Thamyris
— Thamyris você precisa comer — minha mãe falou assim que entrou no meu quarto e viu minha bandeja de comida intacta.
— Não quero mãe — falei já chorando.
— Vai viver de lagrimas agora? — balançou a cabeça negativamente — Thamyris se tem uma coisa que eu aprendi nessa vida é que nós temos que levantar e seguir em frente, e eu sei que tu vai conseguir isso porque primeiro você é minha filha e segundo porque você é uma pessoa extremamente forte.
— Dessa vez não é tão simples assim mãe — falei enxugando meu rosto — eu não vou me perdoar nunca pelo que aconteceu, eu poderia ter evitado tudo isso...
— Se você pudesse teria evitado, e se aconteceu é porque você não pode — ela falou séria — agora você tem que comer — ela pegou a bandeja e pra não criar confusão engoli umas três colheres de comida.
Sabe um saco de batatas? Que não tem reação pra nada? Eu estava igual, apesar de que um saco de batatas é mais cheio que eu, eu não tinha reação pra absolutamente nada. Se me jogassem de cima de um prédio eu não reclamaria, pelo contrário eu agradeceria.
O pior de tudo isso é saber que as coisas ainda não tinham terminado, eu ainda ia ter que falar pro Rodrigo o que tinha acontecido de verdade, toda a história e eu não sabia se teria estômago pra isso, mesmo sabendo que isso era o certo a se fazer, pelo menos ele deveria saber de toda a verdade.
Hoje era terça, e faziam quatro dias desde o pior dia da minha vida. Recebi alta e assim que sai do hospital pedi pro Henrique ir numa floricultura, comprei umas flores e depois ele me levou no cemitério.
— Tu tem certeza disso? — Henrique perguntou receoso.
— Tenho — respondi assentindo.
Ele saiu de perto me deixando sozinha, fiquei olhando pra aquele pedaço de terra mexida por um tempo antes de colocar as flores ali em cima.
— Eu não consigo pensar em nada pra dizer a não ser pedir perdão, me perdoa por ter sido egoísta e não pensado em você primeiro, em não ter aproveitado do jeito que eu deveria ter aproveitado quando você tava aqui dentro de mim, você não sabe o quanto eu me arrependo de cada coisa que eu fiz, eu faria tudo diferente pra te ter aqui comigo, me perdoa, me perdoa, me perdoa... eu te amo tanto — falei entre o choro, me ajoelhei e chorei tudo que eu tinha pra chorar, eu chegava a soluçar.
— Thamyris... — escutei o Henrique me chamar, ele colocou a mão no meu ombro — vamo embora, tu não pode ficar assim não — ele falou preocupado.
— Me deixa ficar só mais um pouco — pedi, ele suspirou e assentiu.
Estava tendo muito conflito no morro, os traficantes queriam tomar o morro de volta e pelo que eu escutei no rádio eles estavam quase conseguindo, muito policial já tinha morrido, muito morador e muito traficante também.
— Foi confirmada a morte de Jean Nascimento Santos, ex chefe do tráfico. Jean atuava no Morro do 18 que a há dois anos foi tomado pela polícia — a moça do rádio falou, eu aumentei o volume — o chefe de operações especiais da polícia acredita que a morte de Jean é um grande golpe no tráfico...
— Para de escutar isso — Henrique falou abaixando o volume.
— Palhaçada — falei olhando pra rua — eu só acredito que ele morreu quando eu ver a última pá de terra sendo jogada... capaz ainda de eu fazer vigília no tumulo dele só pra ter certeza de que o capeta não vai devolver...
— Ta falando merda Thamyris — Henrique disse sério — é de verdade dessa vez — ele falou e eu estalei minha língua — Jean foi um presente pros policiais...
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VIDA BAGUNÇADA
ChickLit[primeira versão] | +18 | concluída. Resolver os problemas do passado e do presente pra que ela tenha um pouco de paz é o desafio de Thamyris.