Capítulo 03

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Naquela manhã de terça-feira, Marta havia acordado sem nenhum pingo de paciência. Desceu as escadas já pronta e se dirigiu até a mesa do café, onde todos estavam, inclusive Zé, tomando sua inseparável xícara de café preto e forte.
Sem ao menos dar um "bom dia", Marta agiu como se não tivesse ninguém naquela mesa. Pegou o guardanapo, pôs sobre o colo e começou a se servir. E o prato que estava em destaque era a famosa "torta de climão", e não era para menos, todos haviam escutado a discussão da noite passada, mas só Maria Clara sabia o real motivo.

— Mãe, tá tudo bem?— Lucas perguntou quebrando o gelo.

— Claro. Por que não estaria?— Ela respondeu de forma áspera, porém tranquila, fixando os olhos no filho.

João Lucas olhou para Maria Clara, recebendo o olhar de reprovação de volta.

— Porque ontem a gente ouviu uma gritaria sem fim, parecia que estava acabando o mundo — Zé Pedro se manifestou.

— Gente! — Clara os olhou de forma reprovativa. 

— Oque foi? A gente mora aqui, vocês vivem brigando o tempo inteiro, acho que temos direito de saber se tá acontecendo alguma coisa, né? Meu pai sentou aqui todo esquisito, minha mãe desceu calada, ainda não soltou nenhuma ironia. Convenhamos que é um pouco estranho — Zé Pedro argumentou.

— Isso é problema deles, vocês...

— Chega! — Marta bateu na mesa, impondo sua voz — Nem tudo da nossa vida a gente tem que contar pra vocês. Tomem conta da vida de vocês que já está de bom tamanho. Ok?— ela saiu estressada da mesa. Pegando sua bolsa e batendo a porta da frente.

Todos ficaram atônitos. 

— Você não vai falar nada, pai?— Lucas perguntou.

— É melhor ele ficar mudo. No lugar dele eu também não falaria nada.

Zé lançou um olhar de tédio e ao mesmo tempo de reprovação para a filha. Desde que decidiu se envolver com Isis, ele tinha plena consciência de que não seria tão fácil para seus filhos a aceitarem. Mas com sua personalidade forte e decidida, ele iria até o fim pelo sentimento que acreditava ter pela menina. Afinal, ele era o chefe daquela família, portanto, suas ordens ainda  eram lei.

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Por não ter uma sala particular na Império, Marta costumava usar a sala de reuniões para trabalhar, e não pense que ela adorava aquilo, muito pelo contrário, sempre odiou a petulância de não ter uma sala só pra ela. Mas em compensação tinha silêncio e paz para trabalhar. Porém, naquele momento seu silêncio foi quebrado por alguém indesejado.
Zé entrou na sala feito um furacão, sem nem ligar para a presença da mulher ali, ele começou a fazer barulho enquanto procurava algo em uma prateleira.

— Ei, Ei, Ei. Tá achando que isso aqui é oque? Porteira de fazenda? Pra sair entrando assim, fazendo barulho? —  se levantou o repreendendo. 

— Que eu saiba essa empresa é minha e eu entro onde e quando eu quiser, Marta —  ele respondeu da mesma forma ignorante de sempre.

— Primeiro, essa empresa não é só sua, é nossa. Segundo, já que é pra invadir o espaço alheio, ok. Vou entrar na sua sala na hora em que eu quiser, de propósito só pra ficar olhando aquela foto cafona do seu morro na parede —  ela provocou.

— Quantas vezes eu vou ter que falar QUE NÃO É MORRO, É MONTE  —  ele se exaltou, com raiva.

—  Que seja. Não faz diferença. Agora sai que eu quero trabalhar —  ela deu as costas, voltando ao seu lugar.

—  Como é que é? Você está me mandando sair? 

—  Sim, estou mandando sim. Tá surdo ou gagá? Anda, vai —  ela ergueu as sobrancelhas de forma imponente como sempre fazia, ressaltando seus olhos azuis.

O comendador começou a rir de forma irônica. 

— Qual é a graça?

— A graça é que você se acha a rainha, soberana, não é Marta?

— Não, meu querido. Não me acho. Eu sou! É bem diferente — Ela o corrigiu — Agora faz a caridade de sair.

— Você acha mesmo que eu vou comprar essa sua personagem que me odeia? Que agora não sente mais nada por mim? Patético!

— Pelo menos eu não saio por aí pegando criança. 

Zé recolheu o sorriso.

— Não fala oque você não sabe, Maria Isis é maior de idade. Não é criança.

— Que se dane. Oque aquela pirralha faz de tão bom assim pra você ter se apaixonado por aquela coisa? Garota mirrada, esquisita, aquele cabelo lambido, cara de criança, corpo de criança, aquela vozinha que irrita. Tem que ser muito corajoso pra querer aquilo, ou muito necessitado mesmo — Ela debochou com um sorriso provocativo no rosto, apoiando a cabeça nas mãos e os cotovelos sobre a mesa.

Zé se escorou na mesa, se inclinando para ficar cara a cara com a mulher.

— Se você falar mal de Maria Isis de novo na minha cara, eu te boto pra fora daqui pelos cabelos — ele respondeu sério, arregalando os olhos e apontando o dedo pra ela.

— Tô pagando pra ver — Ela se encostou na cadeira — acabou a brincadeira, Zé. Eu não me rastejo mais pra você. Quer ficar com aquela franguinha ? Fique, problema seu. Mas escuta bem, o meu lugar nessa empresa, na minha casa e em qualquer outra coisa que eu tenha ajudado a construir, ela não toma. Vai ter que me matar pra isso — ela o desafiou com o olhar — Agora sai.

Marta voltou a se concentrar em seus afazeres, aniquilando a presença de Zé ali. O homem saiu pisando duro e bateu a porta. Assim que silenciou tomou espaço, Marta se despiu da armadura de durona e relaxou, deixando transparecer todo o incômodo que aquela situação estava lhe causando. Mas como ela bem se conhecia, não iria deixar de se impor, ninguém tomaria seu lugar. O jogo agora era de poder, se era guerra que Zé queria, era exatamente oque ele iria ter.

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Depois de uma transa com Isis, Zé se pegou pensativo e nostálgico. Mal estava escutando oque a menina dizia sem parar ao seu lado.

— Tá escutando, Zé? — Ela o chamou pela segunda vez.

— Aham — Ele mexeu nos cabelos e ajeitou o bigode.

— Então oque foi que eu falei?

— Desculpe. Estava pensando em umas coisas aqui. 

— Sei. Eu estava falando que agora a gente tá finalmente livre pra mostrar pra todo mundo que a gente se ama — Ela sentou em colo de frente para ele.

— Para todo mundo?

— Claro. A chata da sua ex já sabe. Todo mundo já sabe mesmo. Eu não aguento mais ficar anônima. Quero mais é que todo mundo me conheça e saiba quem é o novo amor do comendador José Alfredo Medeiros — Ela sorriu dando selinho nele.

— No momento certo a gente vai contar.

— Como assim no momento certo? Zé, a gente já está junto há mais de um ano. Já deu de Marta, agora você é meu. Por que ela aparece pra todo mundo? Manda na empresa, mora com você e eu não? — Ela cruzou os braços.

— Porque ela ainda é casada comigo, meu amor — Ele alisou os cabelos ruivos da menina.

— E daí? Já passou da hora de vocês se separarem. Assim eu vou poder ficar do seu lado.

— Eu vou me separar. Mas não vai ser fácil, ela não larga o osso — Ele bufou.

— Então faz ela largar!

Meu Diamante - MALFREDOnde histórias criam vida. Descubra agora