XXV. Uma História de Dormir

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Se Radulf já tinha motivos para odiar o ladrão, ao avistar o anel de família no dedo do outro ele só ficou ainda mais furioso, e até Idris tinha noção daquilo, principalmente quando notou o abrir de boca do conselheiro como se quisesse gritar. Radulf não podia gritar, mas ele derrubou a cadeira ao lado da porta com força, que foi só um barulho a mais para chamar a atenção dos criados que não tinham coragem de entrar nos aposentos do rei.

– Radulf, se acalme.

"Não diga...!" Radulf gesticulou com intensidade para Idris, precisando fechar as mãos em punho e dar um murro na parede antes de arrancar a lâmina que tinha ficado ali. "Ele ainda teve a audácia! O meu selo!", ele adicionou, com gestos ainda mais intensos e Idris o acompanhou com o olhar, imaginando que aquela era uma péssima situação para Kieran.

– Radulf...

"Eu vou acabar com esse infeliz!", Radulf retrucou, andando até o lado da cama de Idris e girando todas as alavancas perto da cabeceira que chamavam os empregados.

– Eu disse que não pode matá-lo, Radulf. – Idris reforçou, mas sabia que em matéria de lidar com Radulf naquele estado, só Wafula.

"Eu não vou matá-lo. Mas ele vai desejar estar morto", Radulf gesticulou, e antes que Idris pudesse protestar adicionando alguns pormenores na sua ordem anterior para evitar torturas também, as batidas na porta foram alarmadas.

Ele não precisou dar autorização para que Borya entrasse, Radulf cruzou o quarto e abriu a porta, notando não só Borya, mas uma série de outros criados que certamente tinham caído da cama para atender ao chamado do rei o mais rápido possível.

– Sim, vossa excelência? O rei... – Borya foi quem teve coragem de perguntar, mas ele nem precisou completar a sentença.

Radulf saiu do quarto de Idris, fechando a porta ao passar e começando a gesticular uma série de instruções para todos os criados, andando a passos largos e sendo acompanhado às pressas. A primeira foi sobre fecharem o castelo, talvez o ladrão fosse ousado o suficiente para ainda estar lá, a segunda foi sobre a urgência de mensageiros que tinham que alcançar a cidade com novas ordens para os guardas do palacete em tempo recorde, a terceira foi sobre as próximas tarefas dos criados no castelo que envolviam uma boa porção de atenção além dos trabalhos costumeiros, focados nos movimentos possíveis do ladrão dentro do castelo.

Aquela foi a quinta noite que Radulf passou em branco, assim como todos os demais criados do castelo, e sabia que Kieran não voltaria tão rápido para tentar encontrar com Idris sabendo que ele estava lá, mas pelo menos dificultaria e muito a vida dele na capital.

Nos dias que se seguiram, ele recebeu relatos a cada hora sobre a perseguição na capital e eventualmente os guardas lhe informavam sobre terem avistado o ladrão ou terem quase capturado-o, mas nunca uma notícia que lhe agradasse com a prisão efetiva de Kieran.

A única distração, no castelo, era o trabalho constante e a presença de Dargan que atormentava todos os criados, quando os criados achavam que iam perder a cabeça por alguma coisa que tinha acontecido ao menino – ou por não conseguirem dar banho nele –, Radulf acabava ficando de bom humor. A caça ao ladrão tinha tomado tanto da sua atenção que nos próximos dois ou três dias, ele nem lembrou de pedir informações a Andras sobre as famílias que tinha encontrado para possivelmente adotarem Dargan. O assunto só voltou à mente de Radulf quando ele deu um tempo no trabalho, no meio da tarde, sentado ao gabinete na biblioteca e observando Dargan que tinha cansado de explorar o castelo e estava sentado no chão riscando algumas coisas.

Mais de uma vez, Dargan riscou alguma coisa incompreensível, se levantou e correu por baixo da mesa para puxar a calça de Radulf e perguntar como era o sinal para alguma palavra, ou como escrever. E então voltou para a pilha de papeis amassados no meio do chão, que mais parecia um ninho, para riscar com o pedaço de carvão.

Um Silêncio de 15 AnosOnde histórias criam vida. Descubra agora