Capítulo 6 - Seis

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Eu estava me vendo no reflexo de um espelho quebrado, uma versão minha perturbadora em um vestido de noiva. Abri meus olhos e projetei suavemente meu corpo para frente, sentindo meu coração disparado. Olhei para Devon, que estava atento à estrada escura à nossa frente. Já havia anoitecido e eu mal percebi por ter simplesmente apagado ali no banco do carro. Eu podia ver o olhar preocupado de Devon e sentir o carro perdendo a velocidade consideravelmente.

-Droga. – O vi socar com uma força anormal o volante. O carro finalmente parou no encostamento, uma fumaça densa começou a sair do capô fazendo-o xingar diversas vezes.

-O que está acontecendo? – Mordi o lábio inferior, vendo o ódio tomar conta da expressão de Devon.

-Não sei, fica aqui dentro. – Ele saiu do carro e bateu a porta, o ignorei e fiz o mesmo. – Você é surda? Mandei ficar no carro.

-Você não manda em mim... – Dei de ombros, acompanhando-o até a origem do problema. Devon abriu rapidamente o capô e se afastou, evitando queimaduras. A fumaça se intensificou, nos obrigando a se afastar.

-Só pode estar de brincadeira... – Devon fechou os olhos e puxou o cabelo para trás, andando frente aos faróis acesos do carro. – Que merda... – Senti uma brisa bater em meu corpo, fazendo-me arrepiar intensamente. O cheiro de chuva evidenciado por conta do vento. – Pega suas coisas e vamos andando até um lugar para ficar...

-Você está maluco? Como que vamos andar por essa merda? – Indaguei, completamente horrorizada com a situação.

-Você tem uma ideia melhor? – Olhei para meus próprios pés, observando os saltos que me sustentavam. A mulher loira, secretaria de Devon, havia comprado apenas saltos. Como se eu não precisasse de outra coisa para andar.

-Então você vai deixar o carro aqui no acostamento e simplesmente sair andando?

-É Angel, é isso que vou fazer... – Ele bufou, indo até o lado do motorista. Devon entrou no carro, pude vê-lo pegar algumas coisas lá e abrir o porta-malas.

-Você é maluco... Não vou sair andando sem rumo em uma rodovia às oito horas da noite. – Eu disse como se fosse obvio. Devon me olhou, por cima do carro e cerrou os olhos.

-Prefere ficar aqui sozinha? – Ele bateu com certa força e passou por mim, com sua mala em mãos.

-Você realmente vai me deixar plantada aqui? – Gaguejei, sentindo que a fumaça estava se intensificando.

-Pode apostar que sim. – Ele deu de ombros e saiu andando pelo acostamento, sem olhar para trás.

Abracei meu próprio corpo, sentindo um vento intenso quase me levar. Era verão, não me preocupei com roupas de frio. Fiquei próximo do carro, observando a situação atual. Me esgueirei para pegar meu novo celular, descobrindo a falta de bateria. Xinguei alto e o coloquei no bolso traseiro. Cambaleei para trás, sentindo meu pé formigar. A fumava havia adquirido uma cor preta intensa e rapidamente.

-Sai de perto do carro. – Escutei a voz alta de Devon, ele havia voltado, mas ainda sim estava longe. – Angel, sai de perto do carro. – Cambaleei para trás, sentindo meus saltos enfiarem na grama onde acabava o acostamento e a pavimentação. Não havia uma alma viva passando por ali. Observei o capô do carro em chamas, onde supostamente estaria um motor novo.

-Que merda... – Gaguejei, cambaleando para trás com dificuldade.

Pude ver Devon correndo em minha direção, seu corpo foi de encontro ao meu violentamente. Um barulho estrondoso soou em nossos ouvidos. Senti o impacto doloroso do chão e de seu corpo caindo sobre o meu. Todo meu ar saiu dos pulmões bruscamente. Meu coração estava acelerado e um cheiro terrível de queimado se instalou no ambiente aberto, misturando-se com o cheiro de chuva. Seu corpo estava cobrindo o meu por inteiro, como um tipo de escudo. Lágrimas se formaram dolorosamente em meus olhos. Devon saiu de cima de mim, rolando para o lado. A noite, que antes estava um breu intenso, agora estava iluminada. O carro reluzia em chamas.

O AcordoOnde histórias criam vida. Descubra agora