Gravidez

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Isadora

Preciso ir a Búzios encontrar o Ricardo no restaurante Enigma. Tem alguns tópicos do projeto que nós precisamos conversar pessoalmente. Vou aproveitar a oportunidade e contar a ele que a nossa parceria já rendeu o capital suficiente para darmos início aos trabalhos. Agora só falta descobrir o valor do terreno e fecharmos a compra. Eu e Miguel já estávamos prontos para sair de casa. Desço a escada primeiro para abrir o portão da garagem e tirar o meu carro quando me deparo com a Rebeca parada na beira da calçada. Ela leva um susto quando me vê:

---Não sabia que você tinha voltado... Desculpa.

"Pois é..."

Fico chocada e sem saber o que dizer enquanto a observo. Seu semblante é de dor e sofrimento. Ela está toda inchada, pálida, com olheiras fundas e escuras embaixo dos olhos, e os lábios rachados e feridos. Ela parecia uma morta viva, um zumbi saído de um filme de terror. Seu olhar não tem aquela arrogância habitual, e ela está humilde na minha presença. Pela primeira vez desde que a conheci sinto pena dela. Eu sei o quanto ela queria esse filho, e perder ele acabou com a sua vida:

"Meus pêsames. Lamento muito por sua perda. E não estou falando isso da boca pra fora, acredite. Perder um filho é a pior dor que uma mãe pode experimentar."

---Obrigado pelos pêsame, sei que foram sinceros. Você não imagina a tristeza que eu sinto no meu coração. Perdi completamente a vontade de viver. Se eu pudesse morreria junto com meu filho.

"Eu imagino... Sinto muito."

-Isa, está tudo bem aí fora ? Está falando com quem ? – Grita o Miguel enquanto desce as escadas para me encontrar na garagem.

---Eu vou embora e volto outra hora. Não quero atrapalhar vocês.

Rebeca vira as costas e se afasta com passos lentos e com a mão direita na parte de baixo da barriga, como se tivesse segurando um curativo.

-Isa, o que você... Rebeca ?! O que você está fazendo fora de casa ?

Preocupado, Miguel passa por mim e se aproxima dela com dois passos largos, colocando a mão em seu ombro:

---Eu já estou indo embora, não se preocupe.

-Você está operada, cheia de pontos e com um dreno na barriga. Era para você estar de repouso.

---Eu sei disso.

-Você estava discutindo com a Isadora?

---Não, eu não...

"Nós não estávamos discutindo, Miguel. Está tudo bem." (intervenho antes que ele interprete tudo errado.)

-O que você veio fazer aqui, Rebeca ?

---Eu tentei entrar em contato com você pelo celular, mas não consegui. Liguei para a sua mãe e ela me disse que você estava isolado aqui, mas não mencionou que a Isadora estava com você, senão eu não teria vindo incomodar. Infelizmente eu tive que vir porque preciso da certidão de nascimento, do atestado de óbito e dos laudos médicos do período que o Miguelzinho ficou internado na UTI neonatal.

-Deixava um recado na operadora que a Luísa me passava depois. Ou então falava com a Samantha pelo telefone que ela dava um jeito de me dar esse recado e eu levaria esses documentos para você.

---Minha cabeça está tão confusa que eu nem lembrei que poderia deixar um recado na operadora. A Samantha não se daria nem ao trabalho de atender uma ligação minha, quem dirá transmitir algum recado meu a você. A sua irmã não me suporta e eu não tiro a razão dela!

-Você tem razão. Todos os documentos que você precisa estão lá em cima. E nós também precisamos conversar sobre algumas questões...

"Miguel, ela está de resguardo e não pode subir escadas."

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