Capítulo 43

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Capítulo 43

Helena Greco

"A única verdade que realmente sei: os seres humanos me assombram."

— A menina que roubava livros – Markus Zusak

A voz de Matteo me paralisa.

A quanto tempo ele estava ouvindo a nossa conversa?

— Vamos, digam! O que eu preciso saber?

— Você… você precisa saber que… Carlos precisará se ausentar por alguns dias.

— E por quê?

— O problema na perna dele, devido ao tiro que ele levou, voltou a incomodá-lo. Ele não queria cuidar disso alegando que as coisas estão complicadas por aqui, mas não posso permitir que continue fazendo a minha segurança, sabendo que ele sente dor e que às vezes a perna adormece e ele não a sente. Isso é perigoso tanto para ele quanto para mim. Vá, Carlos, consigo outro soldato para substituí-lo enquanto você passa por alguma espécie de tratamento. 

— Mas senhora…

— Nada de mas! Não me faça sentir ainda pior com toda essa situação. - engrosso o meu tom já lhe dando uma reprimenda mesmo que velada, por me fazer mentir para o meu marido.

— E porque você se sentiria mal, Helena? Isso não está no seu controle. - diz Matteo desconfiado encarando a nós dois.

— É claro que eu me sinto mal. Ele levou esse tiro por minha causa, e terá que conviver com esse desconforto sempre.

— Ele é treinado e pago para isso, essa é a vida dele, este é o trabalho dele. Se ele não for capaz de aguentar as consequências de um tiro, ele nem sequer deveria estar mais aqui!

Matteo diz em um tom ácido e cruel. Realmente, esses dias ele não estava sendo a pessoa mais fácil para lidar, tão pouco aturar, mas ele era meu marido e estava passando por um momento difícil, então não me restava escolha. Eu tinha que aturá-lo, sem julgá-lo.

Para não contrariá-lo e retirar a sua autoridade em frente a um soldato, como tantas vezes já fiz desde que voltei, eu respiro profundamente, e digo:

— Tudo bem, concordo, ele foi treinado para me proteger e dar a sua vida por mim, mas agora, nesse exato momento, estou liberando Carlos para que ele se trate. Ele não demonstra, mas sei que a dor deve ser insuportável. Então vá, Carlos, não me faça repetir novamente!

Ele simplesmente abaixa a cabeça e nos pede licença saindo do jardim pelo mesmo caminho que chegou, por entre as árvores da extensa mata que tínhamos ao redor do terreno. No meio das sombras ele sumiu, o barulho dos seus sapatos de couro amassando as folhas secas caídas no chão não podia mais ser ouvido.

Ele havia partido.

Mas a sua mentira havia ficado.

— Quem te ligou? - Matteo se aproximou bruscamente pegando o meu braço.

— Carlos me ligou, pedindo que eu viesse aqui fora, ele sabia que você havia chegado e não queria conversar na sua frente sobre o problema dele, por isso saí sem dizer nada. - a mentira escapuliu tão fácil dos meu lábios que quase fui capaz de acreditar.

— Eu não gosto disso, sei que ele recebe ordens diretas suas com mais rigor do que quanto as minhas desde que você voltou, mas ele é meu soldato como todos nessa porra da Cosa Nostra. Então, eu não quero que você fique de gracinha com nenhum deles, se eles possuem algum problema se reportam a mim e não a você. Ficou claro?

— Absolutamente. - a palavra sai dura da minha boca, eu queria socar a cara dele por estar sendo um cretino idiota.

— E você não se lembra, mas eu vou lhe contar uma coisa, você tinha um soldado à sua disposição no passado, ele se chamava Cássio, era cheio de gracinhas, sorrisos e olhares para você, e um dia eu o peguei olhando para você no jardim como se você fosse a coisa mais preciosa que os olhos dele já viram em toda a sua vida, e eu quase o matei por isso se você não tivesse chegado e me impedindo de terminar de enforcá-lo contra a parede do meu escritório. Então, não coloque você e Carlos nesta emboscada, nenhum de vocês gostará do resultado.

Dito isso ele solta meu braço e vai embora mais rápido que um flash, sumindo dentro de casa deixando-me congelada no jardim, impossibilitada de me mover pela força de suas palavras.

Ele acabara de me ameaçar também? O que ele seria capaz de fazer comigo?

Eu realmente não tinha certeza se queria saber a resposta para essas perguntas. Preferia me fazer desentendida.

Peter precisava aparecer e a partir disso, seja o que Deus quiser. Pois quanto ao futuro eu nada poderia dizer, tudo era incerto, apenas uma coisa era certeira, e o fato era:

Fiz promessa a dois homens poderosos, mas o problema era que os planos deles eram completamente opostos, ambos queriam coisas distintas, as quais envolviam a vida do mesmo homem. 

Então como eu poderia ajudá-los? Como cumpriria a promessa que fiz?

A resposta para isso já era bem mais fácil de encontrar:

— Eu irei trair um deles.

“E você pode dizer ao mundo

Que está cansado

Mas suas desculpas, elas não funcionarão

Porque eu saberei que está mentindo

Todas as vezes em que eu vir seu rosto

Eu percebo todo o sofrimento

Apenas volte para meu abraço

Eu não deixarei você se destruir”

— Without a Word - Bird

O Recomeço - Livro III        |COMPLETO|Onde histórias criam vida. Descubra agora