O Sonho

1.1K 132 261
                                    


Acordei de supetão com um grito, minha pele estava molhada de suor deixando alguns cabelos grudados no meu rosto, meu peito estava ofegante como se eu tivesse corrido quilômetros sem parar. Sento na cama e começo a tocar meu pescoço e meus braços num ato inconsciente de saber se aquilo era real, se eu era real.

Será que foi tudo um sonho, afinal? Eu realmente não morri?

As lembranças do momento da minha morte vêm em minha cabeça, mas minha mente ainda está confusa, não consigo distinguir se realmente era um sonho ou não. Enquanto estou tentando colocar a cabeça no lugar, a porta do meu quarto se abre abruptamente.

– Senhorita! Está tudo bem? Ouvi um grito do seu quarto e vim o mais rápido que pude! – Shizune se aproxima da beirada da minha cama, mas ela toma cuidado para não se aproximar demais sem a minha permissão. Seus olhos estavam cheios de preocupação, ou pelo menos, pareciam que estavam.

– Eu... Estou bem foi só... Um pesadelo estranho. – Me limito a dizer apenas isso, tentando não parecer confusa com o que acabei de vivenciar.

Shizune solta o ar aliviada.

– Tudo bem senhorita, você deve estar muito ansiosa pelo dia de hoje. Vem, vou lhe preparar um banho morno.

– Como assim? O que tem o dia de hoje? – Pergunto confusa tentando entender a situação, olho para as cortinas tampando o sol na janela. Já era manhã e eu lembro muito bem que no meu sonho, já estava entardecendo. Será que eu perdi a oficialização do casamento?

– Ora, se esqueceu senhorita? Hoje é o dia em que você vai conhecer o seu noivo – Ouço a voz da Shizune vindo do banheiro.

– O que?! Meu noivo? Mas meu noivo eu já... – Minha voz foi perdendo o tom enquanto eu levanto da cama e vou correndo até o espelho na minha penteadeira. Assim que olho meu reflexo, minha alma se esvai do meu corpo por um instante enquanto eu analiso cuidadosamente o que vejo à minha frente: Eu estava ligeiramente menor em altura do que eu me lembrava, meus seios nunca foram tão fartos, mas percebo que estavam pequeníssimos ao que eu já estava acostumada, e o pior de tudo, meus longos cabelos rosas agora mal encostavam nos meus ombros.

O que está acontecendo? Será que é outro sonho? Não, não é possível.

O desespero parece querer tomar conta de mim. Fecho os olhos e respiro o mais calmamente possível, tentando analisar toda aquela situação diante de mim. Dou uma beliscada forte no meu pulso, numa tentativa frustrada de acordar de mais um pesadelo. Para o meu infortúnio, isso não era um pesadelo.

– Shizune quantos anos eu tenho agora? – Pergunto antes de pensar se ela me acharia louca por estar indagando isso. Mas se o que eu estiver pensando for real, isso deve esclarecer as coisas por enquanto.

– Ora senhorita, que pergunta é essa? – Shizune sai do banheiro em minha direção, suas roupas meio úmidas por ter enchido a banheira e secado as mãos logo em seguida. Seus olhos me fitavam de um jeito que eu nunca sabia o que ela realmente estava pensando. Odeio quando ela responde a minha pergunta com outra pergunta.

– Me responda de uma vez! Estou mandando, droga! – Meu tom de voz sai um pouco mais alterado do que deveria. Isso acaba fazendo ela recuar um pouco e uma expressão levemente assustada brota em sua face.

– Bom... É... A senhorita fez quinze anos ontem. – Ela enfim responde com uma voz baixa.

QUE? QUINZE ANOS? Não, isso não pode estar certo. Eu sei que faltava uma semana para o meu aniversário de dezenove anos quando eu tive esse sonho, então tecnicamente eu deveria ter dezoito anos agora. Mas como? Pelo menos isso explica o motivo da minha aparência estar diferente e o meu rosto mais jovial, eu me lembro que eu era exatamente assim quando eu tinha quinze anos. Mas então se isso não é um sonho, o que aconteceu? Eu voltei no tempo? Será que eu recebi uma segunda chance de mudar o meu trágico fim? Só pode ser isso, não vejo outra explicação. E se essa é uma nova oportunidade que eu estou recebendo para mudar meu futuro... Então não posso cometer os mesmos erros que cometi anteriormente. Eu vou ter que mudar algumas coisas, para o meu próprio bem. E, principalmente, descobrir quem é a pessoa que me matou. Eu vou descobrir. Não serei morta novamente.

