Capitulo 55- epílogo

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O som do choque das minhas unhas contra a mesa de mármore, é irritantemente chato. Faz-me lembrar do terrível som de pneus e buzinas nas estradas na volta do hospital.

Eu ainda não consigo acreditar que ele não estava lá. Que ele não pôde deixar tudo de lado ao menos uma vez para cuidar de mim. Ainda não consigo acreditar.

Ainda com uma leve dor de cabeça, não consigo parar de pensar em tudo o quê aconteceu. E em tudo o quê não aconteceu. Eu tenho medo de perguntar e me acharem uma sem noção. Mas o Dr.Franco disse que qualquer dúvida à respeito da minha memória, eu deveria perguntar. Porém, eu não me lembro muito bem em quem posso confiar. Eu não sei se tudo o que eu acho que aconteceu é verdade. Eu só queria um momento pra gritar e não me sentir uma burra histérica.

- Você ainda não se trocou? - minha mãe se senta na cadeira à minha frente na mesa, com um breve sorriso e um olhar de pena.

- Desculpa - abaixo o olhar - , eu me distraí.

- Tudo bem. Olha, eu não sabia o que você iria querer vestir, então deixei em cima da cama aquela calça que você gosta, um tênis preto e a blusa da escola.

- Escola? - franzo a testa. Eu realmente achava que já tinha acabado a faculdade - Mãe, faculdade e escola são coisas bem diferentes.

- Acha que eu não sei? Você ainda está no terceiro ano do ensino médio, hoje é seu primeiro dia de aulas. Vá se vestir. - então isso quer dizer que...?

Me levanto e caminho até o quarto. As coisas na minha cabeça não se encaixam ainda. Onde ele está? Onde eles estão? O que aconteceu? Porque aconteceu? São perguntas sem receptores. Eu preciso confiar em alguém e perguntar. Entro no quarto e me deparo com Bea amarrando os cadarços de seu tênis, ela sobe o olhar para mim e sorri.

- Vamos chegar atrasadas se você não se arrumar logo. - ela se levanta e ajeita o cabelo em frente ao espelho.

- Eu sei, é que... - fecho a porta e caminho em passos lentos até a ela - Posso confiar em você? Eu tenho muitas dúvidas.

- Claro que pode, Lari. Somos irmãs e melhores amigas. Pode me perguntar qualquer coisa. - ela sorri e me senta na cama.

- Ok. - ela assente com a cabeça - Onde está o Caíque?

- Quem é Caíque? - ela me olha confusa como se quisesse rir.

- Caíque Gama. - afirmo e ela parece entender melhor agora.

- Olha, pelo o que eu sei, o único Caíque que conhecemos é o nosso primo do Sul e o sobrenome dele não é Gama. E tem o Caíque da banda Fly, mas eu não sei onde ele está. - ela dá uma risadinha.

- Sonhei com o número 31... - mordi o canto da boca.

- Ah... Você ficou fascinada por esse número. Até disse isso algumas vezes enquanto estava inconsciente. - suspirou. - Mais alguma pergunta?

- Não, era só isso. Eu vou me arrumar. - ela pega um batom em cima da cama e eu me dirijo para o banheiro.

Como assim? Eu não consigo acreditar. Como ela pode não saber do Caíque? Como ela pode não saber de tudo o que vivemos?

Alguns minutos depois, aqui estou eu. No banco do passageiro de um carro vermelho dirigido pela minha mãe, à caminho da escola. Eu ainda não consigo entender porque vou para lá. Pelo o que eu sei, larguei a faculdade para cuidar dos meus filhos. Em falar nisso, preferi não perguntar à Bea sobre eles. Ela iria me achar uma completa alucinada.

As ruas rodeadas de árvores, uma pequena multidão de pessoas no fim da rua. Eu já estive aqui tantas vezes que nem tenho mais vontade de voltar. A mesma escola, a vida toda. A mesma professora de sobrancelhas grudadas, os meninos amigos bobos, as mesmas brincadeiras de pique-pega pelo pátio, a mesma rotina.

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