Capítulo 52

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A negligência que se instalara desde a partida de Christine era palpável. O Opera, outrora palco de grandiosas óperas e tragédias apaixonadas, agora agonizava sob a gestão de pessoas sem escrúpulos, cujo único interesse era o lucro imediato. Os assentos, outrora ocupados por admiradores ávidos, agora permaneciam vazios, testemunhas mudas do declínio iminente do lugar. Persa, um amigo distante, mas ciente dos infortúnios que assolavam Erik, sentia-se impotente diante da situação. Rumores sobre os problemas no Opera haviam chegado aos seus ouvidos, despertando nele um desejo ardente de intervir e ajudar seu amigo em apuros. As consequências do abandono foram devastadoras, resultando em perdas incalculáveis e levando o teatro à beira do colapso total. Nada, exceto a intervenção direta de Erik, poderia salvar o Opera do destino sombrio que o aguardava.

Katherine, esposa de Persa, observava com pesar a aflição de seu marido diante da situação de Erik, um amigo tão querido quanto um irmão. Ao chegar a Paris, Persa se deparou com um Erik transformado, ainda assombrado por seus demônios internos, mas agora alimentando uma centelha de esperança que há muito parecia extinta.

- Não vejo impulsividade em suas ações, meu caro. Pelo contrário, vejo em você o ressurgimento do verdadeiro Erik. Persa repousava confortavelmente em sua poltrona favorita no escritório do amigo, enquanto a luz fraca das velas dançava sobre seu rosto sério.

- Você sempre foi mestre em decifrar enigmas, Persa. Erik sorriu, agradecido pelo apoio sincero de seu amigo em tempos difíceis.

Ao compartilhar as experiências da viagem impulsiva e os progressos junto a Gustave e Ellie, Erik sentiu-se revigorado. Ele estava, mais uma vez, assumindo seu papel de protetor e amante, encontrando propósito nas relações que o rodeavam.

- Que viagem revigorante. Parece que você precisava disso mais do que imaginava. -Persa começou a tecer planos para a revitalização do teatro, impressionado com a disposição renovada de Erik para enfrentar os desafios que se apresentavam.

- Reconheço que estou melhor. Acredito que podemos começar os preparativos para reabrir o Opera. Mas agora, meu amigo, a noite avança e Kath provavelmente já sente sua falta. Erik se ergueu, os primeiros sinais de cansaço se fazendo sentir em seus membros tensos.

- Kath é compreensiva, mas talvez deva considerar suas prioridades. Persa lança uma provocação velada, deixando Erik intrigado com a insinuação por trás de suas palavras enigmáticas.

- O que quer dizer com isso? Erik ocultou sua surpresa, sabendo que Katherine possuía uma sagacidade capaz de penetrar em suas defesas mais íntimas.

- Apenas sugiro que seja transparente quanto aos seus sentimentos por Ellie. E, falando nisso, um jantar para nos conhecermos melhor seria muito bem-vindo. Arthur está ansioso para reencontrar Gustave. Persa despediu-se com um sorriso misterioso, deixando Erik imerso em reflexões.

Erik deitou-se na cama, mas de repente o vazio ao seu redor parecia sufocante. Ele havia deixado Ellie sozinha por um tempo, achando que precisava dar-lhe espaço, mas agora, na escuridão de seu quarto, ele sentia o peso de sua ausência como nunca. A solidão era palpável, um espectro que o envolvia e o arrastava para o abismo de seus próprios pensamentos sombrios. Ao fechar os olhos, o terror o envolveu como um manto negro. Pesadelos que ele pensava ter abandonado o assaltaram sem piedade, arrastando-o de volta aos cantos mais escuros de sua mente atormentada. As imagens distorcidas dançavam diante de seus olhos fechados, ecoando os horrores que ele havia vivido e os demônios que ainda o assombravam.

Erik não suportava mais. O desespero o consumia, e ele sabia que só havia uma maneira de afastar esses fantasmas: correr para os braços de Ellie. Sem hesitar, ele se levantou, o suor frio banhando seu corpo trêmulo, e correu em direção ao quarto da jovem. Ellie levantou-se com um sobressalto quando Erik adentrou o pequeno quarto. Seus olhos se arregalaram de surpresa ao vê-lo naquela condição tão desolada. A face de Erik estava distorcida pela dor, desprovida de sua máscara. Suas roupas estavam encharcadas de suor, e suas mãos tremiam visivelmente, revelando a gravidade do que o assolava. Erik proferia palavras desconexas, fragmentos de seus pensamentos mais sombrios que escapavam de seus lábios trêmulos.

