Stay with me.

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Violet on.

- Acorda vadia!
Os meus olhos arderam com a luz mínima daquela lâmpada pendurada.
Eu apaguei com a última bofetada.
Hely me bateu tanto nas últimas horas que eu me sinto anestesiada pela dor. Cada músculo do meu corpo grita por socorro, a sensação que tenho é de que cada segundo é o último e é desesperador que o último sentimento antes da morte seja esse medo absurdo que me cerca.
- Outra história. Seu paizinho, Christophe Hill, sabia que o cara dos poemas também tinha segredos?!
Eu não tinha forças para dialogar com ela, o gosto de sangue no meu paladar soa como um veneno, que age lentamente no sistema, se espalhando como tinta que afunda na água, antes de levar a óbito.
- Lembra da única páscoa em que ele não esteve presente?!
Lembro. Ele insistiu que não poderia ir, fiquei abalada e triste, porque não estava acostumada com a ausência dele, ele sempre estava lá para mim, e caçar os ovos de páscoa apenas com a mamãe não era tão divertido.
- Eu estou falando com você! Quando eu falo, você responde.
- Le... lembro.
- Está respirando pela boca?! Acho que quebrei seu nariz. Dói quando faço isso?!
Hely apertou meu nariz e quando eu gruni de dor ela riu alto, como quem recebe cócegas.
- Eu segui o Sr.Hill aquele dia e sabe aonde cheguei?! Numa cerimônia religiosa, feita numa capela bonitinha e bem afastada do centro da cidade, acho que estava quase chegando na fronteira?! É acho que era isso.
Os meus olhos arderam com as  próximas palavras dela.
- Era um batizado. Devia ter meses de nascido. A mulher segurava o bebê e o seu pai, ou melhor pai do bebê, ficou bem ao lado dela, enquanto o padre recitava algumas passagens das escrituras. Sr.Hill, ah ele estava tão emocionado, tão feliz, depois do batizado ele levou a mulher e a criança até uma casa bonita, passou o resto da tarde lá, eles se diveram a bessa depois que o bebê dormiu. Se é que você me entende.

- É exatamente essa reação que eu quero Violet, esse choro alto poderia ser a melhor música que eu já ouvi, mas tudo que você produz é tão irritante, que eu só quero te bater. Essa decepção inegável, essa quebra de imagem, é simplismente, perfeita. É isso que eu quero, Violet.
- Eu odeio você!
- Devia me agradecer, me amar, afinal  eu estou te contando a verdade. O seu pai tinha outra família e quer saber? Ele parecia tão mais feliz com eles! Parecia um homem realizado, devia ser maravilhoso para ele deixar de fingir, devia ser um alívio ficar longe do porre que é você e da vadia da sua mãe.
- É, devia mesmo, assim como o seu pai, que odiava a lesma morta da sua mãe e por isso ía atrás da minha, vai ver ela sábia como satisfaze-lo! Lembra como ele olhava para mim?! Com aquela ternura. Devia pensar, "ela deveria ser minha filha e não aquela droga de garota problemática que eu tenho em casa"!
Falei, cuspi as palavras que zumbiam em minha mente, mas me arrependi. Me amaldiçoei assim que Hely veio furiosa para cima de mim, e me acertou repetidas vezes por todo o corpo, para depois chutar minha barriga, o que derrubou a cadeira no  chão e me levou junto.
- Tente respirar sua desgraçada! Não consegue!? Eu vou fazer você se arrepender de ter dito isso! Os seus dedos quebrados, o seu olho roxo, o seu cabelo cortado, o seu nariz ensopado de sangue, isso não é nada perto do que eu vou fazer com você!

...

Cindy on.

Acordar e ver o estado em que me encontro não é nada legal. A noite foi como um passeio em uma montanha russa, eu estava no topo dos sentimentos, numa epifania, onde descubri que o palco era meu lugar, o único lugar onde eu queria estar até o fim dos meus dias, e depois o acidente, como se a montanha russa virasse um escorregador, no qual eu desci de barriga para baixo e de ponta cabeça, me fazendo dar de cara com o chão.

Minha mãe não para de chorar de nunca.
- Mãe pare de chorar, seus olhos estão inchados e seu nariz não para de escorrer, nunca pensei que diria isso mas, você fica feia assim. Parece um buldogue doente, eu não gosto de buldogues.
A minha voz é um sussurro rouco, um castigo para alguém tagarela como eu.
- Eu fiquei com tanto medo de te perder Cindy.
- Pensou que tinha se livrado de mim em?! Não tão rápido, eu sou algo como um carma eterno, meu bem.
- Não fale assim, nem fale, você precisa descansar agora Cindy. Tem uma cirurgia marcada e precisa estar bem.
- Estão, minha perna tá ferrada mesmo?! Tipo, tá podre essa merda?
- Cindy, ainda é muito cedo para falar filha.
- Se eu for ficar mesmo numa cadeira de rodas eu quero uma elétrica, vou ser tipo um carro ambulante, uma quase ciborgue. Só que mais bonita.
- Não fale asneira, você vai ficar bem. Vai voltar a andar, eu vou no refeitório, quer beber alguma coisa?!
- Vodga, com limão e um canudinho.
Ela sorriu e aquilo era tudo que eu precisava.
- Não tem vodga aqui. Então eu vou trazer água e um canudinho, aí você finge que é álcool, ok?
- Certo.
Ela ía saindo pela porta mas voltou.
- Cindy?!
- O quê?
- Eu amo você.
- Eu te amo, mãe.
Quando ela saiu eu pude respirar normalmente, não queria preocupa-la mas estava sentindo muita dor, a minha perna estava doendo, assim como todo o meu corpo, o jeito era ficar quieta até que o analgésico fizesse efeito.
Minha mãe voltou segundos depois com um copo infantil de canudo acoplado à tampa.
- Violet já sabe?! Onde ela está?
Minha mãe fez aquela cara de quem levou um tiro, mas depois disfarçou, então eu automaticamente soube que ela iria mentir.
- Ela ficou aqui, estava aqui minutos antes de você acordar mas, teve de voltar para casa, depois ela volta.
- Está mentindo.
- Não estou.
- Mãe...
- Cindy agora não, agora você tem que descansar, Violet vem mais tarde.
Suspirei derrotada, tudo bem, ela não iria me contar agora, mas eu só desejo que Violet esteja bem e que esteja ao meu lado quando eu acordar.



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