E, assim como um estalo na minha mente, tudo fez sentido. Eu claramente voltei no tempo para reescrever o final de merda que a minha vida teve. Quem diria que eu iria acabar morrendo assassinada e sem roupas! Definitivamente não vou deixar isso acontecer de novo.

E assim outro estalo veio na minha mente: Todos são suspeitos, já que todos praticamente me odiavam. Não posso confiar em ninguém além de mim mesma. Isso inclui Shizune.

E principalmente Sasuke Uchiha.

– Me desculpe Shizune, foi uma pergunta idiota. – Mudo totalmente o meu semblante e me viro de frente para ela com um sorriso no rosto. Se eu quiser sobreviver, preciso mudar a minha atitude para ontem, já que, basicamente, tenho apenas três anos de vida restantes para arrumar as cagadas que cometi em uma vida inteira. Se alguém me odeia tanto assim a ponto de querer me ver morta, então só preciso fazer com que deixem de me odiar. – Onde e quando vou conhecer meu futuro marido?

Não sei o que deixou Shizune mais surpresa, eu ter pedido desculpas a ela ou o fato de eu ter dado um sorriso bastante amigável. Eu não costumo sorrir tanto assim, as únicas vezes que me viam sorrindo era quando eu estava com Sasuke. Fora isso, eu sempre tinha no rosto uma cara de tédio sem fim, pois ninguém nunca parecia confortável em ficar perto de mim por tempo demais. Exceto por Shizune, bom, não que ela goste de ficar comigo, ela apenas fica pois esse é o seu trabalho. Shizune é a pessoa mais próxima com quem convivo, desde que eu era pequena. Ela veio até nossa mansão em busca de trabalho quando ainda era bem jovem, e minha mãe me deixou aos cuidados dela desde que eu era criança. Não sei exatamente em que momento comecei a maltratá-la. Lembro-me vagamente de minha mãe me dizendo que por ser quem somos, deveríamos mandar nos criados como quisermos, já que eles vinham de uma camada mais pobre da sociedade e não se importavam de serem mandados por nobres como nós. Acho que depois de um tempo, se tornou natural para mim mandar em Shizune e ela obedecer a todos os meus caprichos, mesmo que ela de alguma forma se machuque por causa disso. Lembro-me de um dia em que eu propositalmente joguei uma das minhas pelúcias no lago e obriguei-a a buscá-lo nadando. Era inverno, ela voltou com o uniforme encharcado e a pelúcia na mão, e ficou doente por uma semana. Mesmo eu já tendo aprontado inúmeras vezes com ela, Shizune nunca pediu demissão ou quis ir embora, não sei se ela tem algum tipo de afeto por mim ou simplesmente não tem mais para onde ir. Aposto que é a segunda opção. Ainda não posso descartá-la como suspeita, por conta de tudo o que já fiz com ela, mas também não posso ignorar que Shizune é a única pessoa que sempre esteve de fato comigo. Agora que eu vejo por esse lado, sinto pena dela por ter aturado minhas maldades por tanto tempo. Se eu quiser mudar meu futuro, devo começar por ela.

– Você deveria sorrir mais senhorita, combina bem com seu rosto. – Ela disse sem pensar muito, ainda olhando pra mim. – Ah! Perdão, não deveria dar minha opinião sobre isso! – E em um segundo ela abaixa a cabeça e entrelaça os dedos das mãos, tremendo, como se eu fosse de alguma forma arrancar a alma dela fora ou algo do tipo.

– Tudo bem Shizune, não precisa se desculpar. Talvez eu realmente deva tentar isso de sorrir mais, quem sabe? – Dou um tapinha no ombro dela e sigo em direção ao meu banho.

Como é bom estar de volta.

Reset:LifeOnde histórias criam vida. Descubra agora