— Se eu pudesse voltar no tempo eu tinha falado pra sua mãe te abortar!
— E eu, se pudesse voltar no tempo, teria fugido de casa quando era criança!
— Seria um presente, moleque! Pra mim você é um peso morto! Vinte e dois anos na cara e não passa de um vagabundo!
— Eu não sou vagabundo, pai! Eu sou estudante.
— Porra de estudante, vai trabalhar, catar latinha ou vender cocaína. Qualquer coisa que seja coisa de homem!
— Vender cocaína pra você mesmo comprar?
— É pode ser!... É melhor do que ficar com essa bobagem de universidade. Isso é coisa de rico e aqui nessa casa, nós somos pobres e fodidos! Entendeu?... Fodidos! — gritou, jogando a garrafa de bebida na parede próxima ao garoto.
Pondo o braço no rosto, Lucas tentou se proteger do vidro que se estilhaçou, mas não pôde impedir que alguns dos cacos cortassem sua pele.
— Droga, pai! Olha o que você fez! Tá maluco? Pirou de vez?
— Tô! Eu tô maluco! Seu assassino, assassino de merda! Sai da minha frente, assassino de desgraçado!
O rapaz abriu a porta da casa e a passos largos andou pela rua em direção a faculdade.
Não era uma distância curta, mas estava acostumado aquela caminhada diária, na verdade era menos cansativa do que a vida que levava com o pai.
Anos e anos carregando o mesmo fardo, um pai viciado em álcool e drogas que diariamente o destratava e dava trabalho, como dormir sobre o próprio vômito.
Olhou para o próprio antebraço, mais uma marca que teria de inventar uma desculpa para não expor o histórico do pai. O sangue escorria, não parecia ser profundo, todavia precisava limpar aquilo.
Com a garganta apertada e o coração aos pulos, Lucas entrou na lanchonete da dona Mônica, antiga amiga de sua mãe.
— Oi Mônica, posso usar o banheiro pra lavar isso aqui? Eu...
— O que aconteceu, garoto? — perguntou a mulher, puxando o braço do rapaz para examinar.
— Eu caí — respondeu, apertando o maxilar.
— Caiu nada, eu sei que foi aquele viciado de merda!
— Não foi, não. Eu realmente caí!
— Garoto, até quando você vai engolir tudo isso? Você não pode continuar fingindo que tá tudo bem.
— Eu juro que eu caí, Mônica, eu juro! — falou mais alto do que planejava.
— Tá bom, tá bom... vem aqui, vamos lavar e cuidar desse corte.
— Obrigado e desculpa.
— Tá tudo bem, você tá nervoso. Quer dormir lá em casa, hoje? Vou fazer aquela canja que você gosta.
— Eu não quero incomodar, Mônica.
— Você não me incomoda moleque, peida como um velho, mas eu já tô acostumada.
— Engraçadinha — falou, deixando escapar um pequeno sorriso.
Com carinho a mulher que o viu crescer passou os dedos nos cabelos ondulados do rapaz.
Lucas permitiu o cafuné da única pessoa em quem confiava.
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Sempre Cabe +1
RomanceDepois de trancar o curso de medicina na Europa, Diego volta para o Rio de Janeiro, sua cidade natal, para cursar publicidade e propaganda. Nesse meio tempo de andanças por faculdades diferentes ele conhece Natália, uma nordestina tímida e sensível...