Capítulo 72

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[Bárbara Passos]


Não que eu já não tenha imaginado a possibilidade, mas saber que realmente havia acontecido me pegou despreparada. Victor havia dado passos pra frente, simples.
Me encostei na parede fria da capela a fim de recuperar o ar, realinhar os pensamentos. Tudo tinha parado de fazer sentido, tudo que tentei esconder e fingir que não existia tinha voltado a tona. Eu ainda não o esqueci, claro, como eu poderia? Ele foi a única pessoa que consegui me entregar por completo e quando ele se foi, levou parte de mim, e a parte que ficou nunca o esqueceu. Eu tentei, juro que tentei porque já imaginava a hipótese dele conhecer outra pessoa, tentei me envolver com outros homens mas parecia que nada fluía bem. O papo, os beijos, o sexo. Tudo com os outros era fraco, chato e sem afeto, já com ele era como se tivéssemos uma conexão surreal. E eu a perdi, por puro egoísmo da minha parte.
Corri minha visão para o lugar procurando meus pais, eles não haviam chegado ainda. Tomei coragem e me aproximei do espaço em que Antônio estava sendo velado, aos poucos as pessoas se dispersaram e finalmente consegui ficar um pouco sozinha ali. Olhando o rosto sereno de Antônio algumas lágrimas rolaram, deixei que tudo saísse. Meus ombros tremiam com a intensidade do meu choro silencioso, quando senti um toque firme neles. Fechei meus olhos pensando ser meu pai, mas quando me virei, me deparei com Victor, dessa vez mais perto de meu corpo do que eu imaginaria conseguir. Ele estava parado, sozinho, seus olhos vermelhos me fitavam.
Victor: eu sinto muito, Bárbara — disse com a voz baixa e grossa. Deus, aquilo ressoou dentro do meu corpo. Parecia que todo o ar deixaram meus pulmões e pude sentir o velho cheiro de seu perfume.
Não consegui responder, apenas abaixei a cabeça e toquei sua mão em meu ombro. Ele ainda estava com os olhos presos em meu rosto quando voltei a olha-lo. Sua expressão era indecifrável, peguei seu olhar correndo pela minha boca, aquilo me intrigou, mas quando tomei coragem para falar algo uma voz nos interrompeu.

Mariah: Oi — disse serena fazendo Victor se virar para ela — te procurei pela capela depois que voltei do banheiro... 

Victor ficou ao seu lado se afastando de mim, um silêncio estranho se formou, até ele o quebrar.

Victor: Mariah, essa é Bárbara — disse me olhando de canto. Ela imediatamente se aproximou de mim erguendo os braços para me abraçar.
Mariah: oh, Bárbara. Victor me falou de você — disse me envolvendo em um abraço, o que exatamente ele falou de mim? — eu sinto muito, sei que ele era importante na vida de vocês.
Assenti e voltei meu olhar pra Victor.
Eu não queria saber se realmente eram um casal mesmo estando nítido. Vê-los ali na minha frente estava me deixando desconfortável. A equipe funerária estava atrás de nós retirando o caixão dali. Avistei de longe meus pais chegando, aproveitei para sair dali. Era tudo que eu precisava.
Babi: bom te ver de novo, Victor — falei olhando em seu rosto. Peguei a mão de Mariah e a envolvi na minha — e foi bom conhecer você, Mariah. Mas eu realmente preciso ir.
Falei e deixei os dois sozinhos.

Encontrei meus pais e tentei disfarçar meu rosto devastado por tudo aquilo. Eles continuaram ali até o corpo ser levado pro crematório. Era um desejo de Antônio. Enquanto tudo acontecia, não deixei de procurar com o olhar Victor pela sala, mas não o encontrei. Após acabar, meu pai foi em seu carro e minha mãe voltou comigo.
Mãe da Babi: ele está aqui — disse me olhando dirigir — você o viu?
Babi: sim, encontrei com ele — falei tentando não transparecer o quão abalada fiquei com sua volta. Minha mãe com certeza achava que eu o havia superado.
Mãe da Babi: vocês conversaram? — perguntou ainda analisando meu rosto. Olhei de relance pra ela e assenti.
Babi: pouco, foi logo antes de vocês chegarem — respondi voltando minha atenção ao trânsito.
Mãe da Babi: seu pai convidou Tim e Angélica para jantarem hoje. Talvez ele venha junto e vocês possam conversar mais.
Babi: claro — falei baixo. Por dentro eu rezava silenciosamente para que ele não fosse realmente.
Chegamos em casa, subi pro meu quarto e me sentei na cama. Respirei fundo olhando pro meu reflexo na penteadeira a minha frente. Olheiras fundas, nariz vermelho. Me deitei juntando as almofadas da cama ao redor dos meus braços. Fiquei ali por alguns minutos até escutar vozes no andar de baixo. Eles vieram. Merda, eu queria ficar aqui mas conhecendo dona Flaviana, eu sabia que ela subiria até aqui para me chamar. Fui até o banheiro tentar camuflar pelo menos minhas olheiras. Arrumei o cabelo e coloquei uma calça mais confortável do jeito que eu gostava.  Mas e se as pessoas la em baixo estiverem vestidas mais formal? Voltei pro meu guarda-roupa e peguei uma roupa simples, boa para a ocasião. Desci as escadas relutando por dentro. Encontrei dona Angélica e Tim conversando perto da cozinha com meus pais, fiquei parada na escada olhando-os conversar. Nenhum sinal de Victor.

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