Cap. 24: Consolações Secretas

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O balanço leve de minhas pernas talvez fora o que me fez acordar. Só por este leve movimento, já senti vontade de vomitar, o estômago revirando-se por causa da dor excruciante no ombro. Tremendo, levantei o braço fraco e o levei ao local ferido, lembrando imediatamente de tudo. Da faca. Do fogo. Da pele.

Abri os olhos e gritei, levantando a cabeça de imediato.

- Ai! - ouvi, em um tom baixo.

Com lágrimas invadindo os olhos, encarei o rosto de Ônix. Ele me carregava e olhava para baixo, mesmo com uma provável dor no queixo. Seu rosto estava ilegível.

Precisei de muito esforço para conseguir formular alguma palavra, a voz totalmente embargada.

- E Então? - sussurrei, sentindo o coração doer mais do que o ombro enfaixado - ficou muito ruim?

Ele suspirou, fechando os olhos. Naquele momento, suas íris estavam muito escuras, e brilhavam de tristeza.

- Não ficou pior do que a de todos. - respondeu.

Não ficou pior. Só isso.

Deixei minha cabeça cair para trás, as lágrimas descendo na direção contrária. Então, avistei outra pessoa andando pelas passarelas escuras e silenciosas do poço.

Quando ia avisar Ônix sobre a presença, percebi que era Babi. Aquela que eu vira passar pela iniciação. Ela cambaleava sozinha, a mão sobre o peito moreno ensanguentado. Me assustei em ver que ela não tinha nenhum curativo, o sangue empapando o vestido claro. E ela chorava. Pela primeira vez a vi chorar, de dor e sofrimento. Deixei mais lágrimas caírem, simpatizando com sua dor.

Acho que eu teria desmaiado novamente neste momento, se Ônix não tivesse puxado minha cabeça delicadamente e a apoiado sobre o ombro.

- Por que me sinto tão cansada? - sussurrei.

- Acho que Sarah exagerou na dose de anestésicos.

Sarah... Sarah! Dei um pulo.

- Foi ela que me explicou sobre a Sociedade! - exclamei - quem é ela?

- É a enfermeira daqui. Como é só uma para tantas pessoas, eu, Rubi e Meena a ajudamos de vez em quando. - respondeu - e não se agite. Na maioria das vezes, ela acompanha a chegada dos novos membros.

Toda a minha ansiedade e alvoroço acabaram. Soltei o ar e esmoreci, deixando a cabeça tocar o ombro de Ônix.

Alguns segundos depois, paramos.

- Chagamos - ele disse, sinalizando a porta do estúdio.

- Por que aqui? - perguntei.

- Porque não posso levá-lá aos quartos femininos, e você tem que pelo menos conseguir sustentar o próprio corpo.

Ele abriu a porta devagar, acendendo apenas a luz de uma pequena luminária. Colocou-me sentada na mesa de madeira, posicionando-se à minha frente.

Suspirei, os olhos pesados e embaçados. Talvez por estar muito grogue, apoiei minha cabeça em seu ombro, respirando fundo. Senti-o estremecer assim que soltei o ar de volta, mas não consegui comentar nada.

- Você está bem? - perguntou, a voz baixa.

- Me sinto um pouco melhor. - respondi, sem ter tanta certeza.

Por mais algum tempo, o silêncio reinou. Virei a cabeça para o outro lado, sentindo sua pulsação agitada.

- Onde é a sua marca? - ok, eu estava muito chapada. Que tipo de pergunta era aquela?

Ouvi-o suspirar novamente, e então afastar meu rosto de seu pescoço. Encarei-o, enquanto abria alguns botões da camisa. Apesar de não estar muito sã, senti o rosto esquentar.

Assim que o lado esquerdo de seu peito pálido ficou à mostra, vi onde era. Um "S" espiralado e um "O" com uma barra (para também significar "P") estavam em relevo do resto da pele macia, a cicatriz proeminente e média, bem em cima do coração. Sem conseguir evitar, minha mão vacilante ergueu-se em um ímpeto, e toquei a região.

Sua pele era quente, e senti o coração batendo por baixo. O pulsar acelerado e latente penetrou por meus dedos, quase fazendo-os pulsar ao mesmo ritmo. Deslizei as pontas dos dedos sobre as linhas irregulares, ouvindo sua respiração lenta e sentindo-a no alto da cabeça. Espalmei a mão aberta sobre a cicatriz, transmitindo a sensação de calor para o braço inteiro.

Então, levantei a cabeça, olhando para seu rosto. Ele continuava ilegível, mas o brilho dos olhos mudara, para algo... hipnotizante. Não consegui desviar o olhar, por isso, passei a examinar seus traços. O nariz fino e esculpido, o queixo angulado, os lábios rúbros destacados do resto do corpo, os cabelos penteados para trás começando a se desprender e enrolar de leve, o hálito batendo em meu rosto. Os olhos, tão profundos quanto um mar de emoções. Foi aí, que meu coração também começou a bater mais rápido, quando me dei conta da intimidade do gesto e da beleza angelical do garoto.

Hesitante, puxei minha mão de volta, enlaçando-a na outra. De repente, me senti muito desperta.

- Acho que... agora já consigo ir... - sussurrei, sem ter vontade de sair dali realmente.

Ônix levantou a mão, pousando-a em meu rosto. Seu polegar e indicador apoiavam meu queixo, perfeita e delicadamente. Pelo jeito que me encarou, parecia que eu era uma de suas obras de arte.

Ele aproximou o rosto do meu, os olhos bem abertos. Novamente, percebi que uma das íris possuía um tom de verde mais escuro do que o outro, como esmeralda e verde-água. Este detalhe peculiar apenas o deixava mais encantador.

Minhas mãos tremiam de ânsia, e eu vacilava em me aproximar. A lembrança de seus lábios macios nos meus só me fazia ficar mais desejosa. Queria aquilo de novo. Não podia negar.

Mas, ao se aproximar de mim, Ônix fez algo que eu não imaginava: inclinou minha cabeça de lado, na intenção de me dar um beijo na bochecha.

Fiquei frustrada, de verdade. Por isso, e talvez por ainda estar meio maluca, virei o rosto, na intenção de contestá-lo (sobre o quê, eu não fazia ideia). Deu meio errado, pois seus lábios acabaram encostando no canto da minha boca.

O toque foi calmo, delicado, e ao mesmo tempo consolador. Sentir sua boca de encontro a minha fez com que meu corpo se arrepiasse.

Ele, com as pálpebras fechadas, demorou um segundo para perceber o que havia acontecido, recuar depressa e arregalar os olhos.

- Hã... - gaguejei, com o canto da boca formigando - acho que... vou indo.

Pulei da mesa e saí apressada.

- S-sim. - sua voz tremeu - Boa noite, então.

Não respondi. Estava tremendo demais para isso.



Oi gente!!! O romance está no ar!!!

Espero, de coração, que tenham gostado deste momento Lenix (é, o shipp ficou assim mesmo, por parecer com a palavra Fênix, que representa muito bem este amor, hehehe).

Apesar do sofrimento da Alessa, torço para que tenham aproveitado.

Bjsss!!! Comentem, se puderem. ^-^

Porcelana - A Sociedade Secreta (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora