Wafula não era a pessoa mais acostumada a andar de carruagem, mas com as exigências de Radulf naquela manhã, ele nem tinha como protestar. Era até engraçado ver as expressões do conselheiro, mas quando eles seguiram o caminho para longe do castelo e passaram mais uma vez pelo banho de sangue na entrada, foi fácil para Wafula perceber que era mais preocupação do que irritação que havia em Radulf.
Ele preferiu não comentar nada enquanto o conselheiro permanecia bem imerso em seus pensamentos, mas percebeu logo que estavam voltando para o centro da cidade e foi obrigado a quebrar o silêncio.
– Não me diga que ainda vai voltar para trabalhar, Rad? Estamos há mais de uma semana cuidando dos assuntos do reino com o Idris! Está na hora de descansar de verdade!
Radulf arqueou as sobrancelhas, fazendo alguns sinais muito breves para reforçar que ele pretendia ir para casa.
– Como assim?
Daquela vez, foi o conselheiro que ficou confuso. Já fazia tanto tempo que estavam na guerra que Wafula tinha esquecido qual o sinal para indicar "casa"?
– Você tá falando de voltar pra casa da sua família?
De novo, Radulf continuou com a expressão confusa e, com uma confirmação breve, ainda adicionou alguns gestos para perguntar se o outro tinha batido a cabeça e estava demorando a processar as informações.
– Eu não bati a cabeça. Porque você vai voltar pra lá?
Radulf quase rodou os olhos daquela vez "Estamos conversando em círculos agora? Você que disse pra ir descansar!".
– Eu sei que disse, comigo!
"Eu não aguento outra noite de sexo, Wafula!"
– E eu não estou falando de sexo! Estou falando de ficar comigo, na minha casa!
Todo o ímpeto de Radulf responder a qualquer insistência do general sumiu de uma vez. Ele piscou algumas vezes, como se não tivesse entendido a informação, gesticulando em seguida: "do que está falando?".
– Como assim, do que eu estou falando? Foi você que bateu a cabeça ontem? – Wafula arqueou as sobrancelhas em confusão. – Nós vamos morar juntos, não é? Nós estamos juntos, não estamos?
A declaração muito direta fez com que Radulf até perdesse a noção do que responder ou de como mover as mãos. Era uma coisa tão óbvia que ele nem tinha considerado aquilo antes, aliás, nunca na vida tinha considerado aquilo.
– Quer dizer que você só está me usando pelo meu corpo!? – a expressão de falsa surpresa e indignação de Wafula só deixaram um tom muito vermelho de irritação e constrangimento no rosto de Radulf, que foi obrigado a responder com um chute firme na canela do outro. – Au! Você tá ficando muito violento, Rad.
"Você mereceu. Todas as vezes".
– Tá, tá. – Wafula riu, curvando-se na direção de Radulf, que estava sentado à sua frente, e apoiando os cotovelos nas pernas. – Mas eu estou falando sério. Quero que fique comigo, o tempo todo, não só pra trabalhar, ou pra ir pra guerra. E eu até posso ficar com você, mas sabe que eu odeio essas casas de nobres, e acho que sua família não vai ficar muito feliz comigo dormindo no seu quarto.
Radulf ouviu a declaração muito direta do antigo companheiro de guerra e ainda ficou sem reação.
– Rad? Vai morar comigo?
Finalmente o conselheiro pareceu sair dos próprios pensamentos e a expressão antes de preocupação e irritação sumiu, dando lugar a um sorriso bem descontraído que deixou Wafula satisfeito.
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Um Silêncio de 15 Anos
Romansa࿐ Spin-off: O Ladrão dos 13 Corações ࿐ Por mais de vinte anos, Wafula e Radulf serviram no exército de Arcallis e não há nada que eles não saibam sobre o reino, o regente, as guerras e as duras vitórias conseguidas com muito esforço e a paz alcançad...