1º CAPÍTULO

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Ok, eu amo arquitetura. Não é a toa que quero me formar nisso. E sei que os museus têm tudo a ver com o curso, mas eu os odeio. Acho que tal ódio se deve mais às minhas infinitas idas enquanto ainda estava nos primeiros semestres. Quero dizer que eu tenho pavor a museus. Na verdade, quero gritar para o mundo inteiro ouvir, inclusive o meu chefe.

"Vamos lá, Anne, você tem que ir e fazer algumas anotações, que tal?". - SMITH, Bob. Mais conhecido como o meu chefe. Ele é legal, só que adora colocar as tarefas mais chatas nas minhas costas. Sou estagiária na M&B Arquitetura. Uma das maiores empresas dos Estados Unidos nesse ramo, e pelo fato de eu estar terminando meu último ano, fico com as tarefas mais chatas.

O Museu Metropolitano de Arte é lindo, de verdade, lindo, mas eu não gosto de ver todas aquelas pessoas sorrindo, olhando para tudo ao redor sem nem saber do que se trata. Sem saber diferenciar uma arquitetura Neo-Grega. Só gostam de postar em uma rede social: "Em: Museu." Talvez seja para pagarem de intelectuais, baboseira...

Moro com a Sarah. Médica e minha melhor amiga. Tem vinte e seis anos e já é formada em medicina na Universidade de Cornell. Que orgulho dessa garota. Snif, snif. Ela gosta de paz e silêncio para estudar, mas nas horas vagas grita mais do que um bugio.

Nós não precisamos pagar o aluguel do nosso apartamento, essa parte fica com os nossos pais, mesmo Sarah e eu sendo totalmente contra. Meus pais têm uma boa condição financeira, assim como os dela, o que nos proporciona um apartamento bonito e aconchegante em um dos melhores bairros de Nova York. Sara tinha se mudado primeiro para NY para começar sua faculdade, e quando completei dezoito também vim e me hospedei no apartamento pequeno em que ela morava. E depois resolvemos nos mudar. Nossos familiarem moram no Brasil, especificamente no Rio de Janeiro.

Ela sempre sai cedo para ir para o Mount Sinai, o hospital onde trabalha, e eu fico o dia inteiro em um computador na M&B fazendo relatórios e anotações.

E hoje, cá estou eu em frente ao espelho tentando decidir qual roupa usar para ir a um lugar entediante. E é claro que fico com a opção de sempre, calça jeans, All-Star, blusa do Muse e um casaco preto por cima. Fundo do poço, murmuro ao ajeitar o cabelo. Pego um metrô e observo todas aquelas pessoas presas ao celular, outras concentradas em um livro, mas nenhuma presta atenção no que tem em sua volta. Ninguém presta atenção a pessoa ao lado. Pode ser o seu futuro amor, mas ninguém quer saber. O Trending Topics do Twitter está mais interessante. Quando finalmente chego em frente ao museu, é um alívio e se for possível, uma tortura ao mesmo tempo. Aí vamos nós! Logo quando entro toda aquela claridade quase me cega. É um lugar incrível e majestoso, marcante, eu poderia dizer. Só que não me entusiasma tanto quanto deveria. Tiro a prancheta e uma caneta da bolsa e caminho em direção à seção de esculturas.

As paredes que parecem reviver cada momento que aconteceu aqui são lindas. Por que os humanos tornam as coisas mais belas em coisas entediantes com E maiúsculo? As esculturas parecem me observar como se dissessem "O que você está fazendo aqui?". Anoto todos os detalhes da arquitetura na minha prancheta em rabiscos rápidos como o de uma criança de cinco anos. Fico atenta em todas as palavras, em todos os valores ao longo dos anos que esse lugar representou para todos.

Estou em frente à escultura California, de Hiram Powers, quando uma voz quase me faz pular de susto.

- Eu te assustei? - ele diz antes que eu possa dizer algo.

Nossa... Que homem é esse. O cabelo roçando o colarinho da camisa branca, os olhos azuis, a barba por fazer e... Porra! Por que estou fazendo uma avaliação mental dele? Porque ele é lindo, acorda Anne!, meu subconsciente tira-me do meu devaneio.

