Enxergar Turbulento

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Capítulo não corrigido



Ele se odiava agora, definitivamente. Parado sob o chuveiro, recebendo a água fria que anestesiava por fora o corpo que ele não conseguia anestesiar por dentro naquele momento. Os olhos estavam abertos focalizando a parede cujo os ladrilhos estavam, novamente, rachados devido ao impacto com um de seus punhos. Ele mal notou as envergaduras dos dedos expelirem o vermelho vivo até que o cheiro de sangue alcançou seu olfato, este tão lento quanto sua mente no momento.

Ele não sabia, pela primeira vez, como lidar consigo mesmo no atual momento. Acontece que havia cuspido palavras inúteis em direção ao seu ômega, provavelmente o assustando com tamanha estupidez que, aparentemente, estivera presa em algum lugar dentro dele por tanto tempo. Foi com se por um momento, ele que sempre levara o peso de tudo em seus ombros, apenas gostaria de ter alguém para culpar. A Coroa, a sua família, ou até mesmo seu lobo.

Mas nunca Louis. Jamais.

Ele nunca culpou Louis por nenhum sentimento corrosivo que carregasse em seu peito. Sabia que o ômega de nada teve responsabilidade sobre o que lhe acontecera ou ao alpha, como poderia? Louis perdera sua família, então perdera sua consciência e, mesmo sem saber, perdera seu alpha por muitos anos. O fato é que, pensando com uma maior clareza, era fácil perceber que não se tratava de uma responsabilidade pendendo para um dos lados, se tratava de como tudo o que aconteceu afetou direta e indiretamente cada um deles.

Não era sobre quem estava certo ou errado. Era sobre como os acontecimentos os moldaram, como os machucaram e como os modificaram de imediato e a longo prazo.

Ele gostava de pensar que não tivera sequelas, que apenas o felino as obteve com o acidente e que apenas Louis deveria receber cuidados e atenção, tanto quanto a questão de restaurar suas memórias, quanto na questão de trazê-lo o conhecimento sobre o que o aguarda, uma vez que nascera fadado ao mundo lúpus de um jeito ou de outro ao que poderia ser descoberto como um puro, ou exposto ao associar-se com um.

Mas, depois do modo como agira sem qualquer controle sobre suas emoções momentos atrás, estava claro que apenas adiou o inevitável. Ele se odiava por isso. Tanto esforço e dedicação, tantas coisas sendo deixadas de lado para que ele conseguisse alcançar seus objetivos, para que conseguisse ser melhor do que qualquer outro e com isso garantir ao seu ômega segurança e conforto, e no fim ainda existia um garotinho assustado, confuso e coberto por feridas em algum lugar dentro dele.

Um garotinho que tinha receio de entregar-se às mãos de alguém, preferindo ter alguém nas suas. Um garotinho que sequer conseguia confiar em Louis e o olhava como se o felino tivesse culpa de seu sentimento de abandono, mesmo que não o culpasse de fato. Um garotinho medroso.

Ele odiava esse garotinho.

Ele odiava que ainda houvesse espaço em seu corpo para abriga-lo.

Depois de tantos anos, de tantos treinos, de tanto autocontrole, de tanta turbulência em seu dia a dia, ele ainda conseguiu chorar e gritar, mostrando um lado vulnerável e obscuro em seu âmago para o ômega do qual ele gostaria fervorosamente proteger. Para o ômega que deveria vê-lo como um símbolo de força e controle, de segurança. Louis deveria estar o achando fraco e incapaz nesse exato momento, sem dúvidas.

Era assim que ele se achava agora.

Como pudera apenas falar tudo aquilo daquela forma? Como apenas deixou-o saber sobre coisas tão egoístas? Fora Louis quem sofrera um acidente e vivera por anos no escuro, ele quem perdera sua família. Styles sequer tinha uma família de verdade antes de Louis, seus avós e Nicolau. Não era merecedor de possuir sentimentos tão arrogantemente negativos apenas porque os perdeu um dia. Pelo contrário, cabia a ele empurrá-los ao longe de sua consciência e jamais permitir que qualquer coisa tivesse o poder de afetá-lo novamente.

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