CAPÍTULO 17. CAFEÍNA

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O sino que tocava ao abrir da porta foi um dos poucos sons familiares ao ouvido de Camila, e lhe arrancou um sorriso confortante. O cheiro também permanecia o mesmo: café, livros antigos e pinho. O lugar oferecia uma pequena sessão de literatura com livros antigos, que eram doados pelos frequentadores assíduos. Camila caminhou até o balcão com um sorriso diferente no rosto; finalmente, um lugar conhecido onde poderia se esconder, por alguns minutos ou horas que fossem. Caminhou em passos lentos, olhando o grande letreiro na parede atrás do balcão, que dizia os pratos e drinks principais. Foi atendida por uma moça simpática, que não conhecia. Aguardava o café com certa ansiedade, quando recebeu um sorriso tímido de um rapaz de avental que passava por trás do balcão, e decidiu retribuir.

- Bom dia. - Camila cumprimentou. O gesto fez com que o rapaz olhasse para os dois lados, se certificando que seria realmente com ele.

- É sério? - O rapaz virou-se, com expressão incrédula. Tinha um sotaque carioca e pele bronzeada que denunciavam que, definitivamente, não era natural dali. Os braços tinham tatuagens e músculos que não pareciam de academia, mas fruto de trabalho duro. A calça jeans surrada também indicava ser alguém que batalhava muito. Tinha o rosto fino e a barba parecia não ser feita há algumas semanas, apesar de bem aparada, e olhos cor de mel.

- ...É, acho que é. Não é um bom dia? - Camila indagou.

- Não, é que... Você não fala comigo há anos.

- Não falo?

- Qual é, perdeu a memória?!

- Perdi. - Camila respondeu sem jeito. A frase arrancou uma risada nasal do rapaz.

- Tá certo. - Finalizou com um tom sarcástico, virando as costas.

- Espera! Eu tô falando sério. A gente se conhece mesmo?

- Você tá de sacanagem comigo, não tá?

- Não, eu... Eu sofri um acidente há umas semanas e não consigo me lembrar de muita coisa. A gente se conhece?

- Olha, Camila, se isso for algum tipo de brincadeira... - O rapaz disse, apoiando os braços sobre o balcão.

- Não é, eu juro! Eu ainda tô um pouco perdida, mas... Eu lembro desse lugar, eu frequentava no primeiro ano de faculdade. - Disse, olhando à sua volta.

- Então nunca deixou de frequentar, desde que eu comecei a trabalhar aqui, você já vinha com frequência.

- Há quanto tempo você trabalha aqui? Eu não lembro de você...

- Há uns 3 anos. Começou como um bico, e depois fui ficando... - O rapaz falava sem muito contato visual. Atentava-se mais em pequenos afazeres no balcão.

- E... A gente costumava conversar e depois parou de se falar?

- É... - Arqueou as sobrancelhas com uma leve risada enquanto alisava o balcão com um pano seco.

- Desculpa, qual é o seu nome?

- Thiago.

- Thiago, por que você não olha pra mim?

- Eu aprendi a não olhar pra você, porque você não olha pra mim. - Voltou os olhos para Camila, em um ato que parecia exigir muita coragem.

- Eu fiz alguma coisa pra você?

- Não.

- Você fez alguma coisa pra mim?

- Também não.

- Então por que a gente se falava e deixou de se falar?

- Olha... - O rapaz encurtou a frase ao ver a atendente trazendo o café de Camila. - Não é nada demais. Deixa estar. Espero que você fique bem e continue feliz.

Você, de verdade (Romance lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora