CAPÍTULO VINTE E SEIS

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                          Nara

       Passava das quatro da manhã quando Calíope chegou, cabisbaixa em silêncio,seu corpo parecia não suportar a dor que ela carregava. Senti o cheiro de lágrimas na brisa da madrugada, minha vontade foi de correr ao seu encontro e abraçá-la, mas isso seria invadir seu espaço, toda essa enxurrada de sentimentos não pude esconder criando uma barreira  e de longe ela soube que eu estava preocupada, olhou para mim, sentada na varanda à sua espera, e deu um passo para trás, assustada. Sua mão foi para a gola alta que cobria todo o pescoço.

― Você me assustou. ― Falou, baixinho enquanto chegava mais perto. ― Estava me esperando?

― Você saiu sem avisar e não conhece essa ilha, fiquei preocupada. Se não quiser, não precisa dizer onde estava, mas tenho que saber se está bem.

Ela estudou o meu rosto, as sobrancelhas franzidas, e abriu um sorriso que não chegava aos olhos.

― Estou bem, só um pouco cansada e decepcionada. Vá dormir, minha irmã. ― Pediu. Calíope abaixou as mãos, assumindo uma expressão séria. Notei de relance uma marca vermelha ao redor de seus pulsos, como se tivessem sido apertados com força. Na sua coxa, logo abaixo da barra da bermuda, havia uma marca de mordida que certamente deixaria um hematoma. ― Obrigada por se preocupar comigo. Você nem imagina como faz diferença ao mesmo tempo que faz com que eu veja o tamanho da merda em que estive atolada, mas não se preocupe, eu estou tentando mudar.

      Ela entrou antes que eu encontrasse as palavras para responder ou questionar, deixando para trás um cheiro forte de sexo. Seja lá onde e com quem estava, só esperava que tivesse sido um bom sexo, o que eu duvidava muito, me sentia de mãos .

      No dia seguinte, encontrei a casa estranhamente em silêncio e com a porta da cozinha aberta. A saída dava diretamente para a praia, eu podia ver as meninas em seus trajes de banho conversando com os lobos nativos. Seus cabelos coloridos e gracinhas para cima das garotas em nada me agradavam.

      Calíope caminhava sozinha, se distanciando das guerreiras e do começo de uma amizade ainda frágil, que mal começou a nascer. Um dos lobos foi em sua direção,  de longe dava para sentir o descontentamento da minha irmã. Iara se posicionou à frente dela, de modo defensivo, e empurrou o lobo derrubando-o na areia. Não parecia que eu precisaria interferir, então dei as costas e fui cuidar do meu estômago que estava gritando.

     Apesar de já ser no final da tarde, tomei meu café ao som das vozes das garotas tagarelando coisas de adolescente. Eu também me sentia leve, sem o peso de ser líder e ter um mundo de responsabilidade. Por três dias, eu seria só uma mãe e uma loba jovem perto da sua companheira, com direito a paquerar minha companheira e ser paquerada. Ao menos era o que eu esperava.

     Guardei minhas chaves e carteira em um armário, só por segurança, e fui ao encontro das garotas, mesmo não sendo apaixonada por água salgada. Admito que naquela reserva o fim de tarde tinha um encanto especial.

      Deitei de bruços na areia morna, embriagada pela beleza do pôr do sol. A estrela descia lentamente, quente e vermelha, pintando céu e mar nas cores de sua despedida e abrindo caminho para uma lua escandalosa do lado oposto. Era como uma visão invocada pelo cantar de mil sereias.

      Meus pelos se arrepiaram quando senti olhos sobre mim. Sentei os sentidos aguçados, e fiz uma varredura discreta no ambiente enquanto espanava a areia do meu corpo. Não vi nada demais no mar aberto e muito menos na vegetação próxima aos chalés, continuei alerta por mais alguns instantes. Quando considerei seguro o suficiente para relaxar, voltei a deitar para apreciar a magia de cores do sol se escondendo no horizonte acontecia bem na minha frente.

🏳️‍🌈Bruxas e Guerreiras vol.03Onde histórias criam vida. Descubra agora