3|| Procedimento padrão: Não corra!

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Dias se passaram, e meu bloqueio criativo para escrever persiste. Frustrada com minha atual situação, decidi que talvez se eu saísse para pintar em algum lugar bonito, a paisagem me trouxesse alguma inspiração com a ajuda de Vic e meu avô, coloquei um cavalete na traseira da minha caminhonete amarela, algumas tintas, pincéis telas em branco. Um cooler com cervejas dentro, e sanduíches preparados por minha avó. Vic terminar de colocar as coisas lá, e fecha a traseira."Você tem certeza disso?", ele pergunta. "Sim. Eu tenho, Vic.", entendia a preocupação dele, eu iria para um lado mais afastado da fazenda. "Se você precisar liga, ok?!", ele diz. "Pode deixar.", entro na caminhonete, fecho a porta e meu avô se escora nela. "Não vá muito longe. E aparecer coiotes, usa o sinalizador.", afirmo com um manejo de cabeça, segurando meu chapéu. "Até mais tarde, gente!", digo descendo estrada abaixo.

A viagem de carro não era muito longa, uns 30 minutos mais ou menos. A estrada até onde eu queria ir, tinha árvores em toda sua extensão, o que deixava o clima frio, mesmo com sol. Willie Nelson tocava no rádio, e me fazendo tamborilar os dedos no volante. O vento bagunçava meus cabelos loiros, a medida que eu ia descendo pela estrada, me afastando cade vez mais da fazenda. Entro a esquerda na estrada de chão batido, e continuo pelo caminho até estar mata adentro. Assim que acho a claraboia da floresta, paro a caminhonete e contemplo a paisagem que me inspirou muitas vezes. A água escorria da pedra, formando uma enorme cascata, e uma fonte de águas azuis claras entrava em contraste com os tons alaranjados das rochas ao redor dela. Era lindo! Respiro fundo e volto para a caminhonete abrindo a traseira e tirando meu arsenal de pintura de la. Monto o cavalete,  coloco meu avental de pintura, pego um baldinho e o encho com água da fonte para limpar os pincéis, e volto para onde havia armado o cavalete, colocando uma tela branca, e dou início a pintura. Misturo algumas cores até obter um tom de laranja que eu queria e começo a pintar a tela.
Isso era uma das coisas mais relaxantes para mim, eu deixava minha mente ir longe quando pintava. Mais algumas passadas de laranja, e eu troco de pincel o mexendo na água para amolecer sua ponta e limpa-lo, começo a traçar uma linha branca, que depois misturo com azul esverdeado, até ter a aparência da água que eu vejo na fonte, e então faço uma pausa para tinta secar na tela, tiro o avental e penduro na caminhonete. Pego uma garrafa de cerveja dentro do cooler na traseira da caminhonete, e me sento ali observando o que tinha feito até agora.
Nada mal para quem não consegue escrever à dias. Bebo mais da minha cerveja e respiro fundo sentido a brisa fresca da floresta refrescar meu rosto. Porque eu conseguia pintar, mas não conseguia escrever? O que há de errado comigo? Dou mais um gole na cerveja, me levanto de onde estava sentada, deixando a garrafa ali, indo olhar a fonte mais de perto. Eu deveria ter trago roupas, não seria nada mal nadar um pouco agora.

Você pode nadar pelada. Não tem ninguém aqui... Até que não é má ideia. Tiro minhas botas e coloco as meias dentro delas. Tiro minhas calça, dobro, e coloco sobre o tronco seco e faço o mesmo com o resto, e nua entro na água clarinha. Estava morna, e a sensação fazia meu corpo se relaxar. Mergulho de olhos fechados até subir a superfície novamente. Deus era mesmo um artista, com lugares como esse era impossível manter o estresse por muito tempo. Fico mais algum tempo nadando, até olhar para o céu e perceber tons de laranja, estava perto de anoitecer, a mata floresta estava começando a ficar escura. Saio da água e visto as minhas roupas, pego a bota no chão e caminho de volta até a caminhonete, onde começo a guardar as coisas com cuidado na traseira do lugar. E é quando me viro para tirar a tela do cavalete que o vejo. Pelo alaranjado, corpo esguio, focinho fino e olhos quase amarelos: Coiote. Ele estava olhando diretamente para mim, e eu senti todo o sangue do meu rosto sumir. Sinto minha pulsação se acelerar e a consigo ouvir em meus ouvidos. Eu tenho pavor a coiotes, vi um ataque uma vez em nossa fazenda e fiquei paralizada. Eles mataram o filhote da Dolly. O que o vovô sempre diz? "Procedimento padrao, se estiver sozinha, não corra!", mas eu queria correr. Tudo em mim mandava eu correr, os olhos dele não saiam dos meus, e eu estava aterrorizada! "É só um cachorro do mato, Marie.", digo a mim mesmo. "Um cachorro do mato com dentes afiados!", me forço a dar um passo para trás, sem fazer muitos movimentos, e coiote, começa a mostrar seus dentes. Eu vou morrer, é isso. Dou mais alguns passos com a mão para cima sem fazer muito movimento. "Não corra, Marie. Não importa o que aconteça, NÃO. CORRA!", o coiote rosna e dá um passo à frente. "Merda!", a única coisa que eu sei é que começo a me afastar de pressa ainda de olho no bichano e quando vejo estou correndo apavorada para o mais longe dele. Eu continuo a correr aos gritos, e consigo ouvir o animal correndo atrás de mim. "Porquê meu Deus! Eu vim tão longe para morrer nas garras de um coiote?!", continuo a correr até estar fora da floresta. Mais à frente, vejo uma cerca, e corro até la pulando afobada rancho adentro. Eu não ouvia mais o animal, e então comecei a diminuir o ritmo, apenas para aumentar no instante seguinte quando o vejo pular sobre a cerca, no momento em que me virei para procura-lo."Socorro!", eu grito., o bicho pula em mim e morde meu braço, me derrubando no chão, mas consigo afasta-lo com um chute, e volto a correr estrada acima. Havia uma casa à frente e me apressei até estar na varanda da pessoa, esmurrando a porta. "Me ajuda! Estou sendo atacada por um coiote!", meu braço está sangrando, mas não consigo me importar. A porta é aberta, revelando John sem camisa, calça jeans e cabelos bagunçados. "Marie, ele mordeu você! Entra!", ele abre mais a porta, saindo para o quintal, e eu corro para dentro. Me viro e vejo o coiote parado mais à frente, e de frente para ele John. Ele nem se move, apenas o encara, e continua a encara-lo, até que o coiote se vira e vai embora. Eu fiz a mesma coisa, porque ele também não foi embora?, John volta para dentro da casa, e fecha a porta atrás dele. Olhando pela janela para ver se via mais algum, mas não havia. "Como você fez aquilo?", digo com um choramingo. "Eu fiz a mesma coisa, antes de começar a correr, e ele não foi embora!", digo apavorada. "Acho que ele apenas soube que aqui não é o lugar dele. Eu mando nessa parte, e ele na parte dele. E assim cada um segue seu rumo.", John dá de ombros de um jeito engraçado. "Agora vem. Eu vou lavar isso, e levar você ao hospital."

DEAR MARIE [JM] 1Onde histórias criam vida. Descubra agora