Capítulo 3 || UNBELIEVABLE

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As coisas que fiz para fugir
São imperdoáveis
Esta dívida que não consigo pagar
É imperdoável
Imperdoável
Inacreditável
(Ethan Gander)

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Acordo com a maior dor de cabeça, como se tivesse enchido a cara na noite anterior, mas aí meu estômago ronca para avisar o motivo: estou sem comer de verdade há nem sei quanto tempo. Naquela droga de festa dos irmãos veganos só serviam uns canapés de abobrinha, antepastos de berinjela e mais um monte de coisas cheias de frescuras que acho que nem se comesse uma bacia delas daria uma refeição completa.

Pego o celular na mesinha de cabeceira para conferir as horas.

12:36

Maravilha. Metade do meu domingo se foi.

"Você devia ser mais grata, podia nem ter esse dia para viver..."

Grata o caramba, se essa cidade fosse minimamente segura, eu não precisaria ter corrido o risco de morrer na noite de ontem.

"Mas mesmo assim..."

Fica quieta, droga! Por que a voz da minha cabeça tinha que ser a de uma professora de yoga de cinquenta anos? Já me senti grata e sortuda por estar viva hoje de manhã, agora tenho o direito de ficar indignada e P da vida.

Vou até o meu banheiro e jogo uma água no rosto, finalmente criando coragem para me olhar no espelho. Minha cara parece igual, não sei o que esperava encontrar. Mesmo quando faço merda ainda sou eu. Provavelmente fico mais parecida comigo mesma nesses momentos. A única diferença é uma linha fina e fraca no meu pescoço. Sinto ainda mais raiva ao passar os dedos nela — foi o lugar onde aquele homem segurou a faca. É algo bem superficial, mais parece um arranhado e sei que vai sumir logo sem deixar marcas, ao contrário do trabalho feito em minha barriga. Filho da puta desgraçado.

Escovo os dentes porque minha boca está com gosto de cabo de guarda-chuva e saio para enfrentar o dia.

Logo sou arrebatada pelo cheiro maravilhoso de comida. Sigo para a cozinha onde Adam e Rebecca já estão preparando o almoço.

— Bom dia, princesa e princeso! — Tento soar alegre.

— Boa tarde, dorminhoca. O que aconteceu? — Becca pergunta aumentando o fogo, antes de olhar para mim.

— Ah, nada demais, eu ia sair com um carinha que conheci na festa de ontem, mas houve uma emergência familiar, a mãe dele se acidentou e ele precisou ir correndo para o hospital. Então voltei para casa e dormi.

— Sério isso? Que pena, hein? — Comenta Adam, distraído.

— Pois é...

— Tem algo aí que não faz sentido. Mesmo quando chega de madrugada, nunca vi você dormir até uma hora dessas. E você está com uma expressão estranha. — Becca afirma com perspicácia.

Ela é uma querida, mas às vezes me irrita o fato de ser tão esperta para perceber certas coisas.

— Impressão sua, Bequinha. Só estava mais cansada que o normal. Deve ser porque voltei à pé.

— Você veio da tal festa à pé tarde da noite? Por acaso enlouqueceu? Tem noção do risco que correu? — Adam atalha, meio alterado. Parece que não estava tão distraído quanto pensei. Se ele soubesse...

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