- Não, tudo bem. - murmuro. - O que você disse?

- Você é estudante do quê? - cruza os braços em frente ao peito.

- Como sabe que sou uma estudante? - ergo a sobrancelha esquerda. Não! Erguer a sobrancelha não. Odeio essa mania! Uau! Odeio tanta coisa.

Ele sorri lentamente, e fico com raiva por ter me sentido excitada.

- Prancheta, olhar entediado e longas reviradas de olhos.

- Você é um analisador de universitárias? - zombo.

- Não. - Diz secamente. - Se não é estudante, faz o quê?

Bufo e saio andando, e vejo que ele me segue. Merda! Viro-me e dou de cara com um paredão. Com o susto, dou um passo atrás antes de falar.

- Sou estudante de arquitetura.

- Em qual universidade?

O cara é um perseguidor, louco ou o quê?

- Olhe aqui, Sr. Perseguidor de Estudantes de Arquitetura, só quero terminar as minhas anotações e ir embora. - Gesticulo com a mão, englobando todo o lugar em que estamos com o gesto. - Deve haver outras universitárias aqui, então sinta-se a vontade para correr atrás delas. Tenha um bom dia! - finalizo com um belo sorriso irônico.

Saio andando apertando tanto a prancheta contra o meu peito que por pouco não dói. O que exatamente foi isso? Cristo, Anne. Precisa ser tão ignorante? Paro no lugar. Suspiro fundo e me viro. Ele ainda está lá, olhando para mim com uma expressão de incredulidade no rosto, o que só o deixa mais lindo. DA ONDE ESSES PENSAMENTOS ESTÃO VINDO?

Caminho até ele.

- Desculpe-me pela grosseria, só não é um bom dia. Estudo na Columbia, meu nome é Anne Mitryad.

Encara-me como se eu fosse louca. Respira profundamente, fecha os olhos por um segundo, e quando os abre vejo uma mistura de várias coisas.

- Tudo bem. Meu nome é Jamie Carraway.

E do nada ele me dá as costas, andando para a direção oposta. Minha boca forma um perfeito 'O'. Ele só pode estar querendo me dar o troco. Reviro os olhos e saio andando também. Babaca... Dou dois passos quando ouço sua voz firme me chamando.

- Anne?

Viro-me com uma expressão de puro tédio no rosto. Balanço a cabeça como se dissesse "o quê?".

Ele sorri de lado.

- Não preciso correr atrás de nenhuma universitária.

Dito isso, vira-se e dessa vez desaparece em outra seção. Mas que filho da...

- Por que você foi tão grossa? - Sarah levanta o olhar da tela do Macbook para me encarar.

- Eu não o conheço - digo enquanto dou uma mordida dos tacos que ela acabara de fazer. - Aliás, isso tá ótimo.

Ela dá de ombros para o meu elogio.

- E daí Anne? Você queria que o cara te passasse uma auto-biografia na primeira vez que vocês se viram?

- Não - minha voz vacila. - Ah, não tem nada a ver. Não era nada importante.

Ela ri.

- Ao menos ele era bonito?

Suspiro e passo a língua nos lábios para limpar o resto do molho.

- Lindo...

- Viva um pouco mais, gata.

- Olha só quem tá falando - digo e me levanto do sofá.

- Vai se ferrar! - tira os óculos de leitura. - Sábado temos um almoço para ir.

- Onde? - vou até a pia levar os pratos.

- Na casa de um colega lá do hospital.

- Combinado. Olha aí minha oportunidade de namorar um médico bonitão.

- Ai meu Deus! Não mereço ouvir isso.

Depois do jantar vou pra cama, mas não consigo dormir. Então pego o celular e, por um milagre, entro no Facebook. Quase sem ter noção do que estou fazendo, escrevo Jamie na barra de pesquisa, mas o meu alarme de sanidade soa e eu apago tudo antes de pesquisar. Merda, o que foi isso? Não preciso de mais confusão em minha vida.

Em Seu DesejoOnde histórias criam vida. Descubra agora