"E lá estava eu e o demônio,
Nós dois caminhando lado a lado;
Não vejo o porquê das pessoas
Me perseguirem por toda parte,
Deve ser aquele velho espírito mal.Me and the Devil - Soap&Skin
Eu estava inquieta enquanto aquele pesadelo embaralhado gritava dentro de minha cabeça.
No escuro, alguém amarrava meus braços rente á uma mesa fria, dedos quentes me apertavam com firmeza enquanto eu me contorcia e gritava pedindo ajuda a todos os homens e mulheres vestidos de vermelho me olhando de longe como se estivessem na plateia observando uma apresentação. Eu chamava pela minha mãe e pelo meu pai até minha garganta doer e eu não possuir mais voz.
Alguém com mãos calejadas tampou minha boca abafando meus gritos de socorro, e olhando para cima entre as lágrimas com a vista embaçada, consegui ver dois olhos azuis brilhantes e exageradamente coloridos compondo um rosto bonito de pele escura, cabelos preto azulados caindo para frente enquanto se curvava para apertar minhas bochechas com força enquanto me mandava calar a boca.
Aquele nome veio na ponta da língua um pouco embolado pela língua infantil.
"Eris, por que está fazendo isso?"
●
Acordei gritando, o suor molhando minha roupa quando engasguei por sentir a minha garganta ferida, o meu peito chiando como louco, cansada como se tivesse corrido uma maratona.
Naquela noite, tive que inalar a bombinha duas vezes mais do que eu precisava.
Ah, de novo esse pesadelo infernal.
Sentada na cama, limpei o rosto com ambas as mãos ao lembrar que já se faziam cinco dias desde que eu havia voltado com Aiden para Nebulosa.
Naquela noite, ele me deixou em casa em um silêncio sepulcral, dizendo apenas que eu poderia fazer o que eu desejasse por uma semana, que estava me dando esses dias de folga como recompensa por eu ter aguentado dois dias convivendo com a família dele.
Eu queria dizer algo enquanto ele saía cabisbaixo, queria consolá-lo, mas não consegui.
Pra completar minha roda de azar, Carmem não estava retornando minhas ligações, fui até sua casa mas a sua avó um pouco hesitante, gritou da janela que ela não estava, para depois descer e sussurrar em meu ouvido que sua neta na verdade estava jogando em seu quarto e muito chateada comigo
— Dê apenas uns dias 'pra ela. — Pediu colocando uma sacola em minha mão. O conteúdo estava quente e cheirava bem. — Carmem se importa muito com você, ela diz que vocês são irmãs. Ficou muito triste quando você não voltou no dia combinado e não ligou para avisar. Ela achou que você tinha sido sequestrada.
— Ah… — Murmurei. — A senhora pode dizer 'pra ela que eu quero pedir desculpas?
— Vou dizer sim! — Ela sorriu beliscando minha bochecha. — Não fique com essa cara preocupada, quantas vezes vocês já não brigaram e fizeram as pazes depois?
Engoli em seco sentindo a garganta fazer um bolo ao sorrir e dar meia volta.
Eu queria falar com Carmem quando acordei naquela madrugada fria e chuvosa, queria que ela me fizesse rir da minha própria desgraça enquanto eu estava pateticamente chorando e sentindo dores fantasmas por todo o corpo, queria dizer a ela tudo que aconteceu dentro daquela mansão, de tudo que ocorreu com Ravena e Eris, mas eu sabia bem que Carmem iria me censurar.
Eu sabia o que ela iria dizer, que eu deveria deixar Aiden, que eu deveria ir morar com ela, ficar lá às custas dela e de sua avó até que conseguisse um novo emprego. Carmem sabia que eu nunca faria aquilo mesmo que implorasse. Eu sabia que avó e neta viviam da pensão que a idosa recebia e dos bicos que Carmem fazia ao longo dos meses.
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Amélia, Da Cor do Sangue ‐ Livro O1 {CONCLUÍDO}
Ciencia Ficción{OBRA DEVIDAMENTE REGISTRADA NA BIBLIOTECA NACIONAL} - "A sequência desse livro, "A Desolação de Amélia - Livro O2" está disponível aqui na plataforma também. - • Amélia odeia o vermelho, ela odeia sangue, tudo por causa da sua fobia pelo líquido. A...