"Quando o vi, desejei lançá-lo contra a parede!"

"Marie me segurou, mas eu queria tê-lo matado!"

"Um recém-nascido... eu queria tê-lo matado por tirar Christine de mim!"

O terror em suas palavras ecoava a angústia que o corroía por dentro. Ele estava sendo arrastado de volta ao passado, revivendo os momentos de loucura e desespero que o assombravam dia após dia. E ali, diante de Ellie, ele encontrou seu refúgio, sua âncora na tempestade de sua própria mente atormentada.

- Erik, por favor olhe para mim.... Ellie acariciou o rosto do homem, que estava desesperado, aqueles pesadelos haviam retornado para o assombrar.

- Eu não a mereço ... eu sou um monstro, só um para tentar matar o próprio filho. Eu sou um demônio eu não a mereço .... nunca mereci nada... O homem se afastou do toque de Ellie.

Ellie nunca o havia visto desse jeito, Erik parecia ser alguém forte que nunca iria desabar em nada.

- Erik, meu amor ... eu sinto muito por você ter esses pesadelos, e se você no passado teve pensamentos tão ruins assim, mas você mudou. Aliás eu acho que você sempre foi alguém bom, não seja consumido por coisas tão ruins assim. Ellie se aproximou de Erik e o abraçou.

- Não permita que sua vida desmorone, estou aqui por você. Gustave o ama, ele nunca iria vê-lo como um monstro. Ellie continuou acariciando o rosto de Erik, acalmando com ternura aquele homem tão fragilizado.

Erik odiava mostrar um lado tão instável as pessoas, Christine sabia desse lado, o lado que ele sentia prazer em afligir dor a outras pessoas e não se arrependia em fazer justiça com as próprias mãos.

Sentia que sua vida era feita de muitas reviravoltas, havia se acostumado em lidar com aquilo.

- Erik, eu acho que você deveria parar e pensar no que você se tornou. Seus atos impensados no passado não são permanentes. Sua dor pode passar e o melhor que você tem a fazer é se aceitar e aceitar e amar o seu filho. A jovem sorriu, suas palavras deixaram Erik calmo, parando de tremer.

O mascarado abraçou a jovem, Ellie era seu porto seguro, a pessoa que precisava o encontrar para o tirar daquela solidão e trevas.

Ao se recompor, Erik levou Ellie até seu quarto, ele não queria que ela ficasse lá para dormir, mas para ajudá-lo a se arrumar, trocando aquele pijama suado por outro. Erik sabia que era tarde, mas ele deveria fazer aquilo.

- Ele vai amar isso, amor. Gustave vai pular de alegria. Ellie ajeitou a máscara do homem enquanto o observava pelo corredor da residência.

Erik bateu à porta de Gustave e logo entrou. O menino estava dormindo profundamente, agarrado a um ursinho de pelúcia. Aquela criança inocente se parecia muito com ele e Christine, o pequeno tinha força e esperança de ter novamente seu pai presente.

- Sinto muito, meu filho. Eu te amo. Erik sussurrou e se sentou ao lado da cama do menino.

- Papai nunca iria te fazer mal, eu peço perdão se eu fui tão ausente. Erik continuou acariciando o rostinho do menino.

Gustave abriu os olhos, tentou se ajeitar na cama e surpreso viu o seu pai ao seu lado.

- Papai ... O que você está fazendo aqui?? O menino sonolento o questionou.

- Eu só queria vê-lo, filho. Quero que saiba que eu me importo com você. E pedir perdão por tantas vezes dar a entender que eu não o amava. Eu o amo, filho. Muito. Erik abraçou o menino, que timidamente o abraçou.

- Eu te amo papai!! Sempre amei!! Você é o melhor pai do mundo. Gustave foi pego de surpresa, mas aquele gesto era sincero.

- Meu filho .... Tão inteligente e bondoso. Eu prometo que irei estar mais na sua vida. Podemos sair juntos e se você quiser posso te colocar numa escola para conhecer mais pessoas. Erik queria ter tantas conversas com Gustave, ele sabia que era muito rápido e novo ao pequeno, mas ele iria fazer compensar todo aquele tempo perdido.

- Ellie também vira junto?? Ela é muito boa em passeios. Gustave o olhou com esperança.

- Se ela concordar, claro. Erik riu ao ver a criança se iluminar com sorriso.

Gustave sorriu genuinamente e naquela noite pai e filho pela primeira vez dormiram um acompanhando a presença do outro.

Um toque do destinoOnde histórias criam vida. Descubra agora