XV. Uma Iniciação Militar

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࿐ Treinamento militar, norte de Zahi, capital de Arcallis, 21 anos atrás. 

Radulf mal tinha completado quatorze anos quando foi contra todas as recomendações de seus pais para ficar longe dos militares e se dedicar aos estudos. Arcallis não precisava de mais gente inteligente, precisava manter um exército bem estruturado, soldados treinados e pessoas capazes de proteger as fronteiras para que a rainha não precisasse se esforçar tanto para defender o reino com magia.

Arcallis era um reino geograficamente vulnerável, de fácil acesso, coisa que Radulf tinha aprendido em suas lições particulares, e por isso que, há muitos anos, era protegida por um exército com mais do que só fazendeiros e mercadores. Era um exército composto de soldados jovens, bem treinados, cada vez mais capazes de proteger as fronteiras de tantas invasões pra tirar as novas riquezas do reino.

Mas o que Radulf não esperava, ao chegar ao acampamento militar e iniciar um novo treinamento com uma série de outros jovens que tinham vindo de todos os cantos e vilarejos de Arcallis, era avistar, em meio às dezenas de garotos – alguns bem certos do que queriam, outros bem perdidos –, um jovem pouco mais baixo que ele, de cabelos loiros lisos que alcançavam a altura dos ombros, olhos claros e uma expressão séria que mais combinava com um adulto do que uma criança, usando roupas brancas que pareciam bem desconfortáveis para um treino, considerando que as mangas eram longas e justas até a palma das mãos, a gola era alta para cobrir quase todo o pescoço, e quase nada da pele aparecia além do rosto descoberto e dos dedos das mãos.

Era impossível não identificar o jovem herdeiro do trono, Idris Verethragna. Mesmo quem não conhecesse a aparência de traços quase delicados e pele alva, com cabelos loiros e olhos dourados, era fácil identificar as condutas de vestimenta, já que a família real de Arcallis devia sempre usar tons claros e nunca expor a pele em público. E Radulf, que tinha crescido herdeiro de uma das famílias mais ricas do reino, já o tinha visto mais de uma vez. E sabia também que ele estava um ano adiantado para entrar no exército, além de, claro, não precisar fazê-lo, ele podia ter um treinamento exclusivo e individual no castelo.

A presença do herdeiro de Arcallis no meio do treinamento causou o furor tanto dos jovens recrutas como dos antigos, mas aquela era uma reação que Radulf já previa e era até cansativo ver como todos pareciam pisar em ovos perto do jovem príncipe, sempre fazendo perguntas demais, exigindo de menos, tecendo elogios incabíveis. Até quando a prática exigiu que os jovens recrutas formassem pares, ninguém parecia ter ousadia o suficiente para se aproximar do príncipe primeiro, e nem ele parecia disposto a descer do pedestal imaginário para ir até algum dos companheiros.

– Você não vai melhorar nada treinando sozinho.

Radulf que tomou a liberdade de se aproximar, considerando que ele devia ser o outro único nobre ali, era mais fácil até se dirigir a ele sem se preocupar com pormenores.

– Eu não pretendia.

– Mas não fez esforço para arrumar um companheiro de treino.

– As pessoas vêm até mim, não o contrário.

A resposta convencida do jovem apenas deu a Radulf mais vontade de dar uma surra no príncipe, e ele conseguia fazer aquele tipo de comentário sem nem mudar a cara azeda.

– Então já que eu vim até aqui, majestade, vou servi-lo com muita presteza.

A expressão séria de Idris não mudou, como mandava a prática, eles tinham apenas sequências muito simples de movimentos com armas de madeira para treinar em dupla, com repetições constantes. Mas aquilo não impediu Radulf de impor mais força do que o necessário, e se um dos movimentos passasse direto, bom, era apenas consequência.

Um Silêncio de 15 AnosOnde histórias criam vida. Descubra agora