Os olhos dela

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Eu estava exausto da minha vida, ser acusado o tempo todo e não poder revidar era sufocante. Ela tinha razão eu não podia dizer que não foi minha culpa, mas minha mãe nunca tinha me acusado e isso só me fez perceber que esse tempo todo ela também não me perdoou.

Bati a porta de casa com toda raiva que eu sentia estava perdendo o ar, me forcei a parar no meio da sala porque minha visão começava a falhar e a dor que sentia no peito só crescia. As palavras dela estavam na minha mente e a decepção em seu rosto me fazia acreditar que eu nunca teria o amor dela de volta.

- John..- Maria apareceu em casa derrepente e veio até mim segurando meu rosto, eu não queria que ela me visse nesse estado.- ei...tá tudo bem, não fica assim..

- Volta pra festa, não devia estar aqui.

- Eu não vou deixar você sozinho.

- Sai daqui Maria! Volta...volta pra lá e me deixa em paz.

- Não.

Eu estava perdendo o fôlego, minhas pernas tremiam sem estabilidade eu estava tendo uma crise. Cai no chão ajoelhado tentando puxar o ar mas eu estava sufocando, Maria se ajoelhou a minha frente e segurou meu rosto em suas mãos me fazendo olhar em seus olhos expressivos. Não sei o que ela estava fazendo mas estava funcionando.

- seus....seus olhos são...tão azuis...- ela assentiu acariciando meu rosto me deixando cada vez mais tranquilo.

- Como o céu?

- não...como o gelo...

Me concentrei em seus olhos voltando a respirar aos poucos, eu nunca tinha saído de uma crise sem desmaiar primeiro mas com ela eu consegui me conter.

Seu olhar era tão meigo e delicado que me fez chorar, Maria me abraçou deixando que eu me acabasse bem ali. O perfume dela me deixava tranquilo e calmo e eu já não consigo me imaginar sem isso, sem ela..

- Eu gosto de você John.

Com essa simples frase parecia que meu coração sairia do peito, ela sussurrou contra meu ouvido e eu não fui capaz de reagir, apenas suspirei alto vendo que ela tinha total controle sobre mim.

- Eu gosto de você de verdade, e me dói ver você se acabar desse jeito por pessoas que não merecem.

- Eles são meus pais...devo me retratar com eles.

- E quando eles vão se retratar com você?

Ela me afastou olhando pra mim esperando minha resposta, eu estava me destruindo de propósito me culpando sozinho a vida toda quando na verdade eles também tinham culpa.

- Meu pai já tinha me alertado sobre o lago congelado...mas a camada de gelo estava mais firme eu não achei que teria problema a gente brincar com o trenó...

- Não tem que me contar..

- Eu prometi pra ela que não ia quebrar eu....eu disse pra ela confiar em mim eu devia ter protegido ela como prometi...eu procurei ela na água mas ela já tinha afundado ela não sabia nadar..

Me doía só de lembrar, o desespero que senti foi como se eu estivesse morrendo com ela.

- Os bombeiros acharam o corpo dela congelado no fundo do lago cinco horas depois...ela estava azul....como o gelo.

Era o tom dos olhos da Maria..

- Você tinha doze anos John, acredite não foi sua culpa.

- Eu sei o que todo mundo diz, "acidentes acontecem", mas acidentes podem ser evitados e eu não evitei esse.

- Como você saberia? Você era apenas um menino John, não seja tão cruel com a criança que você foi...se fosse seu filho você não o culparia dessa forma então porque você se culpa assim? Se perdoe..

Com ela eu consegui ver a diferença, ela me mostrava outra realidade de outra perspectiva. Realmente se fosse meu filho ou talvez qualquer outra criança eu não o culparia. Eu não tive más intenções naquele dia, não queria que minha irmã se machucasse, estava tentando dar a ela um dia agradável e apenas isso.

- Eu quero recomeçar Maria, quero sair dessa cidade e nunca mais voltar.

- Eu posso ir com você?

- Na verdade eu exijo que venha comigo.

Foram dias pensando sobre isso, eu já não queria mais me punir já estava farto de levar a culpa sozinho, Maria foi a pessoa que mais fez coisas por mim nos últimos dez anos e eu queria tentar alguma coisa realmente séria com ela. Eu finalmente decidi que a igreja não é pra mim, eu ainda posso frequentar é claro mas ser padre não é minha vocação e nunca vai ser.

Ela sorriu animada e me beijou praticamente pulando de felicidade, se ela é ou não a mulher da minha vida eu não sei mas a verdade é que ela me fez reviver outra vez.

- Podemos ir pra qualquer lugar do mundo não é incrível?!

- Pra onde você quer ir?.‐ ela pensou um pouco mas parecia já ter a resposta.

- Califórnia.

- Tudo bem, então nos vamos pra Califórnia amor..

Talvez não fosse necessário ir pra longe bastava eu dizer que renegaria meus votos e ficaria com ela mas eu precisava me afastar, eu já passei por muita coisa aqui e nunca saí dessa cidade eu precisava de novos ares e Maria também.

Eu ainda tinha muito a fazer antes de ir embora, pra começar pela igreja. O antigo padre da cidade confiou em mim para assumir o posto e mesmo indo embora daqui eu não queria decepcionar mais ninguém eu sei que as pessoas daqui costumam guardar rancor e se eu precisar voltar algum dia espero ser bem recebido.

- Quando nós vamos?

- Eu ainda não sei, preciso fazer algumas coisas antes...

- E nós vamos contar pro seus pais sobre a gente?

- Eles estão te considerando filha deles, se contar eles vão ficar com raiva de você principalmente meu pai..

Eu sei que apesar de estar bajulando eles apenas pra morar aqui Maria aprendeu a gostar deles. Era de se esperar já que ela nunca teve pais de verdade e agora que tinha uma família ela se apegou rápido.

- Vamos guardar esse segredo por enquanto..

Era uma nova etapa pra nós dois e eu só espero que tudo dê certo apesar de que meu coração diz que alguma coisa ruim está para acontecer.

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