CAPÍTULO QUARENTA E TRÊS

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                  NARA SHIVA

       Uma névoa negra, fina como um véu que cobre o rosto de uma viúva balzaquiana, saiu devagar pela porta do depósito, assustando os homens que ainda discutiam sobre o que fazer com o tal Luiz. O silêncio também reinou ali onde antes discutiam o destino do homem que, na minha opinião, já tinha morrido.

       Agucei os sentidos farejando o ar. Não havia cheiro de nada, mas algo horrível circulava ao redor daquelas pobres almas, que não tinham forças para sair. Eu não podia deixar meu esconderijo, que ficava exatamente do outro lado da única rua asfaltada. O restante era mato e mais mato. Não daria uma de super-heroína sem antes entender o que estava acontecendo. Só esperava que Nyxs tivesse visto algo na frente das mansões.

— Socorro! — O grito veio dos arredores do depósito. Por pouco não me teletransportei para cima dos homens. Olhei ao redor para localizar o pedido de ajuda e vi um dos trabalhadores do abastecimento sendo arrastado para dentro dos arbustos. A nuvem negra impediu a visão do que ou quem o estava puxando.

— Vamos embora antes que todos nós sejamos levados. Quem quiser ficar para morrer, que fique. Eu já estou indo. — O motorista subiu as escadas e entrou na cabine do caminhão antes de fechar a porta. Mais dois subiram na boleia e o restante entrou na parte traseira, entre os engradados vazios, batendo forte na lateral por dentro do transporte.

— Pisa fundo, John. Rápido, cara, senão seremos arrastados também. — Não sei quem gritava, só ouvia a voz e o som de pés correndo em todas as direções. O fedor do medo liberado no suor dos humanos era forte o suficiente para me obrigar a tapar o nariz.

— Se segurem e comecem a rezar para chegarmos vivos em casa. Só espero que a balsa esteja no cais.

       Os pneus rasparam no asfalto, acompanhados por um forte cheiro de borracha queimada. Quando o carro passou perto de onde eu estava escondida, vi os rapazes fechando as portas que batiam na lateral do veículo pesado.

       Deixei que eles fugissem e fui em direção do amigo abandonado à própria sorte, seguindo o rastro de plantas pisoteadas. Os gritos haviam cessado e restou apenas o ruído das folhas secas sendo amassadas.

       Eu vi o perigo antes de sentir o cheiro característico de algo podre. A cobra-preta arrastava o corpo já sem vida do homem. Mantive uma distância segura, sentindo que ela o levava para o local que devia ser usado como depósito de corpos. Saímos da parte moderna da cidade e entramos no lado hostil da ilha, o mesmo que antes era habitat das cobras nativas.

       Rastejei sobre as patas, sempre camuflando meu cheiro para não ser percebida. Alguém veio do alto, pulando diretamente sobre meu corpo e tapando minha boca. Aqueles dedos eram macios e quentes, com uma textura aveludada que eu reconheceria mesmo após a morte. O cheiro da mão, do corpo e o som daquela voz estavam entranhados no meu DNA. Balancei meu focinho, livrando-me da mão e respirando livre.

— Saia de cima de mim antes que a nossa amiguinha lá na frente sinta seu cheiro.— Pedi, esfregando o focinho em sua mão como os lobos fazem com os filhotes.

— É impossível ela me sentir. Estou invisível, e você só está me vendo porque está na pele da loba. Se estivesse na de humana, não veria. — Nyxs fez carinho no meu pescoço e nas minhas orelhas, esfregando rapidamente as mãos nos pelos e puxando-os. Eu amava essas carícias quando estava transformada.

— Onde está Nalum?— Estranhei o fato dela estar sozinha.

— Ela está vigiando a frente da casa de show. Inaê e Helô descobriram que o chalé da Amkaly nunca foi habitado e vieram para a casa de show ficar com a Nana, tentar ver se elas estão juntas.

🏳️‍🌈Bruxas e Guerreiras vol.03Onde histórias criam vida. Descubra agora