dando chance para mais explicações.

Ela olhou para o telefone nas mãos, tentando manter o foco. Lembrava-se de ontem, quando quase o beijou. Não podia esquecer que ele a havia traído, e agora, havia esse filho de 14 anos. Um filho que não era dela. Isso não fazia sentido, a menos que as acusações de Patrícia contra Estevão fossem verdadeiras.

...

- Boa noite! – Maria cumprimentou Ângelo, Heitor, Estrela, Carmem e Estevão, assim que passou pelo hall da casa.

- Boa noite, Maria! – Os três jovens responderam juntos e foram até ela, abraçando-a. Maria os recebeu com carinho, sob o olhar atento de Estevão, Carmem e Alba, que observava tudo do alto da escada.

Estevão observava-a, radiante naquele vestido que realçava suas curvas de maneira única e não conseguia evitar as lembranças do que haviam vivido naquela casa. "Ela tinha tudo e eu faria qualquer coisa por ela. Mas ela escolheu seu destino, não posso ignorar o que ela fez", pensava consigo mesmo, enquanto uma mistura de nostalgia e amargura pairava em seus pensamentos.

Ele se aproximou dela, cumprimentando-a com um olhar frio na tentativa de intimida-la e lembrá-la de que aquela não era mais sua casa. No entanto, não resistiu ao desejo de tocá-la mais uma vez, repetindo as ações de Heitor e Ângelo, beijando a mão dela.

Esses gestos não passaram despercebidos por Heitor, que mais uma vez experimentava a sensação de déjà vu. Não havia outra palavra que pudesse descrever o que ele estava sentindo. Além da palpável tensão que se formava com a troca de olhares entre seu pai e Maria, deixando-o intrigado.

Enquanto isso, Maria estava presa em suas próprias recordações ao observar a casa. Recordava os momentos compartilhados com seu marido, os risos dos filhos ecoando pelos corredores e a sensação de pertencimento que aquele lar proporcionava. Seus olhos curiosos passeavam por cada detalhe do ambiente, que parecia resistir ao tempo, como se as paredes guardassem com carinho as histórias que ali haviam vivido, tornando cada móvel e cada espaço um testemunho silencioso do passado.

Eles caminharam até a sala de estar, onde seus olhos encontraram um quadro com um rosto tão belo quanto o seu. Maria olhou a imagem daquela mulher na moldura e, em seguida, dirigiu seu olhar questionador a Estevão, erguendo uma sobrancelha com curiosidade.

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