VI. Uma Perseguição Incansável

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A ideia de Radulf de que aquele dia seria divertido por todo o tormento que estava provocando em Wafula foi por água abaixo quando, depois de cumprir com toda a agenda na capital do reino, tratar com todos os nobres e definir os pontos do anúncio oficial de Idris após o curto período de guerra, ele foi surpreendido com o fato de que o mesmo homem que tinha visto fugir pelado do castelo dez dias atrás tinha pulado no balaústre diante do rei em meio ao seu anúncio oficial para a população, e ainda tivera a ousadia de roubar a coroa na frente de todo mundo. E o pior de tudo, Idris não tinha feito o mínimo esforço para impedir, ao contrário, a única reação do regente ao roubo de um tesouro real aconteceu quando o cabelo dele foi bagunçado.

A sequência de fatos foi apenas esperada, afinal, Idris podia não se importar com um ladrão pegando sua coroa em vista da população de Arcallis inteira, mas sentir as tranças soltarem e o cabelo ficar bagunçado era suficiente para ele tentar matar muita gente. Radulf apenas fez um sinal para Wafula que lhe acompanhava para ir dar conta de Idris enquanto ele mesmo ia dar conta de outra coisa: a segurança incompetente do palacete.

Wafula cruzou a sala de reuniões que estivera vazia desde o início do pronunciamento e chegou até a varanda para constatar que Idris já tinha destruído metade do caminho da praça pública. Era possível ouvir os gritos de pessoas desesperadas na praça e o ladrão tinha corrido rápido o suficiente para escapar da vista dele.

– Calma aí, Idris, isso tudo de destruição vai pra receita da coroa, só vai dar mais trabalho pro Radulf e ele me prometeu que isso tudo ia terminar hoje, então colabore comigo. – Wafula avisou ao rei, colocando a mão grande no ombro dele para chamar a atenção.

Idris deteve os ataques mágicos e respirou fundo, os dedos fechados com força em volta do gradil diminuíram a tensão e ele deu uma boa olhada na quantidade de pessoas que tinha corrido e nas que ainda lhe encaravam com o mesmo medo costumeiro. Ele deu meia volta e entrou na sala de reuniões, todo o lado esquerdo do cabelo tinha soltado e os fios caíam pela frente do rosto enquanto apenas as tranças do lado direito permaneciam intactas.

– Agora, Idris, por que é que você deixaria um cara parar na tua frente e roubar justo a sua coroa?

– Porque eu faria algo? Ele não estava tentando me matar.

– Você lembra que roubar também é crime, não é? – Wafula riu da resposta casual do rei.

– Não vou matar nenhum ladrão.

– Ninguém disse para matar, mas pode mandar prender, viu?

Idris não respondeu e Wafula deu uma risada com gosto da situação do rei. Ele tinha aprendido a reagir apenas para defender o reino e defender a própria vida, não era surpresa que ele não lembrasse de outras punições para outros crimes. Ou que, de fato, não se importasse com eles. Bom, estava acostumado com aquela apatia para qualquer coisa que não fosse guerra, intenções assassinas e o cabelo.

– Olha aí, agora seu cabelo tá todo bagunçado.

A reação de Idris só divertiu Wafula ainda mais, quando ele foi encarado de volta com um olhar tão atravessado que só conseguiu dar outra risada sonora por conta do comentário de propósito.

– Vou voltar ao castelo. O assunto aqui já está encerrado. – Idris avisou, seguindo para fora da sala de reuniões, ao que Wafula apenas o acompanhou.

O rei já não tinha nada o que resolver ali depois do pronunciamento desastroso. Logo os informes oficiais seriam espalhados pela cidade e Idris podia retornar à sua vida pacata no castelo enquanto Radulf tomava conta da maior parte da gerência do reino. Mas quando eles seguiram pelos corredores do palacete para sair, não foi surpresa parar no meio do caminho onde um Radulf gesticulava muito intensamente para uma série de guardas alinhados e tremendo na base, não só pela expressão do próprio conselheiro real, mas pelo intérprete que estava ao lado dele, com uma expressão igualmente furiosa e traduzindo tudo o que era sinalizado.

Um Silêncio de 15 AnosOnde histórias criam vida. Descubra agora